Consumo de álcool no Carnaval extrapola
os limites e é perigoso, diz especialista
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Não dá para negar: muitos brasileiros encaram a bebedeira
como uma extensão do Carnaval e acreditam que nesses quatro dias de folia tudo
é permitido. Esse comportamento, principalmente entre os jovens, confere
erroneamente às bebidas alcoólicas o título de protagonista da festa nos bailes
em salões e nas passarelas do samba espalhadas pelas ruas Brasil adentro. Essa
prática é bem comum porque o álcool e outras substâncias ajudam o público a
ficar mais desinibido para aproveitar ao máximo os dias de folia.
Os próprios hábitos dos brasileiros contribuem para
essa situação. Dados
da Organização Mundial da Saúde (OMS), a ingestão de álcool puro ao ano por
pessoa no Brasil chegou a 8,9 litros em 2016, superando a média mundial de 6,4
litros.
Outro estudo demonstra que a relação com o álcool
começa cedo, geralmente por incentivo de parentes e amigos. De acordo com a Pesquisa
Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada em 2015, 73% dos escolares
na faixa etária de 16 a 17 anos já experimentaram uma dose de bebida alcoólica
e cerca de 37% deles sofreram algum episódio de embriaguez na vida.
Na opinião da psiquiatra Alessandra Diehl,
especialista em dependência química, sem dúvida, o álcool é o grande vilão do
Carnaval. “Como a folia dura quatro dias, as pessoas tendem a beber - sem
intervalos - durante todo esse período. A sociedade, em geral, costuma encarar
o uso de substâncias tóxicas ao organismo como algo recreativo, principalmente
em ambientes de festa”, diz.
Ela acredita que nesse momento, mesmos aqueles que
não têm costume de beber, acabam fazendo por influência dos amigos,
principalmente. “Ocorre um tipo de pressão social para o consumo de álcool e
outras drogas durante o Carnaval. Além disso, a falsa sensação de prazer e
relaxamento, proporcionada pelos “porres”, é mais um fator que leva a pessoa a
querer aumentar o consumo, o que acaba tendo efeitos negativos para si e para
os outros”, argumenta a psiquiatra.
Alessandra explica que o uso abusivo de bebidas no
Carnaval é perigoso porque, geralmente, o indivíduo experimenta sensações
prazerosas. E o que era para ser mais uma brincadeira festiva no feriado pode
virar rotina: as pessoas ficam mais propensas a repetir esse hábito e a buscar
por mais prazer. “As consequências são inúmeras e uma delas é o encurtamento do
caminho para a dependência do álcool e outras drogas. Sob o efeito da bebida, o
nível de julgamento é alterado e as pessoas se sentem seguras para consumir
outras substâncias. Como todos sabem, a bebida alcoólica é a porta de entrada
para as drogas ilícitas como a maconha e cocaína, por exemplo”, avisa a
psiquiatra.
Lança-perfume e ecstasy também
fazem parte da folia
Quando falamos em Carnaval, outra droga vem em
nossa mente é o lança-perfume. Inalável, leva em sua composição cloreto de
etila, clorofórmio e alguma essência aromática. O efeito, como o
entorpecimento, é parecido com o do álcool. “O lança causa ainda euforia e confusão
mental. Era usado livremente no carnaval de todo o país nos anos 20. A
substância era borrifada à esmo para os foliões, “perfumando-os” e fornecendo
sensações agradáveis”, informa Alessandra.
Ela alerta que o que muitos foliões não sabem é que
essa droga é absorvida pela mucosa pulmonar e seus componentes são
transportados, via corrente sanguínea, aos rins, fígado e sistema nervoso. O
lança ainda libera adrenalina no organismo, acelera a frequência cardíaca,
proporcionando sensação de euforia e desinibição ao mesmo tempo. Promove ainda
perturbações auditivas e visuais, perda de autocontrole e visão confusa.
“Outro perigo do lança-perfume é que seus efeitos
são rápidos e, por essa razão, os usuários tendem a inalá-lo diversas vezes,
potencializando a ação de seus compostos sobre o organismo. Desse modo, o uso
abusivo pode desencadear em quadros mais sérios, como falta de ar, desmaios,
alucinações, convulsões, paradas cardíacas e até morte. Além disso, por alterar
a consciência do indivíduo, permite com que este esteja mais vulnerável a
acidentes, assim como acontece com o excesso do álcool”, enfatiza Alessandra
Diehl.
Apesar de proibido, o comércio ilegal do
lança-perfume e de outras drogas ilícitas corre livremente nos blocos
carnavalescos espalhados pelo Brasil. O ecstasy, por exemplo, é mais um “hit”
do Carnaval.
Essa é uma droga sintética, fabricada em
laboratório, a partir de componentes não naturais. O nome técnico do ecstasy é
MDMA (metilenodioximetanfetamina). Essa substância também é conhecida como
“droga do amor”, porque aumenta a percepção de cores e sons, e também amplifica
as sensações táteis durante o sexo. “Trocando em miúdos, sua ação estimulante
aumenta a temperatura corporal e a sensibilidade ao toque. No entanto, seu uso
combinado ao álcool, algo que é bem comum nos blocos de Carnaval, é um tiro no
escuro para usuários e médicos: não se sabe a composição exata da droga, o que
complica atendimento em prontos-socorros”, afirma Alessandra Diehl.
Políticas de prevenção
Na visão da especialista, a falta de políticas de
prevenção é um dos principais fatores que contribuem para o consumo abusivo de
álcool e outras drogas no Brasil, em especial durante a época de Carnaval. A
comercialização desse tipo de bebida é feita sem um controle rígido em diversos
estabelecimentos, como padarias e lojas de conveniência, e por vendedores
ambulantes.
A redução de danos também pode começar em casa e na
escola, por meio da educação. A informação é uma ferramenta eficaz para a
prevenção. Todos esses assuntos devem ser pauta de conversas constante, no
ambiente familiar, escolar e até na publicidade, que deveria ser feita pelas
autoridades competentes na área da saúde, segundo Alessandra Diehl. “É preciso
bater na tecla, de forma incansável, para mostrar para nossa população que o
consumo de drogas pode ser fatal. Vale a pena arriscar a vida em troca de
minutos de euforia e ilusão? Cuidar de si e cuidar dos outros é uma máxima para
todos que desejam aproveitar o Carnaval de forma saudável, sem riscos de
complicações”, finaliza a psiquiatra.
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