Cirurgia,
radioterapia e quimioterapia podem afetar a fertilidade da mulher diagnosticada
com câncer, mas a Oncofertilidade, que une especialidades de Oncologia e
Reprodução Assistida, oferece alternativas que permitem o planejamento
reprodutivo por parte dessas pacientes
Cirurgia, radioterapia e quimioterapia podem causar
infertilidade no paciente em tratamento de câncer. A quimioterapia, por ser uma
abordagem sistêmica, que percorre todas as células – não apenas as doentes -
pode afetar os óvulos e tecido ovariano, assim como, nos homens, a qualidade
dos espermatozoides. Na maioria dos casos, a quimioterapia não causa
infertilidade definitiva. A radioterapia na região pélvica causa infertilidade
em todas a pacientes. Já a cirurgia pode causar infertilidade quando o útero
e/ou os ovários e trompas são retirados.
O conceito de preservação da fertilidade em
pacientes oncológicos - oncofertilidade - inclui todas as terapias que podem
ser implementadas para permitir que mulheres se tornem mães depois de terem
superado a doença. Com o avanço da ciência, atualmente, é possível
realizar procedimentos antes do início do tratamento oncológico. Embora a
preservação da fertilidade em pacientes com câncer seja um campo relativamente
novo da medicina, já que alguns profissionais desconhecem a especialidade.
Larissa Antunes, assessora científica da Igenomix
Brasil, explica que é importante que os pacientes discutam com a equipe médica
se há indicação para esse tipo de procedimento: “pois nem todo tratamento
oncológico irá resultar em um risco para a fertilidade, já que pode ocorrer a influência
de fatores como tipo e localização do tumor, tratamento utilizado, idade do(a)
paciente, entre outros”, explica.
Como o tratamento do câncer
afeta a fertilidade? A causa da infertilidade não é
devido ao câncer, mas sim pelos tratamentos envolvidos. A quimioterapia e a
radioterapia, embora eficazes no combate ao câncer podem danificar os óvulos e
o tecido ovariano, o que pode resultar na perda de fertilidade ou em uma
diminuição significativa da reserva ovariana. Há também um impacto
significativo na fertilidade masculina. Dependendo do tratamento, este pode
afetar o esperma e reduzir a qualidade do sémen, o que pode levar à
infertilidade temporária ou, em alguns casos, permanente.
Como é determinada a melhor
opção de preservação da fertilidade? As diferentes
estratégias que visam à preservação da fertilidade em pacientes diagnosticados
com câncer são escolhidas com base no diagnóstico médico, na idade do paciente
e nos tratamentos médicos planejados. Nas mulheres, é mais comum o congelamento
dos óvulos. Embora seja a prioridade das pacientes iniciar a quimioterapia ou
radioterapia o mais rápido possível, a equipe médica (composta por cirurgião
oncológico, oncologista clínico, radio-oncologista e especialistas em
reprodução assistida), vão atuar em conjunto para conseguir obter um número
suficiente de óvulos num período muito curto.
Com os medicamentos antagonistas do hormônio GnRH e
ao regime de estimulação ovariana de protocolo curto, o tratamento pode ser
iniciado a qualquer momento durante o ciclo menstrual. Normalmente, entre a
primeira visita e a coleta dos óvulos, não passando de 14 a 16 dias. Após
concluído, a paciente já pode ser submetida ao tratamento oncológico. Além
disso, o congelamento de óvulos é seguro e não traz prejuízos para a paciente
diagnosticada com câncer. Por outro lado, no contexto masculino, utiliza-se a
preservação do sêmen, onde se encontram os gametas masculinos. Pacientes com
câncer do sexo masculino podem congelar o esperma antes de se submeterem a
qualquer tratamento.
Os riscos de câncer
hereditário - O câncer hereditário está associado à minoria dos
casos, representando cerca de 10% e se refere aos indivíduos que possuem uma
variante em um gene que confere risco aumentado para câncer. Apesar de serem a
minoria dos casos, cada pessoa com síndromes de predisposição hereditária ao
câncer possui risco aumentado de desenvolver a doença em relação à população
geral.
Existem diversos genes e mutações associados ao
câncer hereditário. Entre os principais, encontra-se o gene TP53,
associado à síndrome de Li-Fraumeni. Essa é uma síndrome com altos riscos para
um espectro diversificado de neoplasias malignas na infância e na idade adulta.
Cinco tipos de câncer são responsáveis pela maioria dos tumores encontrados
nesses pacientes: carcinomas adrenocorticais, câncer de mama, tumores do
sistema nervoso central, osteossarcomas e sarcomas de tecidos moles.
Outros genes importantes são BRCA1
e BRCA2,
associados à síndrome de câncer de mama e ovário hereditário. Pacientes com
variante patogênica nesses genes possuem risco aumentado para câncer
principalmente de mama (homens e mulheres), ovário, próstata e pâncreas. O gene
BRCA1
ficou muito conhecido após a atriz Angelina Jolie compartilhar que realizou uma
mastectomia bilateral profilática após a identificação de uma variante
patogênica.
Apesar do câncer hereditário ser primariamente
associado ao câncer de mama, outros tipos podem apresentar uma predisposição
genética. Um exemplo é a Polipose associada ao gene MUTYH,
caracterizada por um aumento do risco para câncer colorretal, podendo estar
ligada à presença de pólipos. Essa condição costuma se destacar por seu padrão
de herança autossômico recessivo, ou seja, pacientes acometidos costumam
apresentar variante patogênica nas duas cópias do gene MUTYH.
A avaliação e o diagnóstico das síndromes de câncer
hereditário devem ser realizados por profissional capacitado, geralmente um
geneticista. O aconselhamento genético pode auxiliar o(a) paciente a
compreender os benefícios e limitações dos testes genéticos, assim como os
riscos para outros familiares e o que pode ser realizado para planejamento
familiar, incluindo os testes genéticos pré-implantacionais.
Avanço na medicina - testes
genéticos para detectar os genes ligados ao risco da síndrome do câncer
hereditário
Para pacientes com síndromes de predisposição
hereditária ao câncer, ou seja, que possuem uma variante (mutação) em um gene
que confere risco aumentado para câncer, pode existir risco aumentado para que
os filhos ou filhas desenvolvam câncer. Nesses casos, quando a variante foi
identificada, é possível realizar o Teste Genético Pré-Implantacional para Doenças
Monogênicas (PGT-M). Por meio desse teste, é possível
identificar e selecionar os embriões que não herdaram a variante e não apresentam
o risco aumentado para desenvolver a condição.
Larissa Antunes ressalta que os embriões
selecionados livres da mutação genética ligada ao risco de câncer hereditário
terão menor probabilidade de desenvolver esta doença, o que pode levar a uma
redução de custos em tratamentos. Menos indivíduos necessitarão de cuidados
médicos intensivos e tratamentos caros, impactando positivamente nos sistemas
de saúde: “Com menos recursos gastos na saúde, as sociedades podem direcionar
esses recursos para outras necessidades, como educação, infraestrutura,
pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico. Isso pode beneficiar a
sociedade como um todo, proporcionando avanços em diferentes setores”, defende.
A especialista ressalta que, por meio dessa
seleção, é possível melhorar a qualidade de vida das pessoas, tanto em termos
de saúde física quanto mental. Menos pessoas estarão em risco de enfrentar
doenças debilitantes e incapacitantes, permitindo uma vida mais longa e
saudável: “Diversas famílias não precisarão passar por tratamentos dolorosos,
enfrentar incertezas e preocupar-se com os altos riscos de ocorrência de
diferentes condições nas próximas gerações”, diz.
Porém, se antes o que interessava era somente a
cura do câncer, com o sucesso dos tratamentos e aumento da expectativa de vida,
hoje a oncofertilidade pode ajudar as pessoas jovens a seguirem seus planos de
família após vencer a doença. Por isso, é importante que os médicos conversem
com seus pacientes sobre essa possibilidade. Recentemente, por uma decisão
tomada por unanimidade pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as
operadoras de planos de saúde passaram a ter a obrigação de custear o
procedimento de criopreservação dos óvulos de pacientes com câncer, como medida
preventiva diante do risco de infertilidade, até a alta do tratamento de
quimioterapia. Ações que proporcionam maior qualidade de vida para quem
enfrenta e supera o câncer.
Igenomix