O STF, na última quarta-feira (24/06),
firmou convicção em favor do emprego público como ideal projeto de vida dos
brasileiros. Seria essa uma espécie de "interpretação conforme a
Constituição" do disposto em seu art. 3º, inciso III, que trata da redução
das desigualdades sociais?
Até onde me lembro, sempre foi assim. Na
minha infância, toda mãe amorosa, todo pai zeloso sonhava com um bom emprego
público para o futuro de seus pimpolhos. Lembro que lá na minha Santana do
Livramento, as referências eram o Banco do Brasil, a carreira militar, fiscal
da receita. Não sei se essas posições ainda se mantêm cobiçadas. O que sim,
sei, é que quanto mais a atividade privada patina em meio às sucessivas crises
da economia ao longo das últimas décadas, maior a atração pelos concursos e
mais aumenta a população concurseira. Estima-se que, todo ano, cerca de 10
milhões de brasileiros busquem a rede de ensino que opera com foco nesse
atraente mercado.
Jovens habitualmente pouco ou nada
ligados ao estudo no sistema formal, público ou privado, ao ambicionarem um
cargo acessível por concurso, passam a queimar pestanas que cruzaram intactas e
dispensadas de maior esforço todos os anos anteriores.
O lado bom dessa história é que,
aprovado ou não, o concurseiro vai aprender com esforço próprio um pouco mais
do que trazia como patrimônio de conhecimento após encerrar seu mal aproveitado
ciclo escolar. O lado ruim é o desestímulo para a atividade privada. Impossível
recusar o fascínio de uma vida sob a proteção do Estado, a subsistência
garantida do ato de nomeação ao túmulo. Estabilidade e segurança nessas
proporções não costumam ser disponíveis na atividade autônoma ou no setor produtivo
da economia.
Voltemos, então, à recente decisão do
STF. Na crise que a covid-19 fez desabar sobre a economia brasileira, empregos
viram pó e postos de trabalho, fumaça. Para alimentar a esperança de não voltar
ao envio de currículos, às ruas e às entrevistas, trabalhadores concordam com
reduzir seus salários e suas jornadas. De algum jeito, que provavelmente lhes
vai demandar angustiantes e longos
ajustes no orçamento familiar, colaboram com sua quota de sacrifício para que
os tutores da pandemia não acabem de vez com seu posto de trabalho.
Já no que concerne ao setor público, o
STF (aquele das lagostas e vinhos premiados), por "sólida" convicção
de 6x5 em ambos os casos, decidiu que os repasses do Executivo aos outros
poderes não devem ser reduzidos em caso de frustração de receita, nem podem os
governantes diminuir vencimentos de servidores para compatibilizar sua despesa
ao caixa, conforme impõe a responsabilidade fiscal. Conclui-se daí que esta é
uma crendice, atingível por feitiços, artes ocultas ou milagres.
Não é sensato, nem soa como democrático
que, num julgamento desempatado por um único voto e sendo parte interessada, o
STF (elite do setor público) derrube decisões tomadas pela maioria dos quase
600 congressistas. Esse é mais um primor da Carta de 1988, que não impõe um
número mínimo de votos para que o STF revogue decisões do Congresso.
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