Recentemente, na cidade de São Carlos (SP), o médico
veterinário Ricardo Fehr foi proibido pelo Conselho Regional de Medicina
Veterinária de fazer caridade. Ele e sua esposa são veterinários e passaram a
dedicar os sábados para atender gratuitamente a todos os animais de pessoas de
baixa renda. No último dia 30 de janeiro, ele recebeu a visita de uma fiscal do
Conselho Regional de Medicina Veterinária, que o proibiu de continuar seu
serviço humanitário gratuito sob a alegação de que essa prática contraria o
Manual de Ética da classe, que diz que é antiético cobrar abaixo do valor estipulado
pelo Conselho.
No caso de cobrar menos ou oferecer o serviço gratuito, ele
poderá sofrer sanções legais e até perder o seu direito de trabalhar. Ele só
poderia exercer esse serviço se fosse considerado de utilidade pública, mas o
Conselho não reconhece que tratar os animais de pessoas carentes seja um
serviço de utilidade pública. No caso, a única forma para que ele faça o
serviço humanitário é com a abertura de uma ONG (Organização Não
Governamental), com toda a burocracia e eventuais taxas pertinentes. Em outras
palavras, esse Conselho proíbe um profissional de doar seu tempo para fazer
caridade.
Curioso que essa postura totalmente estranha do Conselho já é
definida em seu juramento oficial de classe, que diz: “Sob a proteção de Deus,
prometo que, no exercício da Medicina Veterinária, cumprirei os dispositivos
legais e normativos, com especial atenção ao Código de ética, sempre buscando
uma harmonização perfeita entre ciência e arte, para tanto aplicando os
conhecimentos científicos e técnicos em benefício da prevenção e cura de
doenças animais, tendo como objetivo o Homem”.
Ora, fica claro um objetivo corporativo, no qual, parece ter
maior ênfase o compromisso com o Conselho e seu código, do que o bem-estar
animal ou a prática da caridade. Muitos também acreditam que o objetivo final
deveria ser o animal e não o homem, ou seja, é um juramento que deixa muito a
desejar.
Existe outro juramento, não oficial, que corrige essas
falhas, onde diz: “Juro, na condição de Médico Veterinário, doar meus conhecimentos
em prol da salvação e do bem-estar da vida animal, respeitando-a tal qual a
vida humana e promovendo convívio leal e fraterno entre o homem e as demais
espécies, num gesto sublime de respeito a Deus e a Natureza”.
Esse juramento é muito mais adequado, mas, infelizmente, não
é aceito como oficial. Em outros países existe a preocupação com a saúde
animal, mas, aqui no Brasil, a preocupação maior é com que o veterinário não
cobre valores menores do que os definidos pelo Conselho. Caridade, nem pensar.
É proibido.
Deveriam se espelhar nos juramentos de cursos normais de
medicina, onde uma das frases do famoso Juramento de Hipócrates diz
textualmente: “a saúde do meu doente será a minha primeira preocupação”.
Talvez, por isso, muitos médicos fazem caridade pelo país, sem a ingerência
nefasta de um conselho e seu código de ética corporativo. O mundo precisa de
boas ações; quando acontecem, devem ser enaltecidas e não penalizadas, como é o
caso atual.
Célio Pezza - colunista, escritor e
autor de diversos livros, entre eles: As Sete Portas, Ariane, A Palavra Perdida
e o seu mais recente A Tumba do Apóstolo. www.facebook.com/celio.pezza
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