Dia
Nacional da Adoção será comemorado em 25 de maio em meio a debates sobre um novo
projeto de lei e sobre as responsabilidades dos pretendentes pela demora
Desde
1996, em todo 25 de maio é comemorado o Dia Nacional da Adoção. E agora em
2017, a data acontece em meio a intensos debates sobre um projeto de lei
apresentado em fevereiro passado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública
e sobre o mito de que a responsabilidade pela superlotação dos abrigos é dos
pretendentes a pais adotivos.
A
principal mudança proposta na minuta do projeto de lei foi a diminuição do
tempo de habilitação de pretendentes para 8 meses. Até hoje não havia prazo
máximo para isso, já que a seção VIII da lei 12.010, de 2009, conhecida como
Lei Nacional da Adoção, (http://www5.tjba.jus.br/infanciaejuventude/images/noticia/cij/art197_a_habilitacao_para_adocao.pdf),
tampouco estabelecia prazo máximo para uma etapa obrigatória e fundamental no
processo: a elaboração de um estudo psicossocial sobre os candidatos a pais
adotivos por parte das equipes a serviço da Justiça da Infância e Juventude.
Este
estudo é feito com base em entrevistas com assistentes sociais, psicólogos e
juízes, e é um dos principais culpados pela demora. Raramente a habilitação
tarda menos do que 12 meses. Alega-se que deve ser feita com cuidado para
garantir a integridade das crianças e adolescentes inscritos no Cadastro
Nacional de Adoção, mas a grande verdade é que as Varas não possuem
funcionários suficientes para dar conta de todas as demandas, entre outros
problemas.
Para
a jornalista Ana Davini, autora do livro “Te amo até a lua”, que aborda o tema
“adoção”, esta alteração de prazo não será tão significativa, já que o fator
número 1 para a morosidade dos processos é o tempo que leva a destituição do
poder familiar. “A mesma lei 12.010 previa um prazo máximo de dois anos para
isso, mas há inúmeros adolescentes e crianças crescendo em abrigos até
atingirem uma idade em que ninguém mais os queira. Este anteprojeto de lei diz
que serão cadastrados para adoção recém-nascidos e crianças sem registro não
procurados em 30 dias a partir de seu acolhimento por uma instituição, mas não
aborda a questão dos maiores”.
Segundo
a jornalista, atualmente prefere-se culpar os pretendentes pela superlotação
dos abrigos. Dizem que eles restringem muito o perfil das crianças desejadas,
que querem apenas bebês recém-nascidos do sexo feminino e cor branca, mas isso
é um falso mito. Os relatórios estatísticos do Conselho Nacional de Justiça, disponíveis
no link http://www.cnj.jus.br/cnanovo/pages/publico/index.jsf,
provam isso:
- existem 46.000 crianças e
adolescentes vivendo em abrigos;
- destes, apenas 7.493 estão no
Cadastro Nacional de Adoção, ou seja, 16,3% do total;
- Os números são ainda piores se
contarmos apenas as crianças totalmente disponíveis para adoção: elas são 4.826
(10,5% do total);
- Outras 2.667 ainda estão
vinculadas a suas famílias, ou seja, os processos de adoção começam enquanto
ainda há possibilidades de recursos por parte da família biológica, o que gera
riscos para os adotantes;
- O restante – mais de 38 mil
crianças – ainda nem tiveram seus processos de destituição do poder familiar iniciados,
e estão crescendo nos abrigos. Alguns
dos motivos para isso são a morosidade da Justiça, leis ultrapassadas e
pessoas que não abrem mão da guarda dos filhos - mesmo não os querendo -
apenas para não perder benefícios sociais;
- dos 7.493 adolescentes e crianças
cadastradas para adoção, 2.540 são brancos, 3.640 pardos, 1.280 negros, 23
indígenas e 10 amarelos;
- 3.316 são do sexo feminino e
4.178 do masculino;
- 1.892 crianças ou
adolescentes apresentam algum problema de saúde;
- 4.578 possuem
irmãos;
- Por outro lado, há 39.447
pretendentes a pais habilitados;
- 17.627 aceitam crianças e
adolescentes de todas as raças;
- Somente 7.788 candidatos aceitam
apenas crianças e adolescentes brancos, o que representa menos de 20% do
universo;
- 30.756 aceitam brancos e pardos,
19.712 brancos, pardos e negros, 19.153 também indígenas e 20.647 também
amarelos;
- 24.906 pretendentes são
indiferentes ao sexo da criança;
- 12.973 aceitam
adotar irmãos;
- 12.145 aceitam
adotar crianças ou adolescentes com algum tipo de problema de saúde, desde que
não deficiência física ou mental e Aids;
- 1.581 aceitam
crianças ou adolescentes com AIDS;
- 2.154 aceitam
crianças ou adolescentes com deficiência física;
- 1.149 aceitam crianças
ou adolescentes com deficiência mental.
A planilha abaixo
mostra um resumo do que foi explicado, ou seja, que nenhum dos critérios acima
impede crianças e adolescentes de serem adotados, já que a proporção de
pretendentes dispostos é sempre maior.
Característica
|
Crianças e adolescentes cadastrados
|
Pretendentes habilitados que os
aceitam
|
Inscritos no Cadastro Nacional
|
7.493
|
39.447
|
Brancos
|
2.540
|
30.756
|
Pardos
|
3.640
|
30.756
|
Negros
|
1.280
|
19.712
|
Indígenas
|
23
|
19.153
|
Amarelos
|
10
|
20.647
|
Sexo feminino
|
3.316
|
24.906
|
Sexo masculino
|
4.178
|
24.906
|
Irmãos
|
4.578
|
12.973
|
HIV
|
94
|
1.581
|
Deficiência física
|
274
|
2.154
|
Deficiência mental
|
650
|
1.149
|
Outras doenças detectadas
|
874
|
12.145
|
Quanto à idade:
Até 1 ano
|
364
|
6.158
|
Até 2 anos
|
339
|
6.922
|
Até 3 anos
|
298
|
7.803
|
Até 4 anos
|
303
|
5.757
|
Até 5 anos
|
279
|
5.350
|
Até 6 anos
|
290
|
3.237
|
Até 7 anos
|
268
|
1.620
|
Até 8 anos
|
331
|
910
|
Até 9 anos
|
307
|
391
|
Até 10 anos
|
413
|
484
|
Até 11 anos
|
459
|
212
|
Até 12 anos
|
518
|
207
|
Até 13 anos
|
570
|
92
|
Até 14 anos
|
612
|
67
|
Até 15 anos
|
703
|
35
|
Até 16 anos
|
626
|
44
|
Até 17 anos
|
586
|
27
|
É óbvio que existem recortes mais
complexos nestas estatísticas, se cruzarmos outras características com as idades,
e que existem 4.074 crianças e adolescentes acima de 11 anos sem grandes
esperanças de adoção. Mas a realidade delas seria diferente se a Justiça
tivesse agido mais rapidamente na destituição do poder familiar? A mesma
preocupação deve ser considerada em relação às mais de 38 mil crianças e
adolescentes que ainda nem iniciaram seus processos de disponibilização para
adoção. Quem são elas? Por que estão em abrigos? Há quanto tempo cada uma está?
Independentemente de quais sejam as
razões (falta de equipe, leis ultrapassadas, benefícios sociais, etc), esta
realidade deve mudar antes que a maioria chegue aos 11 anos, idade em que os há
menos pretendentes interessados. Propor campanhas de adoção tardia e culpar a
mentalidade dos candidatos apenas mascara a ineficiência da Justiça.
Voltando
ao anteprojeto de lei, outra mudança proposta é uma suposta liberdade que mães
biológicas terão de entregar seus filhos para adoção, mas isso também é
questionável. Caso elas saibam para quem querem fazer isto, terão de comprovar
vínculos afetivos. Caso não saibam, terão de passar por entrevistas com as
equipes interprofissionais da Justiça da Infância e Juventude e podem, ainda,
ser encaminhadas à rede pública de saúde para atendimento psicoterápico, se
concordarem.
Outro
ponto polêmico é a integração dos Cadastros locais, estaduais e nacional de
Adoção. Isso teoricamente já existia, tanto que o pretendente podia indicar os
Estados de seu interesse, mas na prática sua ficha ficava restrita à Vara de
Infância onde o processo foi iniciado. O anteprojeto de lei não explica quais
mudanças serão feitas neste sentido.
“Em
minha opinião, os únicos pontos realmente positivos foram a regulamentação dos
programas de apadrinhamento afetivo em âmbito federal – antes cada Estado tinha
suas próprias condutas, o que muitas vezes eliminava as chances de adolescentes
ou crianças com problemas graves serem adotados - e a simplificação dos
processos de adoção internacional. Em 2012, quando comecei a escrever o livro,
nem os Conselhos Estaduais de Justiça e nem o Ministério possuíam informações
suficientes sobre isso”, explica Davini. “Agora, porém, diz-se que basta
formular o pedido de habilitação internacional na autoridade judicial de sua
comarca e que ele será válido para países signatários da Convenção de Haia.
Vamos ver”, conclui.
Mais
informações em http://www.justica.gov.br/noticias/mjsp-divulga-o-resultado-da-consulta-publica-sobre-adocao,
na página www.facebook.com/teamoatealua
e no site www.livroteamoatealua.wordpress.com.
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