Muito mais do que uma técnica, a Comunicação Não Violenta ( CNV) é uma abordagem de vida, que nos convida a explorar a forma como pensamos. Isto é, se esse pensamento pode gerar mais compreensão, harmonia, diálogo ou preconceitos, ódio e desconexão.
A CNV é muito utilizada para melhorar relações
interpessoais no ambiente de trabalho ou familiar, mas pouco se fala o que ela
contesta em relação às violências estruturais.
É importante sabermos que esse contexto está
analisando se a forma como a sociedade está organizada gera mais
exclusão, violência, submissão ou está construída de uma maneira que atenda a
necessidade de todas as pessoas que compõem essa sociedade.
Será que gera mais
violência? O que pode ser feito para mudar a sua forma de organização? Qual é a
sua responsabilidade individual nesse processo?
“A CNV enxerga toda forma de
preconceito e opressão como um sintoma de uma sociedade adoecida por formas de
pensar retrógradas. Por sua vez, apenas punir as pessoas com discurso e
atitudes racistas não seria o suficiente, o ideal é propor uma mudança da
consciência que está sustentando o racismo, para que atitudes inclusivas possam
ser implementadas”, ressalta Diana Bonar, especialista em Comunicação
Não Violenta e gestão de conflitos.
Para uma das poucas facilitadoras negras de CNV no
mundo, a PHD em Psicologia Roxy Manning, as pessoas que não foram tão
pessoalmente impactadas por desigualdades sociais tendem a focar apenas nos
aspectos de crescimento pessoal ou de transformação interna que a CNV traz. Esta é uma
falha na maneira como a CNV tem sido aplicada e ensinada, não da abordagem propriamente
dita.
Praticantes de CNV precisam
estar cientes das iniquidades sistêmicas que continuam a persistir entre grupos, por este motivo, busque por facilitadoras experientes que abordem as
questões sistêmicas e convidam o público para uma reflexão mais profunda sobre
poder e privilégio.
Uma frase muito potente do próprio Marshall
Rosenberg sobre o assunto:
“Se uso a Comunicação Não Violenta para libertar as
pessoas de depressão, de conviverem melhor com suas famílias, mas
simultaneamente não lhes ensino como rapidamente transformar os sistemas
sociais no mundo, então me torno parte do problema. Essencialmente estarei as
pacificando, fazendo-lhes mais felizes de viver nos sistemas como atualmente
são, e assim utilizando a CNV como um narcótico."
Para a especialista Diana Bonar, que possui 10 anos
de experiência em comunidades afetadas pelo crime e violência, não se pode
abrir mão de construir uma realidade baseada na justiça social, onde qualquer
pessoa, independente de raça, gênero, classe e orientação sexual, possa ter a
sua dignidade humana preservada e a garantia de seus direitos à igualdade,
segurança física e psicológica, educação, moradia, trabalho etc. que
garantam oportunidades plenas de desenvolvimento e realização.
Samuel Santana, jovem negro, estudante de Direito,
facilitador e CNV e consultor em questões de raça, listou algumas dicas sobre o
que você pode fazer para ser antirracista:
1-QUESTIONE:
Sempre se pergunte: esse meu pensamento ou atitude
racista vem de onde? Por que eu penso assim? De onde vem essa sensação de
medo ou insegurança em relação ao que não conheço bem? Quais são as
consequências disso?
2- ESTUDE:
Com base nisso, ao invés de sabatinar uma pessoa
negra, com todas as suas perguntas raciais, busque ler livros, artigos e assistir
vídeos de especialistas negras e negros que estão empenhados em construir uma
narrativa contra hegemônica sobre o racismo. Você pode começar pelo Manual
Antirracista da Djamila Ribeiro.
3-PROVOQUE:
Se pergunte: Como eu, do lugar social que ocupo, posso
provocar os espaços que frequento? A partir da sua identidade e experiência na
sociedade provoque discussões sobre o tema.
Ex: Quando fui convidada para uma mesa de debate
sobre diversidade apenas com pessoas brancas, eu questionei onde estavam as pessoas
negras.
4- NÃO SE OMITA:
A sua omissão ou silêncio contribuem com a
manutenção de um sistema opressor. Sempre se posicione contra atitudes
racistas. Como afirma a Filósofa e militante Ângela Davis "Numa
sociedade racista não basta não ser racista. É necessário ser
antirracista".
5-DIALOGUE:
Aplique a comunicação não violenta para
questionar as narrativas, formas de pensamento que alimentam preconceitos,
discriminação e qualquer expressão de opressão. Você pode fazer isso em casa,
na educação dos seus filhos, no trabalho, entre amigos etc.
6-SE RESPONSABILIZE:
Numa sociedade racista, todos reproduzimos a
estrutura de opressão. A diferença está na consciência e no desejo de
transformação que alguns buscam desenvolver. Permanecer se sentindo
culpado e chateado não mudará nada. Acolha esses sentimentos que fazem parte de
um processo de desconstrução, e comece a agir com consciência social e racial.
7- USE SEUS PRIVILÉGIOS:
O racismo se estrutura na exclusão, opressão,
discriminação e exploração de um grupo social em benefício de outro. Assim foi
durante o período da escravidão, e assim é nos dias de hoje. Ao se perceber
parte do grupo que se beneficia com a estrutura racista, use seus recursos para
reverter esta estrutura. Nascer privilegiado não é uma escolha, decidir o que
você fará com seus privilégios, sim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário