O
medo do escuro é comum na infância e pode aparecer por volta dos dois anos e
estender-se, em geral, até os sete, fase onde a imaginação da criança está mais
aflorada e faz com que muitos não consigam distinguir a realidade da ficção.
Esse
sentimento faz parte do desenvolvimento emocional do ser humano. É a reação de
proteção que o organismo tem ao acreditar que algo possa lhe fazer mal. Por
isso que, na hora de dormir, quando os pais não estão por perto e as luzes
apagadas, esse sentimento aflora.
As
especialistas no assunto, psicólogas do Grupo Terapêutico Núcleo Corujas,
Luciana Romano e Raquel Benazzi, dão algumas dicas para os pais que se encontram
nessa situação. Confira a entrevista exclusiva:
É normal crianças terem medo do escuro?
R. Sim, é muito comum que as crianças apresentarem medo do
escuro, isso faz parte do desenvolvimento psicológico de cada um. Cabe
ressaltar que o medo em si, não é patológico, ele é uma emoção básica e
importante, tem uma função e é universal, faz parte do ser humano. O medo
prepara fisicamente nosso organismo para situações de perigo, luta e fuga e nos
permite avaliar situações de risco.
Esse medo do escuro, geralmente vem acompanhado de uma carga de
ansiedade e insegurança, apresenta-se por meio do Sistema Nervoso Autônomo com
taquicardia, suor, aumento do ritmo respiratório, tensão muscular. As crianças
podem apresentar alguns comportamentos como: insônia, xixi na cama,
paralização, gritos, choro e outros.
Por que muitas crianças temem ficar e
dormir em ambientes escuros?
R. O escuro é o lugar do desconhecido, da perda de controle
sobre as coisas e sobre si. Na escuridão muitos se sentem impotentes, fracos e
vulneráveis. Para a criança que tudo ainda é muito imaginário e a fantasia
reina na psique, o escuro abre portas para que seus medos, angústias e pavores
tomem lugar, espaço concreto, e não fica apenas no mundo interno e
inconsciente.
Como os pais devem lidar com isso – é
correto força-la a abandonar o medo ou deixa-la superar sozinha?
R.
Na verdade, não indicaríamos nenhuma das duas
alternativas, pois ambas não fortalecem emocionalmente a criança a lidar e enfrentar
essas situações. Não é indicado forçá-la a encarar o medo, principalmente com
ameaças e nem estimular temores, tentando usar o medo como uma ferramenta de
educação, como por exemplo: "Se não comer salada, o bicho papão/a bruxa
virá te pegar". As crianças são muito concretas e têm pouca capacidade de
simbolizar e compreender metáforas. Assim, tais atitudes acabam por deixá-las
mais fragilizadas.
Outro erro comum é negar o medo infantil e forçar o filho a
dormir pedindo que não acorde mais os pais com essas “bobagens”. Isso ocorre
com mais frequência quando os pais estão esgotados, sem paciência e perdidos,
sem saber como agir corretamente. Esse é um dos maiores desastres que os pais
podem fazer: não validar as emoções e sentimentos do filho, desestimular o
diálogo e não propiciar formas saudáveis de lidar com o problema. Muitas vezes
só da criança saber que pode compartilhar o medo e explicar como se sente aos
pais, promove sensação de alívio, acolhimento e proteção.
Pedir ajuda e expor os sentimentos já é um passo bastante
importante, valorize isso!
Tomar cuidado para não rir nem ridicularizar o medo infantil e,
muito menos, fazer comparações da criança com outras que não apresentam esse
medo. Essa atitude distancia a criança dos pais, pois ela sentirá que não pode
contar com eles diante às dificuldades, tornando-se mais introspectivo e com
menos recursos internos e estratégias criativas de solucionar seus conflitos.
Além de internalizar que o que sente e percebe é bobagem, sem valor, podendo
ter consequências desastrosas no futuro. Nossa tarefa enquanto adultos é munir
os filhos de ferramentas para que possam enfrentar seus medos e temores
internos e externos e não jogá-los nas situações sem condições e estratégias de
enfrentamento.
O que os pais podem fazer para ajudar?
R. Estimulamos os pais a compartilhar com a criança que eles
também já passaram situações similares. Isso faz com que os filhos sintam-se
valorizados, apoiados e, principalmente, pensam: “Se papai/mamãe (que são os
super-heróis dos filhos) já sentiram isso e venceram, tudo bem! Eu também posso
sentir e conseguir vencer! Ufa!”. Os pais podem contar maneiras que eles
próprios encontrarem para resolver os medos, além de juntos poder explorar
diversas formas de como conseguir enfrentar o conflito. A criança irá se
identificar com eles, e se sentir capaz de superar essa situação.
Complementem dizendo que todos têm medos e que em certo nível o
medo é importante e nos protege, pois aparecerão situações na vida que nos
farão sentir desta forma, precisamos então é saber como lidar e se proteger das
adversidades e não excluir, negar. Mostre a ele, com calma, paciência,
validação e amor que é possível aprender a “domar” esse medo, e que isso o
ajudará no futuro.
Os pais podem criar uma rotina de tranquilidade e relaxamento
antes de dormir. Não deixe as crianças assistirem programas agitados que
promovam tensão. Contar histórias à noite costuma ser muito eficaz e benéfico.
Verifiquem junto a eles se não há monstros embaixo da cama, janela, no banheiro
e nos armários.
Uma luz acessa no corredor ou no banheiro pode deixar a criança
mais segura e diminui a possibilidade de enxergar coisas assustadoras. Lanterna
ou abajur ao lado da cama servem também como apoio em caso de a criança sentir
muito medo durante a noite.
Fazer uso de algo que dê segurança à criança, como amuleto é uma
boa dica para esta fase, assim os pais estarão ensinando-a se proteger frente
às ameaças e não a excluir o problema. Com o passar do tempo, a ideia é que a
criança não precise mais deste “amuleto”, pois já o reconhece internalizado em
si. A escolha desse objeto é muito singular, pode ser bicho de pelúcia,
cobertor ou até algum brinquedo que lhe transmita segurança e aconchego.
Hoje existem muitas coleções de livros infantis sobre diversos
medos. Procure uma livraria em que você possa encontrar tais livros e leia para
os seus filhos, eles ajudam muito.
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