A aceleração do crescimento das árvores registrada nos últimos anos vem sendo acompanhada de uma redução da vida útil dessas plantas. No futuro, isso pode parcialmente neutralizar ganhos obtidos com o sequestro de dióxido de carbono (CO2). Essa relação entre crescimento e expectativa de vida das árvores vale para florestas do mundo todo, incluindo as tropicais, como a Amazônica, até as temperadas e árticas.
Com isso, resultados esperados para modelos e projeções de
captação de CO2 estruturados com base no sistema atual podem estar
superestimando a capacidade de absorção dos gases de efeito estufa pelas
florestas no futuro. Ou seja, plantar árvores é importante para ajudar a
reduzir a concentração desses gases na atmosfera, mas não o suficiente – ainda
é essencial a redução da emissão do carbono.
Esses são os principais pontos de discussão da pesquisa Forest carbon sink neutralized by pervasive growth-lifespan
trade-offs, publicada na revista Nature Communications, por um grupo de pesquisadores
internacionais. Entre eles estão o professor do Instituto de Biociências da
Universidade de São Paulo (IB-USP) Gregório Ceccantini e
o pesquisador Giuliano Locosselli.
Ambos têm o apoio da FAPESP.
“Há uma relação inversa entre a taxa de crescimento das árvores
e a longevidade. Mostramos de maneira consistente que isso está presente
independentemente da espécie e do local onde se encontram. Se as árvores
crescem mais rápido, também assimilam o carbono mais rapidamente. O problema é
que vão viver menos, e o carbono ficará menos tempo estocado”, explica
Locosselli à Agência FAPESP.
Na fase de crescimento, as árvores precisam de uma grande quantidade
de CO2 para se desenvolver. Por isso, esse processo de aceleração tem levado a
uma grande absorção de carbono. Tanto que estudos realizados recentemente
mostram que cerca de um terço das emissões de gases estufa resultantes da ação
do homem nos últimos 50 anos foi absorvido por ecossistemas terrestres, graças
a uma combinação de novas árvores e a expansão de florestas secundárias.
A pesquisa publicada na Nature Communications,
no entanto, coloca em discussão o grau em que as florestas continuarão a absorver
o excesso de CO2 no futuro. E problematiza, dizendo que essa captação “depende
não apenas da resposta do crescimento das árvores às mudanças no clima e na
composição atmosférica, mas também às alterações nas taxas de mortalidade que,
em última instância, liberam carbono de volta para a atmosfera”.
“Este feedback negativo
sobre o armazenamento de carbono via aumento da mortalidade irá compensar –
pelo menos em certa medida – os efeitos benéficos do aumento do crescimento no
armazenamento total de CO2 das florestas. Nosso conhecimento atual e incompleto
da universalidade e das causas do feedback dificulta
sua representação nos Modelos do Sistema Terrestre e, portanto, é uma
importante incerteza nas previsões da futura absorção de carbono da floresta em
resposta à mudança global”, ressalta, na pesquisa, o grupo do qual Ceccantini e
Locosselli são integrantes.
Segundo Locosselli, a maior parte dos modelos climáticos e de
dinâmica de biomassa nas florestas tem levado em consideração a taxa de
crescimento, mas não a relação negativa com a longevidade. Os motivos para a
aceleração desse crescimento ainda não são totalmente claros, mas entre os que
podem contribuir estão a temperatura, o CO2 na atmosfera e até mesmo o uso de
fertilizantes em diferentes locais, que aumenta a concentração de nitrogênio no
ambiente.
Mudanças climáticas
Relatório divulgado em 2019 pelo Programa das Nações Unidas para
o Meio Ambiente (PNUMA) apontou que as emissões globais de gases de efeito
estufa precisam ser reduzidas em pelo menos 7,6% ao ano, até 2030, para o
planeta atingir a meta estabelecida no Acordo de Paris de limitar a alta da
temperatura média em 1,5°C.
Se a temperatura ultrapassar esse limite, o Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) já alertou que entre os
impactos que podem ser registrados no planeta estão, por exemplo, o aumento da
intensidade de ondas de calor e a frequência de tempestades.
Na última década, as emissões de gases de efeito estufa
cresceram 1,5% ao ano, em grande parte provocadas por fontes fósseis de energia
e por mudanças no uso da terra, como o desmatamento.
Os países do G20 respondem por cerca de 75% de todas essas
emissões, sendo China e Estados Unidos os campeões. O Brasil aparece em 14º
lugar no ranking feito pelo Atlas Global de Carbono, com emissões
significativas associadas ao desmatamento. No Acordo de Paris, o Brasil se
comprometeu a reduzir suas emissões em 37% até 2025 e em 43% até 2030 em
relação ao índice de 2005.
Estudo mais recente da Organização Meteorológica Mundial (WMO,
na sigla em inglês) mostrou que as emissões globais de CO2 fóssil registraram
no ano passado recorde de 36,7 gigatoneladas (Gt), 62% a mais do que em 1990,
quando começaram as negociações internacionais sobre clima.
Com a pandemia de COVID-19, que obrigou vários países a adotar
medidas de isolamento social durante meses, as emissões de CO2 devem diminuir
entre 4% e 7% neste ano em comparação a 2019, segundo a WMO. Mas, mesmo em
abril, quando houve o nível mais baixo entre janeiro e agosto de 2020, as emissões
diárias de carbono eram equivalentes às de 2006, período em que já havia um
crescimento acentuado.
Caminhos para mitigar essa alta de CO2 incluem a ampliação de
políticas públicas visando ao aumento do uso de energias renováveis, meios de
transporte de baixo carbono e eliminação do carvão, além da redução do
desmatamento e das queimadas de florestas no mundo todo.
No ano passado, um grupo de 66 países, empresas e investidores
fecharam um acordo para zerar suas emissões de gases poluentes até 2050. Também
já estão sendo discutidos mecanismos para precificar o carbono, seja por meio
da taxação das emissões ou da criação de sistemas de compra e venda de
créditos, em que o “poluidor” paga caso a mitigação não seja feita
internamente. O objetivo é tornar mais vantajosos modelos de produção que
busquem a redução das emissões.
Metodologia
Para mostrar a relação da evolução e longevidade das árvores com
a captação de CO2, Locosselli explica que a pesquisa teve como base a análise
de anéis de crescimento localizados nos troncos das plantas. Foram avaliados
registros de mais de 210 mil árvores de 110 espécies.
Se o anel de crescimento é largo, indica que a árvore cresceu
rápido, mas, caso seja estreito, aponta baixo crescimento. Cada um deles
representa um ano de vida da planta. Fazendo a contagem de todos os anéis, é
possível ter uma estimativa de idade da árvore.
“Por isso conseguimos medir a dinâmica para árvores com 500, 600
anos de idade. Foi possível extrapolar o tempo para além do que outros
trabalhos já analisaram com parcelas permanentes”, afirma Locosselli, que está
no programa Jovem Pesquisador da FAPESP com o estudo Florestas funcionais:
biodiversidade a favor das cidades.
De acordo com o pesquisador, as queimadas também aceleram a
mortalidade das árvores, mas esse fator não foi incluído na pesquisa. Outros
estudos já mostraram que, uma vez queimadas, florestas tropicais como a Amazônica,
por exemplo, retêm 25% menos carbono do que as não queimadas, mesmo após três
décadas de crescimento.
O artigo Forest carbon sink neutralized
by pervasive growth-lifespan trade-offs pode ser lido em: www.nature.com/articles/s41467-020-17966-z.
Luciana
Constantino
Agência
FAPESP
https://agencia.fapesp.br/reducao-da-vida-util-das-arvores-em-florestas-podera-neutralizar-ganhos-com-sequestro-de-co2/34444/
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