Após quatro dias e meio fechada por conta do
feriado de Carnaval, a bolsa de São Paulo reabriu nesta quarta-feira (26) com
surpresas desagradáveis aos investidores. Além de ver o Ibovespa, principal
índice do mercado acionário brasileiro, despencar mais de 6%, os investidores
também acompanharam a disparada do dólar, moeda que já vinha renovando suas
máximas históricas antes mesmo da pausa.
Para tentar conter a alta da moeda americana, o
Banco Central resolveu agir e anunciou o leilão de mais de US$ 500 milhões em
swaps cambiais. A medida teve efeito imediato, mas restrito e o dólar voltou a
se valorizar frente ao real logo em seguida. O BC ainda comunicou que ofertará
mais de US$ 1 bilhão em swaps amanhã, mas nem isso foi capaz de evitar que o
dólar renovasse seu recorde intradiário, passando dos R$ 4,44, em alta de mais
de 1%.
Este movimento tem tudo a ver com a disseminação do
coronavírus pelo mundo e o cálculo do impacto que a doença pode ter na economia
global. Porém, para que o dólar chegasse ao atual patamar, o Covid-19 não foi o
único responsável.
A disparada da moeda americana começou em agosto do
ano passado. Na ocasião, o mercado tentava digerir os dados fracos da retomada
econômica brasileira, a apresentação do pedido de impeachment de Donald Trump e
os desdobramentos da guerra comercial entre China e EUA. Para tentar conter a
alta da moeda, o Banco Central passou a promover leilões diários de dólar à
vista, uma tática que não era utilizada desde 2009 e que consistia em vender
dólares das reservas internacionais em troca de reais para tentar aumentar a
oferta da moeda estrangeira e baratear o custo por unidade.
Naquele momento, também com a intenção de conter a
disparada da moeda, que ainda se encontrava abaixo dos R$ 4, o Banco Central
fez operações de swap cambial e swap cambial reverso. Consideradas mais comuns,
elas consistem em uma espécie de “aposta” firmada entre o BC e os investidores.
No caso do swap tradicional, o Bacen oferece
contratos cujo pagamento consiste na oscilação do dólar acrescido de mais um
prêmio e, em troca, o investidor se compromete a pagar ao BC a diferença da
taxa de juros durante o período de validade do contrato. É como se os
investidores apostassem que o dólar subirá mais do que os juros, mas não
precisassem comprá-lo naquele momento, uma vez que estariam protegidos no
futuro no caso da valorização da moeda, o que dá um alívio instantâneo ao
mercado. Enquanto isso, no caso do swap cambial reverso, a aposta é invertida e
serve para o Banco Central também conseguir frear uma queda brusca da cotação
da moeda americana. A vantagem desse tipo de operação é que elas não impactam
diretamente as reservas cambiais, já que não há troca financeira de moedas e
liquidação apenas de reais.
Ainda sobre agosto de 2019, vale dizer que tal
esforço do Banco Central até resultou em um alívio momentâneo, mas foi só. Com
as tensões internacionais à flor da pele e a demanda de multinacionais por
dólares à vista para pagar dívidas no exterior, a moeda americana voltou a
subir, saindo do patamar de R$ 3,90 para os R$ 4,20, uma alta de 5,90% em pouco
mais de 20 dias.
A disparada obrigou o BC a agir novamente nos meses
seguintes e, desta vez, a opção foi por realizar leilões em linha, ou seja,
venda de dólares com compromisso de recompra no futuro pelo preço em que a
moeda tiver na data final do contrato. A intenção era manter a liquidez do
mercado em dezembro, momento em que empresas e fundos de investimentos passaram
a enviar as remessas de lucros e dividendos para fora do Brasil e diminuíram a
oferta da divisa estrangeira dentro do país. Neste período, o dólar voltou a
ceder, saindo dos R$ 4,27 para R$ 4,03, uma queda de 5,70% na reta final do
ano.
Assim, chegamos a janeiro, e muita gente não
esperava que tanta novidade acontecesse em tão pouco tempo. É verdade que no
primeiro mês do ano a demanda pela moeda americana diminuiu e o Banco Central
não realizou leilões, permitindo que o dólar subisse pouco a pouco até voltar a
rondar a região dos R$ 4,20. No entanto, foi só chegar fevereiro e um turbilhão
de notícias - desde o avanço de um novo vírus letal na China até declarações
descuidadas de Paulo Guedes -, para que que o dólar voltasse a disparar.
Com o governo afirmando e reafirmando que não
estava preocupado com a alta do dólar, a moeda foi subindo, sem que o Banco
Central fizesse grande esforço para contê-la. Na última sexta-feira (21), após
bater o recorde nominal histórico intraday de até então, o BC anunciou swap
cambial de US$ 1 bilhão e conteve à divisa aos R$ 4,39. Nesta quarta-feira, no
entanto, mesmo após novas medidas, a moeda acompanhou o sentimento de risco
global e subiu novamente até alcançar a nova marca de R$ 4,44, testando os
limites de atuação do Banco Central e a política do governo de menos intervenções
no câmbio.
Ernani Reis
- analista da Capital
Research
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