Nascidos sob o advento da internet e do boom tecnológico sofrem com a
falta de estímulos nas atividades escolares, o que faz com que crianças sejam
diagnosticadas erroneamente e medicadas sem necessidade.
Depois das gerações X, Y e
Z, agora chegou a vez da geração Alpha, composta por pessoas nascidas depois de
2010, sob o advento da internet e do boom tecnológico, e que está sofrendo de
um pseudo Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH).
Com videogames,
computadores, smartphones, tablets e smart TVs as crianças dessa geração são
bombardeadas passivamente todos os dias com fortes estímulos como:
movimentos, cores, sons e luzes. São muitos recursos e apelos que ativam a
atenção da criança, que se habitua facilmente a interagir com o mundo
virtual.
Mas quando trazidas para o
mundo real, onde precisam atuar com tarefas corriqueiras, como assistir aula na
escola, essas crianças apresentam dificuldades em manter a atenção, em função
da falta de estímulos atraentes que dificultam a ativação dos circuitos
atencionais e emocionais.
O resultado é claro: a
criança não se interessa pela aula e atrapalha colegas, professores e a escola,
como um todo.
Segundo Simone Marangoni,
presidente do iSIM Instituto de Neuropsicologia Simone Marangoni, o roteiro é
assim: os pais são chamados na escola com a reclamação que a criança não presta
atenção na aula, algumas vezes essa criança apresenta déficit de aprendizagem,
outras não, só atrapalha a rotina da escola. A escola, então, solicita aos pais
que busquem ajuda médica. Assim, os pais buscam auxílio em pediatras,
neurologistas ou psiquiatras. Nunca procuram um psicólogo, pois os professores
e pais acham que o problema é orgânico. Se considerarmos que o TDAH é um
transtorno biológico-neurológico, o tratamento também é biológico e justifica o
uso de medicamentos, como Ritalina.
Na França, apenas 0,5% das
crianças são diagnosticadas com TDAH, enquanto 9% são assim diagnosticadas nos
Estados Unidos. “Como é que a epidemia de TDAH, que tornou-se firmemente estabelecida
nos Estados Unidos, foi quase completamente desconsiderada com relação a
crianças na França?” Isto se dá pela visão dos psiquiatras infantis franceses,
que consideram o TDAH uma condição médica que tem causas psico-sociais e
situacionais e preferem avaliar o problema subjacente que está causando o
sofrimento da criança; “não o cérebro da criança, mas o contexto social da
criança ... Esta é uma maneira muito diferente de ver as coisas, comparada à
tendência americana de atribuir todos os sintomas de uma disfunção biológica a
um desequilíbrio químico no cérebro da criança”
Dados da consultoria IMS
Health do Brasil mostram que as vendas
de um medicamento de tarja preta dispararam: 2,75 bilhões de caixas de cloreto
de metilfenidato foram comercializadas no país entre julho de 2012 e julho de
2013. Em dez anos (de 2002 a 2013), houve um impressionante aumento de 775% no
consumo de Ritalina (um dos nomes comerciais mais conhecidos do composto, que
pode aparecer nas farmácias também como Concerta e Venvanse), segundo tese de
doutorado da psicóloga Denise Barros desenvolvida na Universidade Estadual do
Rio de Janeiro (Uerj). Os números foram obtidos com base nos relatórios sobre
produção, importação e estoque de metilfenidato da Junta Internacional de
Controle de Narcóticos, órgão vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU).
A tendência de crescimento já havia sido apontada em 2012, em um boletim da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que admitiu a ocorrência de
“possíveis distorções” na utilização dessa medicação.
“Este é problema cultural no
Brasil que piora com atuação da indústria farmacêutica. As crianças passam por
uma série de exames, como ressonância magnética e eletroencefalograma para
buscar a causa orgânica, uma alteração no cérebro. Normalmente, 80% dos
casos não têm causa orgânica e sim funcional”, esclarece Simone.
Simone explica que as
funções mentais são artificiais ao cérebro. “Não existe atenção! A maior parte
das crianças que, hoje, apresentam o que é o chamado de TDAH, Transtorno de
Déficit de Atenção/Hiperatividade, não tem os recursos atencionais
desenvolvidos plenamente e que necessitam ser aprendidos e treinados. Hoje, os
professores continuam atuando, supondo que o nível de atenção da criança seja
igual ao da minha geração, o que não é realidade”.
O perigo está no diagnóstico
de um Pseudo-TDAH com tratamento medicamentoso, que pode causar efeitos
colaterais negativos, afetando diretamente o funcionamento cerebral.
A Ritalina, cloreto de
metilfenidato, é um estimulante do grupo dos anfetamínicos, que altera
todo o perfil biodinâmico das crianças, e causa o mesmo efeito devastador que o
uso prolongado de cocaína: muitas crianças se tornam robôs, ficam letárgicas,
deprimidas e introvertidas, podem ter seu crescimento retardado ao romper os
ciclos dos hormônios de crescimento liberados pela glândula pituitária,
causando graves distúrbios no cérebro da criança. “A Ritalina reprime as
atividades criativas, espontâneas e independentes na criança fazendo com que
ela se torne mais dócil e obediente”.
O problema não está na criança,
nem na escola, nem nos pais e sim no entendimento biológico e natural das
funções mentais. “Enquanto acharmos que todas as nossas funções mentais são
naturais, assim como nascem nossos cabelos, iremos buscar uma solução
orgânica”, esclarece Simone.
Para Marangoni, o ideal é
analisar como a atenção da criança está funcionando, para saber se, de fato,
sofre de TDAH, e o primeiro passo para isso é a avaliação neuropsicológica que
faz o mapeamento das funções mentais de atenção, concentração, memória, processamento
das informações, planejamento e verificação do comportamento próprio da
criança, além de analisar como os aspectos afetivos e emocionais interferem nos
processos intelectuais.
A avaliação neuropsicológica
também serve como instrumento para diagnóstico e ajuda na identificação de
autismo, transtorno global de desenvolvimento, transtorno opositor, demência,
declínio cognitivo, depressão e outras perdas cognitivas. Como instrumento para
plano terapêutico é peça chave para a identificação do fator principal que
desencadeia as dificuldades nas ações cotidianas.
Os relatórios de avaliação
neuropsicológica apontam quais são as funções cognitivas que apresentam
déficits, descreve os processos emocionais (ansiedade, angústia,
irritabilidade, auto-estima, auto-imagem, entre outros) e qual é o nível de
compatibilidade com a classificação dos transtornos (CID, DSM).
“Com o resultado da
avaliação neuropsicológica, passamos para a fase da estimulação cerebral, que
maximiza o desempenho das funções mentais da criança. Nesta fase, criamos
e executamos estratégias para o máximo desenvolvimento das funções de atenção,
memória, processamento das informações (visuais, auditivas, táteis e motoras),
pensamento, afeto, emoção, fala e planejamento da ação, o que resulta na
transformação da dinâmica cerebral. A criança melhora suas relações
interpessoais e otimiza suas ações do dia-a-dia, a partir do novo desempenho do
cérebro”, complementa Marangoni.
A dinâmica de trabalho
inclui exercícios, jogos e orientação a gestores, pais e cuidadores que
transformam o funcionamento do cérebro, auxiliando a terapêutica medicamentosa,
caso seja necessária.
“Hoje, reconhecemos a
plasticidade cerebral, que é a capacidade do cérebro de se reorganizar, no
entanto isso não acontece espontaneamente, uma vez que depende da qualidade das
atividades e relações sociais do dia a dia. Também podemos entrar em
outra questão: tudo está muito pronto, queremos resolver os problemas
rapidamente e a medicação é o caminho que elimina momentaneamente o sintoma,
mas não soluciona o problema pois não transforma a função mental. A proposta é
a avaliação para compreensão das funções, seguida de estimulação para
transformá-las e, por fim, a reavaliação para confirmar o resultado
esperado”, finaliza Marangoni.
Nenhum comentário:
Postar um comentário