Sem nenhum grande esforço de memória, certamente, é possível lembrar da tradicional redação intitulada "Minhas Férias", quase sempre solicitada pelos professores de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental, embora também não seja rara inclusive no Ensino Médio.
Pois bem, como estamos
próximos de um novo mês de agosto, vivenciando ainda a pandemia da covid-19 e
prestes ao tão esperado retorno às aulas, depois de meses de expectativa e
incertezas quanto ao "day after" ou ao "month after", tenho
uma curiosidade: Qual será o título da redação a ser solicitada pelos
professores neste retorno? Um retorno com cara de volta de férias, mas sem as
mesmas experiências do retorno às aulas, anterior à pandemia. Afinal de contas,
quem teve férias? Todos os dias parecem ser iguais, de segunda a segunda -
talvez, exceto o domingo - os dias deixaram de ser diferentes entre si, de ter
características singulares, pelo menos, é o que muitos disseram e continuam a
dizer durante estes mais de dezoito meses atípicos para todos nós.
Sei que alguns podem
até me questionar neste momento, quanto a este meu interesse ou curiosidade
acerca do título da redação a ser solicitada no próximo retorno às aulas,
porém, antes da crítica, me antecipo para dizer que minha curiosidade não é
propriamente sobre o título da redação, até porque utilizei esta provocação
muito mais como uma metáfora do que um significado estrito. Na verdade, minha
curiosidade, inclusive ansiedade, é sobre a forma com a qual nossas crianças e
adolescentes serão recepcionados pelos professores e demais profissionais da
educação nesta volta às aulas.
Tenho reiterado ao
longo de todos estes meses de que, acima de qualquer preocupação com relação às
diferentes atividades sociais, está a preservação da vida. Sem o cuidado para
com a vida e, particularmente, para com a saúde das pessoas, as demais
preocupações se tornam insignificantes. Tudo é possível recuperar, menos a vida
perdida.
Como educador e
formador de professores, sou um grande defensor da Escola, pois considero que
sem ela a sociedade fica incompleta. A Escola é uma das instituições que
entendo ser indispensáveis na formação de todo ser humano e em nenhum momento
deve ser preterida. Sem escola, creio ser impossível o pleno desenvolvimento da
pessoa humana, para torná-la um futuro cidadão competente, ético e eficiente.
Sempre defendi e continuo a defender que, dentre estas instituições, Escola e
Família são as que devem atuar em cumplicidade, por isso, fiz esta provocação
neste início de um novo semestre letivo. Com a metáfora da redação "Minhas
Férias", a rigor, quero perguntar: como pais e professores se comportarão
neste retorno?
Durante este ano e
meio de pandemia, muitas foram as informações desencontradas, sem fundamentação
científica, com opiniões divergentes, sobretudo por parte de nossos dirigentes
nacionais, que em vez de promoverem uma ação coletiva, com embasamento técnico
e científico, com a união dos diferentes níveis de governo, optaram por impor
posições pessoais, que pouco contribuíram para a superação da crise. Pessoas
fora da área da saúde orientando sobre medicamentos, outras, fora da área da
educação, recomendando ações sem consistência pedagógica, com isto, a nação
ficou sem um plano efetivo para se vencer a crise, além de perder até aqui mais
de meio milhão de pessoas, muitas das quais em plena produção.
Agora, entende-se que
já é possível retornar às atividades escolares presenciais, sobretudo no âmbito
da Educação Básica, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio. Também
entendo ser possível pensar neste retorno, já no início de agosto próximo,
porém, em que condições e como será? Retomando minha metáfora: qual será o
título da redação a ser solicitada pelos professores? Será "Minhas
Férias"?
Saindo da metáfora e
voltando ao cerne da questão, de como se dará o retorno às atividades escolares
neste segundo semestre de 2021, trago à tona meus comentários feitos há alguns
meses, sobre como deverá ser esta retomada.
Primeiramente, devemos
evitar o "efeito sanfona", do abrir e fechar. Nossas ações devem ser
rigorosamente pensadas e planejadas, para que isto não venha a ocorrer. Por
isso, deve ficar bem claro que o planejamento deve ser feito por quem entende
de Educação, juntamente com os beneficiários, ou seja, alunos e pais de alunos,
e sem pressa pela reposição das perdas. O objetivo não deve ser de uma
superação rápida das perdas ocorridas, no tocante a conteúdos que deveriam ter
sido aprendidos e, infelizmente, não o foram, mas de uma superação por meio de
um planejamento de reposição paralela, dos conhecimentos não obtidos,
juntamente com os previstos no currículo tradicional.
Tenho acompanhado
diversas escolas particulares, que estão trabalhando neste sentido, há alguns
meses, e estou muito animado e esperançoso quanto ao bom resultado a ser
atingido. Entretanto, esta práxis não é regra, pois também tenho visto ações
alternativas, sem consistência, especialmente nas redes públicas de ensino,
onde as condições físicas e tecnológicas das escolas são muito desiguais, o que
impede a execução de uma ação uniforme.
Neste sentido, penso
que professores, dirigentes escolares e pais, devem estar unidos, em busca da
elaboração deste Plano de Reposição, independentemente do prazo que se
estabeleça. Afinal, o mais importante na vida destes alunos é que, ao final do
Ensino Fundamental e do Ensino Médio, respectivamente, o adolescente esteja
pronto para prosseguir sua vida escolar com o conhecimento necessário para as
próximas etapas.
Mesmo assim, penso que
o professor que quiser solicitar aos seus alunos a redação "Minhas
Férias", poderá fazê-lo sem nenhum problema. Não vejo nenhum mal.
Ítalo Francisco Curcio
- doutor e pós-doutor
em Educação, além de pesquisador no curso de Pedagogia da Universidade
Presbiteriana Mackenzie (UPM).
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