quinta-feira, 29 de julho de 2021

A volta às aulas e a redação "Minhas Férias"

Sem nenhum grande esforço de memória, certamente, é possível lembrar da tradicional redação intitulada "Minhas Férias", quase sempre solicitada pelos professores de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental, embora também não seja rara inclusive no Ensino Médio.

Pois bem, como estamos próximos de um novo mês de agosto, vivenciando ainda a pandemia da covid-19 e prestes ao tão esperado retorno às aulas, depois de meses de expectativa e incertezas quanto ao "day after" ou ao "month after", tenho uma curiosidade: Qual será o título da redação a ser solicitada pelos professores neste retorno? Um retorno com cara de volta de férias, mas sem as mesmas experiências do retorno às aulas, anterior à pandemia. Afinal de contas, quem teve férias? Todos os dias parecem ser iguais, de segunda a segunda - talvez, exceto o domingo - os dias deixaram de ser diferentes entre si, de ter características singulares, pelo menos, é o que muitos disseram e continuam a dizer durante estes mais de dezoito meses atípicos para todos nós.

Sei que alguns podem até me questionar neste momento, quanto a este meu interesse ou curiosidade acerca do título da redação a ser solicitada no próximo retorno às aulas, porém, antes da crítica, me antecipo para dizer que minha curiosidade não é propriamente sobre o título da redação, até porque utilizei esta provocação muito mais como uma metáfora do que um significado estrito. Na verdade, minha curiosidade, inclusive ansiedade, é sobre a forma com a qual nossas crianças e adolescentes serão recepcionados pelos professores e demais profissionais da educação nesta volta às aulas.

Tenho reiterado ao longo de todos estes meses de que, acima de qualquer preocupação com relação às diferentes atividades sociais, está a preservação da vida. Sem o cuidado para com a vida e, particularmente, para com a saúde das pessoas, as demais preocupações se tornam insignificantes. Tudo é possível recuperar, menos a vida perdida.

Como educador e formador de professores, sou um grande defensor da Escola, pois considero que sem ela a sociedade fica incompleta. A Escola é uma das instituições que entendo ser indispensáveis na formação de todo ser humano e em nenhum momento deve ser preterida. Sem escola, creio ser impossível o pleno desenvolvimento da pessoa humana, para torná-la um futuro cidadão competente, ético e eficiente. Sempre defendi e continuo a defender que, dentre estas instituições, Escola e Família são as que devem atuar em cumplicidade, por isso, fiz esta provocação neste início de um novo semestre letivo. Com a metáfora da redação "Minhas Férias", a rigor, quero perguntar: como pais e professores se comportarão neste retorno?

Durante este ano e meio de pandemia, muitas foram as informações desencontradas, sem fundamentação científica, com opiniões divergentes, sobretudo por parte de nossos dirigentes nacionais, que em vez de promoverem uma ação coletiva, com embasamento técnico e científico, com a união dos diferentes níveis de governo, optaram por impor posições pessoais, que pouco contribuíram para a superação da crise. Pessoas fora da área da saúde orientando sobre medicamentos, outras, fora da área da educação, recomendando ações sem consistência pedagógica, com isto, a nação ficou sem um plano efetivo para se vencer a crise, além de perder até aqui mais de meio milhão de pessoas, muitas das quais em plena produção.

Agora, entende-se que já é possível retornar às atividades escolares presenciais, sobretudo no âmbito da Educação Básica, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio. Também entendo ser possível pensar neste retorno, já no início de agosto próximo, porém, em que condições e como será? Retomando minha metáfora: qual será o título da redação a ser solicitada pelos professores? Será "Minhas Férias"?

Saindo da metáfora e voltando ao cerne da questão, de como se dará o retorno às atividades escolares neste segundo semestre de 2021, trago à tona meus comentários feitos há alguns meses, sobre como deverá ser esta retomada.

Primeiramente, devemos evitar o "efeito sanfona", do abrir e fechar. Nossas ações devem ser rigorosamente pensadas e planejadas, para que isto não venha a ocorrer. Por isso, deve ficar bem claro que o planejamento deve ser feito por quem entende de Educação, juntamente com os beneficiários, ou seja, alunos e pais de alunos, e sem pressa pela reposição das perdas. O objetivo não deve ser de uma superação rápida das perdas ocorridas, no tocante a conteúdos que deveriam ter sido aprendidos e, infelizmente, não o foram, mas de uma superação por meio de um planejamento de reposição paralela, dos conhecimentos não obtidos, juntamente com os previstos no currículo tradicional.

Tenho acompanhado diversas escolas particulares, que estão trabalhando neste sentido, há alguns meses, e estou muito animado e esperançoso quanto ao bom resultado a ser atingido. Entretanto, esta práxis não é regra, pois também tenho visto ações alternativas, sem consistência, especialmente nas redes públicas de ensino, onde as condições físicas e tecnológicas das escolas são muito desiguais, o que impede a execução de uma ação uniforme.

Neste sentido, penso que professores, dirigentes escolares e pais, devem estar unidos, em busca da elaboração deste Plano de Reposição, independentemente do prazo que se estabeleça. Afinal, o mais importante na vida destes alunos é que, ao final do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, respectivamente, o adolescente esteja pronto para prosseguir sua vida escolar com o conhecimento necessário para as próximas etapas.

Mesmo assim, penso que o professor que quiser solicitar aos seus alunos a redação "Minhas Férias", poderá fazê-lo sem nenhum problema. Não vejo nenhum mal.

 


Ítalo Francisco Curcio - doutor e pós-doutor em Educação, além de pesquisador no curso de Pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).


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