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sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Estupro ou abuso sexual?



Está em evidência o assunto de violência contra uma criança de oito anos, que gera muitos alertas e deixa o público estarrecido, por ser um assunto pouco explorado, principalmente no horário nobre. Porém é preciso esclarecer a diferença entre estupro e abuso sexual de vulnerável.

Depois de noticiada no início do ano a condenação do médico Larry Nassar a 175 anos de prisão por abusos sexuais - ele era responsável da seleção de ginástica olímpica dos Estados Unidos e abusou de mais de 100 meninas ao longo de décadas – agora estamos vendo em rede nacional as consequências de um abuso sexual em criança.

No caso do médico Nassa, ocorreu de forma continua em decorrência da falta de apuração das denuncias feitas pelas crianças na época, as poucas famílias que acreditavam tinham suas queixas arquivadas pelas autoridades locais.

No Brasil o caso é tipificado no artigo 217-A, do código penal que tem a seguinte redação: Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos - Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. 

A lei brasileira descreve conjunção carnal como sendo sexo propriamente dito, ou seja, a penetração. Por outro lado, debate se instala quando a discussão é o ato libidinoso, que seria todos aqueles atos que têm conotação sexual, como o sexo anal, oral, introduzir o dedo ou um objeto na vagina ou no ânus da vítima, passar as mãos nos seios ou nádegas etc.

No Brasil, ainda incorre no crime que pratica tais descritos na lei com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. Estamos tratando neste caso do deficiente mental, da embriaguez, por exemplo.

Muito se acredita que o crime somente está presente com o uso de força, o que não é verdade. Nestes casos, o consentimento ou não da vítima é irrelevante. Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 593 que diz claramente que o crime de estupro de vulnerável configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante o eventual consentimento da vítima para a prática do ato, experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente. O ministro Felix Fischer pontuou que a súmula foi editada pela Comissão de Jurisprudência com base em inúmeros procedentes da Corte. A justiça já vinha entendendo desta forma, mesmo antes da edição da súmula.

Notasse ainda que, a pena pode ser agravada em algumas hipóteses. No caso de lesão corporal de natureza grave, a pena pode chegar a 20 anos e, em caso de morte, a 30 anos.

A pena base de 7 reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos, pode ser majorada em metade quando o abusador for  ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela, ou seja qualquer responsável por uma criança, mesmo que de forma momentânea está sujeito as penas da lei.

De acordo com a BBC Brasil e Ministério da Saúde, 70% das vítimas de estupro no Brasil são crianças e adolescentes. Em 2014, houve uma média diária de treze denúncias de abusos de meninos e ocorreu um caso de estupro notificado a cada 11 minutos.

Traçados tais parâmetros a grande controvérsia é quando a prática dos atos libidinosos, ou seja, o que são atos libidinosos. Atos libidinosos seriam aqueles que implicam contato da boca com o pênis, com a vagina, com os seios ou com o ânus, aqueles que implicam manipulação erótica destes órgãos, os que implicam introdução do pênis no ânus ou no contato do pênis com os seios, e a masturbação mútua.

Em tese, o beijos na boca, inclusive com a língua, ou suaves carícias, não seriam atos libidinosos. A manipulação não erótica, por meio de mãos ou dedos, do pênis, da vagina, dos seios ou do ânus de outra pessoa não configura ato libidinoso. Para apuração do ato libidinoso deve se levar em conta a proteção integral ao vulnerável e a busca da lei em proteger a dignidade sexual.  Desta forma, um beijo com violência, pode caracterizar ato libidinoso, ou seja, estupro.

Polêmico e constrangedor, o conceito final de ato libidinoso apenas pode ser descrito levando em conta o caso concreto. No geral, a informação mais importante é que o boletim de ocorrência, em regra é suficiente, para a tomada imediata de providencias pelas autoridades policiais, bem como a intervenção do Ministério Publico e a atuação da justiça. Pelo menos essa é a regra. Quem cala consente.


Adriano Alves é advogado criminalista, especialista em direito processual pela PUC (Pontifícia Universidade Católica), em direito público pela Anhanguera e diplomado pela Universidade San Buena Ventura de Medellín/Colômbia.


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