Objetivo foi contribuir para o desenvolvimento de
políticas públicas de saúde que ampliem o acesso ao tratamento da doença em
estágio avançado, beneficiando as usuárias do SUS
A Federação Brasileira de Instituições
Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), com o apoio da Assembleia
Legislativa do Estado da Bahia realizou ontem (19/10), em Salvador (BA), o I
Ciclo de Debates sobre Câncer de Mama para Parlamentares em parceria com o
Núcleo Assistencial para Pessoas com Câncer (Naspec), ONG associada da Femama
no estado. Sob o tema “Câncer de Mama no Brasil: Por que não curamos mais?”,
o evento contou com a presença de médicos especialistas, deputados, pacientes e
voluntárias ligadas à causa do câncer de mama. O objetivo foi discutir como o
legislativo estadual pode contribuir para a ampliação do acesso ao tratamento
de câncer de mama metastático na rede pública de saúde. O evento ocorreu em
parceria com a Comissão dos Direitos da Mulher e a Comissão de Saúde e
Saneamento, representados pela deputada Fabíola Mansur e pelo deputado Alex da
Piatã.
“Todas
as pacientes com câncer de mama metastático têm direito a um tratamento que
prolongue a sua vida com qualidade. Estamos falando de mulheres que são
econômica e socialmente ativas e podem permanecer assim por muitos anos se
forem adequadamente tratadas. Hoje, infelizmente, apenas uma parcela pequena da
população consegue os medicamentos mais modernos”, comenta a médica
mastologista e presidente voluntária da Femama, dra. Maira Caleffi.
O
Ciclo já contou com uma edição nacional na Câmara dos Deputados, em Brasília, e
outras regionais no Rio Grande do Sul e no Paraná. Os debates abordam temas
como os tratamentos que deveriam estar disponíveis no SUS, mas não estão;
dificuldade de acesso da população brasileira às drogas inovadoras; a realidade
do acesso aos tratamentos do câncer de mama metastático no SUS; desafio para a
incorporação de novas tecnologias e as competências do Estado no acesso aos
tratamentos do câncer no SUS.
Realidade no Brasil e na Bahia
A mortalidade por câncer de
mama no Brasil é proporcionalmente maior do que em países
desenvolvidos. Entre os motivos estão níveis de educação, realização de
diagnósticos tardios e dificuldade de acesso ao sistema de saúde e a
medicamentos de última geração, o que é uma realidade no caso de pacientes
metastáticas tratadas em instituições públicas.
A
oncologista da Clínica AMO, dra. Vanessa Dybal – apontou que a incidência do
câncer deve duplicar no mundo em 2020. “Mais da metade dos casos de câncer de
mama são esperados em países em desenvolvimento, como o Brasil. Porém aqui, a
mortalidade aumenta, na contramão do resto do mundo”, enfatiza. Além disso, há
uma distribuição irregular de centros de tratamento no País, que geram fluxos
migratórios de pacientes de regiões onde não há Centros de Serviço de Alta
Complexidade em Oncologia (UNACONS).
“Uma
paciente com câncer de mama metastático, no sistema privado, vive por até cinco
anos; já uma atendida pelo SUS vive um ano e meio, em média. Isso é um dilema
para o médico. Como ele enfrenta essas duas realidades? Uma alternativa, além
da incorporação de tecnologias no sistema público, é melhorar o processo de
pesquisa clínica no País”, finalizou Dybal.
Segundo o assessor de
relações governamentais da FEMAMA, Thiago Turbay, o câncer é prioridade nas
questões de saúde no Brasil, por lei, desde 1999. No entanto, somente 2% do
orçamento da saúde são destinados à oncologia. Em 2015 o orçamento federal da
saúde é de R$ 103 bilhões. “Temos recursos, mas são mal aplicados”, comenta.
De acordo com o INCA, 2.560 novos casos de câncer de
mama são esperados na Bahia apenas em 2015. Segundo a Dra. Alcina Andrade, representante da
Secretaria Estadual de Saúde, o câncer de mama é a terceira causa de morte
geral no estado. Em algumas regiões chega a ser a segunda causa. Ela informa
que enquanto são realizados avanços no acesso ao diagnóstico, em função da alta
cobertura mamográfica na Bahia, ainda existem grandes desafios no acesso ao
tratamento do câncer de mama. O governo baiano tem como meta a implementação de
quatro novos UNACONS nas regiões nordeste, sul, sudoeste e na região oeste;
esta última onde há um grande vazio assistencial.
Alternativas para ampliação do acesso ao tratamento
Thiago Turbay explica que,
apesar do SUS incorporar procedimentos a nível federal a partir da indicação da
CONITEC, órgão do Ministério da Saúde, os estados tem competência legal para decidir sobre o
fornecimento de tratamentos para seus cidadãos. É permitido a eles buscarem fontes de financiamento
e parcerias para que novos medicamentos sejam ofertados na rede local, desde
que estes apresentem evidências científicas para tanto. Thiago também alerta
para o coeficiente de compra governamental, através do qual alguns medicamentos
são isentos de tributos, reduzindo o custo em cerca de 40% do valor original.
Em muitos casos, fornecer o
acesso a todos é mais vantajoso para o governo estadual, do que arcar com os
custos de ações judiciais de pacientes que buscam acesso a tratamentos não
inclusos na rede pública. De 2012 a 2014
os gastos de judicialização cresceram 129% no país. No sistema público não há
nenhuma nova tecnologia para câncer de mama metastático.
“Hoje cerca de 30% das ações judiciais tramitando no
Tribunal de Justiça da Bahia estão relacionadas à saúde e destas, 5% são casos
de câncer de mama”, informa o Defensor Público Federal, dr. Átila Dias.
A Presidente do Núcleo Assistencial
para Pessoas com Câncer (Naspec), Romilza Medrado, destaca a importância de se
buscarem soluções para a falta de acesso a tratamentos. “Queremos tratar da
valorização da vida e não apenas de recursos, pois muitas vezes a questão não é
a falta de recurso, mas, sim, a falta de vontade. Não é possível haver tanta
gente desassistida. A vida não tem preço, mas está tendo preço”, comenta. Ela
reforçou que teve câncer de mama e está viva porque soube falar, brigar e lutar
por sua vida. “Queremos ter a certeza que não vamos passar mais um Outubro Rosa
falando do mesmo assunto, pois estamos tratando de uma questão de realidade.
Não deixem o Outubro Rosa ser apenas uma festa”, finalizou Romilza.
Entre os encaminhamentos definidos no evento, está a
criação de um grupo de trabalho para analisar e discutir a viabilidade da
ampliação de acesso a diagnóstico e tratamento para o câncer de mama na Bahia.
Depoimento
Suzalbete
dos Santos, moradora de Salvador, recebeu a notícia de que tinha câncer de mama
metastático. À época,
ela perdeu o plano de saúde ao se aposentar e se confrontou com a dura
realidade de não poder utilizar o medicamento prescrito, pois este não estava
disponível na rede pública. Suzalbete, então, saiu de defensoria em defensoria,
até encontrar uma que a acolhesse. Desta forma, por meio de uma ação judicial,
conseguiu acesso ao tratamento de que necessita.
“Não sei até quando, mas estou
tentando sobreviver. Consegui o tratamento porque corri atrás e não desisiti”,
comenta. A Defensoria Pública da Bahia a ajudou a obter seu medicamento.
“Espero que todas as mulheres tenham
mais oportunidades de acessos aos tratamentos para também poderem sobreviver”,
sinaliza. Ainda segundo ela, é preciso ter mais agilidade também no acesso a
exames e em todas as etapas de tratamento, para que as mulheres possam
enfrentar o câncer com dignidade, sem ver a doença se agravar enquanto
aguardam.
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