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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Caridade proibida






Recentemente, na cidade de São Carlos (SP), o médico veterinário Ricardo Fehr foi proibido pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária de fazer caridade. Ele e sua esposa são veterinários e passaram a dedicar os sábados para atender gratuitamente a todos os animais de pessoas de baixa renda. No último dia 30 de janeiro, ele recebeu a visita de uma fiscal do Conselho Regional de Medicina Veterinária, que o proibiu de continuar seu serviço humanitário gratuito sob a alegação de que essa prática contraria o Manual de Ética da classe, que diz que é antiético cobrar abaixo do valor estipulado pelo Conselho.
No caso de cobrar menos ou oferecer o serviço gratuito, ele poderá sofrer sanções legais e até perder o seu direito de trabalhar. Ele só poderia exercer esse serviço se fosse considerado de utilidade pública, mas o Conselho não reconhece que tratar os animais de pessoas carentes seja um serviço de utilidade pública. No caso, a única forma para que ele faça o serviço humanitário é com a abertura de uma ONG (Organização Não Governamental), com toda a burocracia e eventuais taxas pertinentes. Em outras palavras, esse Conselho proíbe um profissional de doar seu tempo para fazer caridade.
Curioso que essa postura totalmente estranha do Conselho já é definida em seu juramento oficial de classe, que diz: “Sob a proteção de Deus, prometo que, no exercício da Medicina Veterinária, cumprirei os dispositivos legais e normativos, com especial atenção ao Código de ética, sempre buscando uma harmonização perfeita entre ciência e arte, para tanto aplicando os conhecimentos científicos e técnicos em benefício da prevenção e cura de doenças animais, tendo como objetivo o Homem”.
Ora, fica claro um objetivo corporativo, no qual, parece ter maior ênfase o compromisso com o Conselho e seu código, do que o bem-estar animal ou a prática da caridade. Muitos também acreditam que o objetivo final deveria ser o animal e não o homem, ou seja, é um juramento que deixa muito a desejar.
Existe outro juramento, não oficial, que corrige essas falhas, onde diz: “Juro, na condição de Médico Veterinário, doar meus conhecimentos em prol da salvação e do bem-estar da vida animal, respeitando-a tal qual a vida humana e promovendo convívio leal e fraterno entre o homem e as demais espécies, num gesto sublime de respeito a Deus e a Natureza”.
Esse juramento é muito mais adequado, mas, infelizmente, não é aceito como oficial. Em outros países existe a preocupação com a saúde animal, mas, aqui no Brasil, a preocupação maior é com que o veterinário não cobre valores menores do que os definidos pelo Conselho. Caridade, nem pensar. É proibido.
Deveriam se espelhar nos juramentos de cursos normais de medicina, onde uma das frases do famoso Juramento de Hipócrates diz textualmente: “a saúde do meu doente será a minha primeira preocupação”. Talvez, por isso, muitos médicos fazem caridade pelo país, sem a ingerência nefasta de um conselho e seu código de ética corporativo. O mundo precisa de boas ações; quando acontecem, devem ser enaltecidas e não penalizadas, como é o caso atual.


Célio Pezza - colunista, escritor e autor de diversos livros, entre eles: As Sete Portas, Ariane, A Palavra Perdida e o seu mais recente A Tumba do Apóstolo. www.facebook.com/celio.pezza

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