Com a pandemia do novo coronavírus ainda avançando
após três meses de isolamento social no Brasil, a sobrevivência de milhares de
empresas corre severos riscos. O setor do turismo é um dos mais afetados com
esse efeito cascata, que é agravado pela dependência com outras áreas como
hotelaria e companhias aéreas, atividades que também estão com a maior parte de
suas operações suspensas.
Nesse cenário, a recuperação judicial é uma
alternativa viável e capaz de permitir que empresas do setor turístico consigam
"respirar" sem ter que fechar milhões de postos de trabalho em
definitivo ou decretar falência. O principal objetivo da Lei de Recuperação Judicial
(Lei 11.101/2005) é preservar a função social da empresa a fim de
facilitar a retomada da atividade econômica.
Por abranger empreendimentos de diferentes setores,
a indústria do turismo corre risco de sofrer um retrocesso de até 30%, conforme
previsão da Organização Mundial do Turismo (OMT), agência da Organização das
Nações Unidas (ONU). De acordo com o Conselho Mundial de Viagens e Turismo
(World’s Travel and Tourism Council- WTTC), o segmento de turismo responde por
1 em cada 10 empregos do mundo e contribui com 10,3% do PIB global.
Dentro de uma empresa, os reflexos negativos da
grave crise que estamos enfrentando se estendem aos funcionários, sócios,
representantes, fornecedores e clientes. No setor do turismo, boa parte dos
empreendimentos são de pequeno porte e com as restrições para conter o avanço
do vírus, tiveram que reembolsar clientes por pagamentos efetuados antes da
pandemia.
Desde o grande até o pequeno, todos estão na
mesma situação, afetados fortemente pela pandemia. A situação dos pequenos empresários,
donos de hotéis e pousadas, é ainda mais grave já que o faturamento
depende de estabelecimentos cheios de clientes e turistas, situação oposta às
recomendações sanitárias e de biossegurança que precisam ser seguidas enquanto
perdurar a pandemia.
Empresários do setor estão se esforçando em busca
de saídas para minimizar os impactos negativos, mas empréstimos bancários
possuem taxas de juros altíssimas e as empresas não têm muitas garantias a
oferecer. Algumas medidas de estímulo e socorro ao segmento foram anunciadas
pelo Governo Federal, mas são paliativas e incapazes de reverter a grave crise.
Uma delas é Medida Provisória nº 963/2020, que
liberou crédito extraordinário de R$ 5 bilhões para ser aplicado no
financiamento da infraestrutura turística nacional. Outra MP, a de
nº 948, trata do cancelamento de serviços, reservas e eventos e visa
auxiliar os segmentos turísticos e culturais nesse período de crise.
Diante desse cenário, as empresas brasileiras e
estrangeiras desse setor precisam buscar alternativas para auxiliar em
suas reestruturações e a melhor saída para muitas será recorrer à
recuperação judicial. Até a Pullmantur Cruzeiros, integrante do Grupo
Royal Caribbean, uma maiores empresas de transatlânticos do mundo, anunciou, no
dia 22 de junho, que pediu recuperação judicial na Espanha. De acordo com o
conselho de administração da Pullmantur, o impacto sem precedentes da pandemia
de Covid-19 tornou necessária a busca pelo instituto da recuperação.
A partir do momento em que o pedido é deferido, a
recuperação judicial permite uma série de benefícios como facilitar o
pagamento das dívidas, dialogar com os credores, suspender ações e execuções
judiciais, evitar processo de falência e fazer acordos ou convenções coletivas
de trabalho.
A empresa tem ainda a possibilidade de negociação
coletiva, carência no início dos pagamentos, alongamento da dívida, redução dos
passivos mediante negociação e equalização das taxas de juros. O instituto da
recuperação de empresas é bastante abrangente permitindo a inclusão de vários
tipos de créditos, a alienação da sociedade, por diversas forma, concessão de
prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas.
Também permite a substituição de administradores,
alterações de controle acionário, possibilidade de os credores eleger
administradores, aumento de capital social, arrendamento do estabelecimento,
inclusive para sociedade dos próprios empregados, redução salarial, dação em
pagamento e novação de dívida das, venda parcial de bens, constituição de
sociedade de credores, usufruto da empresa, administração campanha de emissão
de valores mobiliários (artigos 50).
É importante ressaltar que o Poder Judiciário está
sensível e atento ao difícil momento enfrentado pelo setor e deverá receber o
processamento da recuperação judicial com bons olhos. Até porque o
empresário que busca esse mecanismo jurídico já demonstra que está interessado
em evitar uma falência e deixa claro o interesse em garantir a continuidade
dos negócios para honrar os compromissos com credores, fornecedores e preservar
os empregos dos colaboradores, cumprindo com a função social da empresa.
Marco Aurélio Mestre Medeiros - advogado
especialista em Recuperação Judicial, com atuação em todo o país junto ao
escritório Mestre Medeiros Advogados Associados. Email: marcomedeiros@mestremedeiros.com.br
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