Grande parte das crianças pequenas, antes mesmo de
aprenderem a andar, são aprisionadas, algumas horas do dia, em frente aos
televisores, tablets e smartphones, na maioria das vezes, afiveladas em cintos
de segurança em cadeirões ou bebê conforto. Aos olhos desavisados, pode parecer
uma ação inocente, mas, desde então, as crianças estão expostas a processos de
identificação com personagens, músicas e produtos, cuidadosamente desenhados
para que, dentro em breve, se tornem objetos de desejo para o consumo.
A indústria do consumo infantil, sem pudor nem
piedade, constrói um exército de reféns mirins ávidos por ter ao alcance das
mãos aquilo que tinha somente ao alcance dos olhos. Um imperativo nasce: Eu
quero! Para compreender essa violência invisível, se faz necessário certo
distanciamento, a fim de expandir o espectro da visão. Como a rentabilidade
está diretamente relacionada à escala, logo, a diversidade no consumo não é
interessante aos olhos capitalistas. Esse exército para o consumo é uniforme:
todos devem querer a mesma coisa! Para isso, os peritos da publicidade se
encarregam de criar uma linguagem universal para difundir o produto a ser
desejado, na mesma velocidade que constrói o seu subsequente, fazendo girar o
processo bulímico de consumo e descarte sem fim.
A explosão do desejo das crianças pelo consumo
chega ao limite de favorecer a crença de que para viver é preciso consumir,
reivindicando dos pais o direito ao desperdício. Esta civilização exige a
velocidade para além do que a natureza é capaz de processar, em nome da
necessidade 'criada' de consumir. Nas estufas, as flores, os ovos das galinhas,
as frutas (...) são submetidas à luz contínua, para que cresçam ou se
desenvolvam mais rápido. Em casa, os filhos, submetidos à luz dos eletrônicos,
para que precocemente despertem o desejo de entrar nessa ciranda. E assim esse mundo
gira, alimentado pela ausência dos pais, em virtude do trabalho, a cultura do
consumo é perversa, fazendo da solidão infantil um lucrativo mercado.
Nesse contexto, o mais aviltante para a formação
humana e central para qualquer discussão pedagógica é o aniquilamento do livre
arbítrio, ou seja, a capacidade de fazer escolhas. Não nascemos com essa
capacidade, mas a desenvolvemos na relação com as pessoas que respondem pela
nossa educação, na medida em que vamos assumindo as consequências por cada escolha
que fazemos. E vamos nos aprimorando pelo resto da vida, pois bem sabemos que
viver é fazer escolhas, desde o momento em que acordamos até a hora em que
dormimos.
Dada a importância das escolhas qualificadas e suas
consequências no processo de formação humana e do quanto a mediação na relação
com as crianças é fundamental para esse êxito, é que esse assunto tão delicado
ganha relevância e deve ser pauta de reuniões com os responsáveis pelas nossas
crianças. Pois, qualquer que seja a omissão da escola em relação a esse tipo de
discussão, pode gerar certa conivência, colocando-a como coadjuvante a serviço
daqueles que boicotam a infância, roubam o tempo e a consciência de nossos
meninos e meninas. Qualquer que seja a patologia, sempre há esperança de cura!
O sucesso do tratamento está relacionado à antecedência com que os
especialistas em educação - que somos nós - diagnosticamos e encaminhamos junto
aos responsáveis, bem como exigimos das autoridades, leis que protejam as
nossas crianças dessa violência.
Acedriana Vicente Vogel - diretora pedagógica do Sistema Positivo de Ensino
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