Casos confirmados no Brasil já somam 448 e motivam
entidade a alertar a sociedade sobre as características da doença e exames
realizados para identificá-la
O Brasil enfrenta o maior surto de febre amarela
desde os registros mais antigos do Ministério da Saúde, de 1980, e tem causado
uma corrida aos postos de vacinação nas regiões mais afetadas pela doença. Na
última segunda-feira (21), o Ministério da Saúde divulgou um relatório que
confirma 144 mortes e 448 casos de febre amarela no País. Diante do quadro, a
Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML)
informa a população sobre as diferenças entre os exames laboratoriais
utilizados para detecção da doença e a alerta para as recomendações de
vacinação.
Dr. Celso Granato, médico patologista clínico e
membro da SBPC/ML, explica que o aumento que se observa na proliferação da
doença está ligado tanto ao ciclo periódico de 8 a 9 anos a que a doença
obedece (o último surto ocorreu no verão de 2007/2008) como à época do ano – de
dezembro a maio, o risco de transmissão aumenta tanto pela quantidade de chuvas
como por viagens.
Sobre a doença
A febre amarela (FA) é uma doença infecciosa aguda,
febril, causada pelo vírus de mesmo nome. É uma doença potencialmente grave e que,
de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), provoca cerca de 200 mil
casos no mundo a cada ano, majoritariamente no continente africano. Ela se
apresenta em dois tipos: a silvestre e a urbana. “Do ponto de vista clínico, os
dois são exatamente iguais. A diferença está ligada ao local em que o paciente
foi infectado e ao mosquito transmissor – na febre amarela urbana, o
transmissor é o Aedes aegypti, enquanto na silvestre são os mosquitos Haemagogus
e Sabethes”, explica Granato.
A morte de macacos com febre amarela representa um
fator que tem alarmado os brasileiros. Sobre o tema, Granato afirma que os
animais são os hospedeiros naturais da febre amarela silvestre e funcionam como
sentinelas da doença para nós, humanos, e que matá-los pode contribuir para que
a doença chegue até nós de forma inesperada. “Se macacos estão morrendo em
função da febre amarela, esse é um sinal de alerta e todo o esforço da Saúde
Pública deve se voltar a restringir a disseminação da doença”, esclarece.
Métodos de diagnóstico
A febre amarela consiste em uma doença de difícil
diagnóstico, principalmente em fases iniciais, porque seus sintomas podem ser
confundidos com os de várias outras enfermidades, como dengue, malária grave,
hepatites virais (principalmente os tipos B e D) e outras febres hemorrágicas,
como o Zika. Portanto, além da avaliação clínica do paciente, alguns exames
laboratoriais também são essenciais para confirmação do diagnóstico.
Para detecção do vírus da febre amarela, faz-se o
isolamento viral, exame realizado a partir de amostras de sangue coletadas nos
primeiros cinco dias após o aparecimento da febre. Nesses casos, o vírus é
identificado pelo teste de imunofluorescência direta, que determina a presença
de antígenos virais na amostra. Pode-se também realizar a Reação em Cadeia de
Polimerase (PCR).
Exames de sorologia também são indicados para
complemento do diagnóstico, por meio da técnica MAC-Elisa. Esse tipo de exame
se baseia na detecção de anticorpos IgM específicos do vírus causador da febre
amarela. O isolamento viral e o PCR são positivos desde o momento em que surgem
os sintomas até o quinto dia. A sorologia, por sua vez, só passa a ser positiva
depois do quarto dia da doença. Nesses casos, devem ser feitas duas coletas,
uma no primeiro atendimento médico e outra após 14 dias. Esse tempo de
comparação é necessário porque a primeira coleta pode não ser reativa já que
pode ter sido feita muito precocemente.
Em casos fatais da doença, utiliza-se a técnica
chamada imuno-histoquímica, que indica a presença de antígenos em tecidos de
diferentes partes do organismo.
Método
de diagnóstico
|
Período
de coleta
|
Finalidade
|
Isolamento viral |
1º ao 5º dia da doença |
Identifica a presença de antígenos virais na
amostra por teste de imunofluorescência direta |
Reação em Cadeia de Polimerase (PCR) |
1º ao 5º dia da doença |
Analisa a presença do vírus no organismo |
Sorologia |
1ª amostra: a partir do 5º dia da doença 2ª amostra: após 14 dias |
Identifica anticorpos IgM específicos do vírus
amarílico no sangue do indivíduo |
Imuno-histoquímica |
Menos de 12 horas de óbito e máximo de 24 horas |
Analisa a presença de antígenos nos tecidos |
No Brasil, os exames para diagnóstico de febre
amarela devem ser feitos, obrigatoriamente, por um laboratório especializado
nesta doença. Tais laboratórios são o Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo, a
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, e o Instituto Evandro
Chagas, em Belém. Laboratórios privados não podem realizar exames para febre
amarela. Granato justifica que, “por ser uma doença bastante incomum e que
requer medidas rápidas de intervenção dos órgãos de Saúde Pública, em um
momento como este parece mais adequado restringir a identificação dos pacientes
a laboratórios especializados”.
Sintomas e áreas de risco
Os sintomas da febre amarela variam muito. Para
Granato, “existem pessoas que apresentam apenas um quadro febril, que dura de 4
a 5 dias e nada mais, e outras que têm febre por um período mais prolongado,
acompanhado de icterícia (amarelamento da pele), sangramento gengival, nasal e
até digestivo. Neste último caso, a gravidade da doença é elevada. Quando a
doença evolui para um estágio mais avançado, o paciente pode apresentar também
inflamação do fígado e rins, olhos avermelhados, sangramento na pele e urina
escurecida”.
Granato ressalta que,“no Brasil, a região em que as
pessoas que têm maior chance de se contaminar é a região amazônica, mas em
períodos em que a doença se torna mais frequente, em praticamente qualquer
lugar do País pode surgir a infecção, exceto em grandes cidades, onde não há
incidências desde 1942”. Em Minas Gerais, onde surgiram os primeiros casos, 73%
dos moradores já se encontram imunizados pela vacina. Junto com o Espírito
Santo, os dois estados concentram 93% dos casos suspeitos. Todos os casos
registrados no Brasil até então são silvestres, transmitidos por mosquitos em
áreas rurais.
Imunização
A vacina representa a medida mais eficaz para
controlar a doença, mas Granato reforça que, “neste momento, não há indicação
de vacinação indiscriminada para toda a população, pois pode ocasionar efeitos
colaterais e, por essa razão, só deve ser administrada a pessoas que corram
alto risco de contração da doença”.
A recomendação atual do Ministério da Saúde é de
que apenas as pessoas que vão se dirigir a uma zona endêmica ou que moram em
uma região endêmica tomem a vacina. “Quem mora, por exemplo, em São Paulo, e
não vai sair daqui, não tem indicação de vacinação”, explica Granato. Pessoas
que nunca foram vacinadas e/ou que vivem ou irão a locais endêmicos devem se
informar nos Postos de Saúde sobre a vacinação.
A SBPC/ML esclarece que o paciente que apresentar
algum sintoma em uma região endêmica deve dirigir-se a um posto médico para ser
acompanhado até terminar o período de risco de evolução para uma forma mais
grave da doença. “Se a pessoa não estiver em zona endêmica e não houver
ocorrência de casos em sua região, ela pode ser mantida em casa e, apenas se
apresentar pele amarelada ou sangramento gengival e nasal, mesmo que discreto,
deve buscar atendimento médico”, esclarece Granato.
Tratamento
Tanto a febre amarela, como dengue, Zika ou
Chikungunya são doenças que não possuem tratamentos específicos. “O tratamento
é de sustentação (hidratação com soro, oxigenoterapia e repouso), para dar
tempo de o próprio organismo preparar uma resposta do sistema imune e combater
o vírus”, conclui Granato.
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