Sem aprimoramento das
políticas públicas, doença deve se tornar principal causa de óbitos em até 13
anos
Se o Brasil não investir em mudanças substanciais nas
políticas públicas de prevenção, detecção e tratamento do câncer, a doença se
tornará a principal causa de mortes no País já em 2029. É o que aponta o último
estudo do Observatório da Oncologia, uma plataforma de análise de dados criada
pelo movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC).
Para chegar a essa projeção, a pesquisa analisou dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) entre os anos 2000 e
2013 e projeções para o futuro (até 2040), comparando o número de óbitos e
incidência do câncer com os de doenças cardiovasculares (como infarto e AVC),
atuais campeãs de óbitos no Brasil. Em 2029 a taxa de mortalidade de tumores
chegará a 115 a cada 100 mil habitantes, enquanto o índice de óbitos por
doenças cardiovasculares será de 113 por 100 mil. Atualmente, as duas doenças
juntas matam 542 mil brasileiros todos os anos, conforme dados do Datasus.
Segundo o médico patologista e presidente da Sociedade
Brasileira de Patologia (SBP), Clóvis Klock, projeções como a do Observatório
da Oncologia devem servir como um sinal grave de alerta para o Pode Público,
motivando o aprimoramento das estratégias para enfrentar a doença.
Ele enumera sete medidas importantes que o Brasil deve
adotar como formas de combate ao avanço do câncer:
Intensificar a vacinação da população contra o HPV:
o controle de fatores importantes de risco é uma das formas mais economicamente
viáveis de combater a mortalidade do câncer. O Vírus do Papiloma Humano (HPV),
por exemplo, é conhecido por sua associação ao desenvolvimento do câncer de
colo do útero.
“Desde 2014 temos a vacinação de meninas contra o HPV, uma
estratégia que sem dúvida deve diminuir o número de casos e mortes por esse
tipo de tumor. Precisamos agora investir na manutenção e ampliação dessa
estratégia, lutando pela erradicação de câncer colo uterino causado por essa
infecção”, aponta.
Investimento em hábitos saudáveis: assim como no caso
da vacinação contra HPV, a estratégia de combater o câncer de maneira
preventiva pode ser feita atacando fatores mais passíveis de alteração do que a
propensão genética. O fumo, por exemplo, é responsável por cerca de 90% das
mortes por câncer de pulmão.
“Investir nesses hábitos saudáveis é uma tarefa de
políticas públicas abrangentes, focadas em educação e construídas para atuarem
em longo prazo, mas de extrema relevância para o objetivo de combater a
mortalidade do câncer, assim como de outras doenças”, ressalta o patologista.
Rastreamento: depois da prevenção, o diagnóstico
correto e precoce é uma das principais estratégias na diminuição da mortalidade
do câncer. Campanhas de conscientização para o autoexame e rotinas efetivas de
exames como mamografia e Papanicolau, por exemplo, são valiosas para a detecção
da doença em seus estágios iniciais.
“Diagnosticar um tumor em seu princípio é fator
determinante para ditar a sobrevivência do paciente, diminuindo as sequelas e
os custos que a doença representa para o sistema de saúde, uma vez que é mais
fácil e barato tratar um câncer antes de seu crescimento ou metástase”,
explica.
Medicina de precisão: as opções disponíveis para o
tratamento do câncer evoluíram muito nos últimos anos tendo como combustível os
avanços de áreas como genética e biologia molecular. A chamada medicina de
precisão traz alternativas assertivas com mais expectativas de cura e menos
sequelas.
“Vale lembrar que não existe medicina de precisão sem um
diagnóstico correto e afinado, realizado pelo médico patologista. Esse laudo
serve como direcionamento da conduta terapêutica, permitindo ao oncologista
saber com o que ele está lidando e quais são as suas alternativas”, conta o
presidente da SBP.
Consolidação de dados: segundo Clóvis Klock, é
fundamental um investimento crescente para a consolidação dos dados referentes
ao câncer. Com base nisso, o País pode identificar deficiências no sistema e
concentrar esforços em saídas relevantes para populações específicas.
“O Brasil ainda engatinha no quesito epidemiologia. Quando
falamos câncer estamos nos referindo a um ‘guarda-chuva’ que compreende mais de
mil doenças diferentes. Reunir toda a informação possível sobre essas variantes
e suas especificidades é fundamental, principalmente em um país plural e de
dimensões continentais como o nosso”.
Aprofundar a parceria com as sociedades médicas:
para o patologista, o constante diálogo entre o governo e as sociedades de
especialidade envolvidas na luta contra o câncer é outro ponto chave para
reverter o cenário atual. Segundo ele, essas instituições são uma das pontes
capazes de ligar os responsáveis pelas políticas públicas à linha de frente
responsável por aplica-las e aferir seus efeitos.
Resolver o nó do sistema de saúde e prepará-lo para o
futuro: unindo fatores como prevenção, diagnóstico e tratamento, a
manutenção do sistema de saúde é a esfera superiora no combate ao câncer,
ditando como todas as políticas públicas são aplicadas.
“É uma questão extensa e extremamente complexa, mas prioritária
e da qual não se pode fugir. Para impedir o avanço do câncer precisamos, antes
de tudo, resolver o nó do sistema de saúde, colocando na mesa questões como o
reajuste de honorários e de procedimentos e até o financiamento dos sistemas
públicos”, finaliza.
Sobre a SBP
Fundada em 1954, a Sociedade Brasileira de
Patologia (SBP) atua na defesa da atuação profissional dos patologistas,
oferecendo oportunidades de atualização e encontros para o desenvolvimento da
especialidade. Desde sua instituição, a SBP tem realizado cursos, congressos e
eventos com o objetivo de elevar o nível de qualificação desses profissionais.
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