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terça-feira, 30 de junho de 2020

Medicamento para leucemia tem potencial para tratar câncer cerebral infantil agressivo


       
·          Em testes com células, trióxido de arsênio matou células tumorais e evitou formação de novas colônias; fármaco usado para tratar leucemia ajudou ainda a potencializar efeito da radioterapia no meduloblastoma, tumor do sistema nervoso central mais comum em crianças (meduloblastoma; imagem: AFIP Atlas of Tumor Pathology)
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Pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) conseguiram demonstrar o potencial de um medicamento, usado contra a leucemia, no tratamento do câncer de cérebro mais comum em crianças, o meduloblastoma. O trióxido de arsênio foi testado em células de uma das variedades mais agressivas desse tipo de tumor e teve resultados promissores na morte de células tumorais, além de torná-las mais sensíveis à radioterapia.
O estudo, publicado na Scientific Reports, foi apoiado pela FAPESP.
“O meduloblastoma é dividido hoje em 12 subgrupos, de acordo com características moleculares que também indicam o prognóstico. Um dos grupos com pior prognóstico é o conhecido como SHH com mutação somática no gene TP53, cujo tratamento combina a quimioterapia e a radioterapia”, diz Paulo Henrique dos Santos Klinger, primeiro autor do artigo, resultado de sua pesquisa de mestrado na FMRP-USP com bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“Neste projeto, o foco foi investigar em profundidade a desregulação das vias de sinalização que controlam o desenvolvimento embrionário normal e a sua inter-relação com o início e a progressão do câncer infantojuvenil”, explica o pesquisador.
Em crianças, a radioterapia no cérebro pode trazer graves sequelas cognitivas, endócrinas e de locomoção. Por isso, a busca por tratamentos que reduzam ou eliminem a necessidade de irradiação.
No estudo, os pesquisadores selecionaram diferentes linhagens de células tumorais do subtipo SHH e testaram diferentes dosagens de trióxido de arsênio, fármaco usado no tratamento da leucemia mieloide. Além disso, testaram a combinação do tratamento com diferentes dosagens de irradiação.
O fármaco sozinho foi capaz de matar as células tumorais e ainda evitar a formação de novas colônias celulares. Os efeitos foram potencializados quando o medicamento foi combinado com irradiação. Aplicado em células saudáveis, mostrou-se pouco tóxico.
O trióxido de arsênio sozinho, inclusive, poderia ser um tratamento para portadores de meduloblastoma de até três anos de idade, a ser explorado em combinação com quimioterápicos clássicos para o meduloblastoma. Crianças dessa faixa etária não podem ser tratadas com radioterapia no cérebro devido aos danos irreversíveis que a radiação pode causar no sistema nervoso.

Mutação
A escolha da droga se deu pelo fato de ela ser conhecida por bloquear a mesma via de sinalização celular, a SHH, na leucemia. Essencial durante a gênese do embrião humano, a SHH é desativada quando a embriogênese é concluída. Quando, por razões ainda desconhecidas, ela é reativada, acaba levando a alguns tipos de câncer, como alguns de pele, meduloblastomas e diferentes tipos de leucemia.
“Outra vantagem do trióxido de arsênio foi a capacidade de penetração na barreira hematoencefálica, estrutura que protege o sistema nervoso central de substâncias potencialmente tóxicas presentes no sangue. Estudos prévios mostraram que, no meduloblastoma, a penetração foi razoável”, explica Elvis Terci Valera, médico assistente do Hospital das Clínicas da FMRP-USP e professor da pós-graduação do Programa de Saúde da Criança e do Adolescente da instituição, que coordenou o estudo.
Normalmente, os meduloblastomas do grupo SHH têm um prognóstico intermediário, com metade dos pacientes respondendo bem ao tratamento. No entanto, quando ocorre a mutação somática no gene TP53, o prognóstico é pior. Isso porque o gene tem a função de checagem da via SHH, podendo corrigir eventuais alterações que levam ao câncer.
“A mutação germinativa nesse gene indica a chamada Síndrome de Li-Fraumeni, caracterizada por um conjunto de fatores clínicos, mas que geralmente envolve a perda de função do gene TP53 e aumenta as chances de ocorrência de diferentes tipos de tumor”, diz Klinger. Crianças e adolescentes com essa síndrome apresentam uma frequência aumentada de ocorrência de meduloblastoma, particularmente do subgrupo SHH.
Os pesquisadores agora pretendem testar o medicamento em modelos animais, a fim de verificar se os resultados serão os mesmos. Em caso positivo, o tratamento poderia futuramente ser testado em humanos.
O artigo Arsenic Trioxide exerts cytotoxic and radiosensitizing effects in pediatric Medulloblastoma cell lines of SHH Subgroup pode ser lido em: www.nature.com/articles/s41598-020-63808-9.





André Julião
Agência FAPESP 

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