O poder judiciário vem pacificando entendimento de
que, embora as instituições financeiras não estejam sujeitas à limitação das
taxas de juros remuneratórios, conforme Súmula 596, do STF, os magistrados
devem fazer análise da taxa de juros contratual com as médias de mercado
apresentadas pelo Banco Central (BACEN) no mês da formalização do empréstimo.
Com a liberação da cobrança das taxas de juros, o
Judiciário absorveu a obrigação de verificar da existência de abusividade no
que tange às relações consumeristas com instituições financeiras. Para a
verificação de abusividade de um valor de taxa de juros remuneratórios é
necessário um parâmetro de comparação, sendo que a jurisprudência se inclina
pela adoção das taxas de juros divulgadas mensalmente pelo Banco Central.
Ocorre que tal critério é inviável e da forma como
vem sendo utilizado poderá impactar a economia nacional, pois os índices
contidos no site do BACEN nada mais são do que a apuração das informações
contábeis que todas as instituições financeiras, quando dos fechamentos dos
seus respectivos balanços de créditos, informaram à instituição central. Ou
seja, cada banco cadastrado no BACEN informa quantos contratos fez, que taxas
aplicou em cada um deles e os valores que liberou de crédito. Em posse de tais
informações o BACEN faz uma média e a divulga no seu sistema.
A utilização desse parâmetro em ações revisionais
abre duas problemáticas principais. A primeira é que as médias são divulgadas
sempre após a conclusão de um período de transações, ou seja, a média informada
hoje refere-se às operações realizadas no mês anterior. Assim, a utilização desse
critério impede que as instituições financeiras que passarão a compor o polo
passivo tenham qualquer chance de se adequar à média, pois sequer dela tinham
ciência no momento em que liberaram crédito aos seus consumidores.
A segunda é que a revisão com base nesse critério
implica em constante alteração dele mesmo. Suponha-se que as instituições se
baseiem pela última média disponibilizada pelo BACEN para realizar os seus
contratos, cobrando exatamente a média divulgada, por exemplo, 20% ao ano,
considerando que a instituição A cobrou 10% a.a e a B 30% a.a (10+30/2=20).
Se um consumidor ingressar com ação revisional de
contrato, de acordo o entendimento atual da jurisprudência, logrará êxito em
rever o seu contrato ao patamar de 20% de juros. Ocorre que, neste momento, a
média de mercado não será mais 20%, pois para se chegar a esse valor foi
considerado na média os 20% anteriormente aplicados, no caso de 30 a 10. O novo
valor da taxa de juros média dessa operação considerando apenas dois bancos
passou a ser de 15% ao ano (10+20/2=15).
Isso abre margem para que haja novo ingresso de uma
ação revisional, quando a instituição B, que já reduziu os seus juros para 20%,
tenha que novamente fazer esta redução, pois a nova média, calculada pelo teor
das decisões judiciais, implica que ela está novamente cobrando encargos
abusivos, e assim sucessivamente, até que tenhamos retornado ao limite dos
juros a 12% ao ano e 1% ao mês, previstos na Lei de Usura. Torna-se um clico
vicioso, pois a cada vez que o judiciário limita a taxa de juros à média do
BACEN essa média é alterada e novamente ensejaria o ingresso de nova demanda
para ajuste aos novos parâmetros, à nova média.
Afirmar que as instituições financeiras se
encontram restritas às médias de mercado, que nada mais são do que o valor
apurado pelas práticas dessas mesmas instituições, por isso, não há como se
dizer que sejam inválidas as taxas aplicadas justamente por aqueles que
contribuíram para a formação da média divulgada. A cada revisão de juros que o
judiciário faz, proferindo sentenças que limitem os juros à média de mercado, a
nova média não é calculada e, se fosse, outras instituições estariam passíveis
serem polos passivos em demandas revisionais, pois estariam em desacordo com
essa nova média, e por fim, teríamos um recálculo contínuo, num processo
complexo e de difícil gestão, que abalaria toda a economia do país.
É contraditório que nosso ordenamento declare que
não há fixação de taxas de juros e pleiteie limitá-las justamente à média, que
nada mais é do que a apuração dos valores já praticados no mercado,
incluindo-se aqueles que estão expostos à apreciação do judiciário para revisão
de valores. O estabelecimento das taxas de juros contratuais à média de mercado
fere o princípio constitucional da livre concorrência, prevista em seu artigo
170. Foi justamente primando pela observância desse dispositivo que se
revogou as legislações que limitava as taxas de juros praticadas no mercado
financeiro.
Limitar as taxas de juros a uma média, que será
constantemente alterada a cada decisão do judiciário que reformar um único
contrato, dentre milhões que são feitos diariamente, é um retrocesso e trará a
médio prazo impactos econômicos gigantescos se não revisada a forma de sua
utilização.
Marcio Alexandre Cavenague -advogado gestor do Bancário, Financeiro e Recuperação de
Crédito do escritório Küster Machado. Formou-se em Direito (1998) pela UNIPAR
(Universidade Paranaense de Umuarama). Tem especialização em Prática para
exercício da Advocacia Previdenciária pelo Centro Europeu.
Marcela Batista Fernandes
- Assistente Administrativa e Waldiney de Oliveira Fernandes, Assistente
Técnico do Küster Machado.
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