Perdi a conta do número de vezes em que
participei de debates de natureza política ou ideológica tendo do outro lado da
mesa professores de História que não dissimulavam suas convicções comunistas,
ou marxistas, ou socialistas. Não são poucas, por outro lado, as mensagens que
recebo contendo relatos de alunos sobre a doutrinação política desenvolvida
nesses cursos tão importantes ao desenvolvimento intelectual e cultural dos
estudantes. Por outro lado, sempre que conheço algum professor ou aluno fora
desse mainstream doutrinário, sei que
estou diante de um valoroso resistente.
Afinal, por que tantos professores de
História são comunistas? E, numa extensão disso, por que, embora em grau menor,
igual tendência ocorre em outros cursos das Ciências Humanas? Creio que se
trate da convergência de dois fatores. De um lado, a prévia doutrinação dos
colegiais no ensino fundamental e médio; de outro, a conveniência política dos
partidos mais à esquerda do leque ideológico que sabem quanto vale o domínio da
narrativa histórica para as determinações políticas do presente e para os
alinhamentos do futuro.
Não se peça da ciência aquilo que ela
não pode proporcionar. Os eventos da História sempre admitem várias
interpretações, notadamente quando envolvem conflitos. Nestes casos, obviamente,
as partes em disputa têm divergentes pontos de vista sobre os acontecimentos e
farão deles relatos desiguais.
É nessa tensão que entram Marx e suas
convicções sobre o futuro. Ao se assumir como profeta, o alemão fundou uma
religião, e seus seguidores são convocados a um ato de fé. Como bem ensinou
Olavo de Carvalho, ao ver a história desde seu ponto de chegada, os seguidores
de Marx com estrado de professor, púlpito de pregador, teclado de jornalista ou
escritor, microfone de comunicador passam a ver tudo que acontece entre o ponto
de partida e o ponto de chegada como pá e picareta para abrir o caminho.
Portanto, não há limites para a manipulação dos fatos e não há verdades que se
mantenham além do tempo necessário a dar um passo adiante.
Eis o motivo pelo qual o que antes se
chamava, de modo adequado "interpretações da História", passou a ser
denominado pelos marxistas como "guerra de narrativas", desdobramento
de sua indispensável luta de classes. Danem-se as perspectivas dos atores nos
fatos narrados! Aliás, danem-se os próprios atores! O único interesse do relato
é obter vantagem para o processo político do momento.
Assim fica fácil entender, também, o
processo pelo qual militantes comunistas insistem em dizer que lutavam pela
democracia contra o regime militar nos anos 60 e 70. Ora, eles tinham e mantêm
ojeriza pela democracia que denominam burguesa e, por isso, tanto se empenham,
ainda hoje, em implantar seus conselhos populares (sovietes). No entanto, com
vistas aos fins, reconstroem a própria história. Lutaram para implantar uma
ditadura comunista de inspiração cubana em nosso país e hoje negam haver crido
no que creram, pelo que pegaram em armas, e ainda creem.
Não é possível fazer política nesses
moldes sem usar e abusar da História e sem meter o dedo na jugular dos fatos.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
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