No último dia 12 de setembro, o plenário do Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu que o ensino domiciliar não pode ser considerado
um meio lícito que garanta o acesso à educação no Brasil. Na decisão, a maioria
dos ministros consideraram que, para que a opção fosse válida, teria de estar
prevista em lei.
Embora a decisão seja definitiva, a discussão sobre o
tema trouxe algumas reflexões sobre essa forma de educar que extrapolam o
aspecto legal. Um desses pontos está relacionado à socialização da criança. Críticos
desse modelo educacional argumentaram que ela limita o convívio da criança com
outros de sua idade ou até mesmo de faixas etárias diferentes. Seria a privação
de um convívio social mais amplo e mais rico em experiências. Em poucas
palavras, representaria o risco de criar a criança numa espécie de bolha.
Para os defensores do chamado “homeschooling”, porém,
essa socialização poderia ser facilmente trabalhada em outros grupos de
convivência, como em clubes e em outros momentos que não a educação formal.
O responsável pela educação foi outro item de reflexão.
Afinal, nem sempre o pai, a mãe ou a pessoa que se prontifica em fazer essa
educação domiciliar tem a preparação, o olhar acadêmico ou o conhecimento
teórico e mesmo prático para enxergar as melhores perspectivas, a melhor forma
de trabalhar com aquela criança ou aquele jovem, de modo a desenvolver todas as
suas potencialidades.
Por não ser profissional da área, em muitos casos, o
responsável por essa educação simplesmente faz pela intuição, sem estudo, o que
pode prejudicar o desenvolvimento do educando, limitando as experiências
necessárias para seu enriquecimento e formação.
Nesse sentido, deve-se ainda destacar que, muito além dos
aspectos legais, a nossa cultura é bem diferente da norte-americana, onde o
“homeschooling” é amplamente difundido. Por lá, existe a cultura de criação do
filho para mundo. Os jovens saem de casa para fazer faculdade e muitos já
trabalham enquanto moram com os pais, passam grande parte dessa fase longe.
Aqui, ainda temos o hábito de dar mais acolhimento, o jovem fica por mais tempo
debaixo da asa dos pais, o que pode representar um ponto negativo para a
educação domiciliar.
Há, contudo, quem use o mesmo quesito como favorável para
a educação domiciliar, no sentido de que esse acolhimento justamente permitiria
a personalização da educação, de acordo com as necessidades da criança e com os
valores da própria família. Os responsáveis pelo educando também conseguiriam
ficar muito mais atentos ao desenvolvimento das habilidades de suas crianças,
em razão desse acompanhamento bem próximo, totalmente individualizado.
Nesse ponto, porém, também faz-se necessário destacar a
realidade de grande parte das famílias brasileiras. Afinal, é preciso muito
tempo e dedicação. Não adianta a família ser formada por pessoas que trabalham
fora durante todo o dia para tentar dar conta do processo educacional durante a
noite, naqueles poucos momentos com o filho. Se não houver a presença
consciente da responsabilidade, o desenvolvimento educacional poderá ser
prejudicado.
O conteúdo, por fim, é o último ponto de reflexão. No
formato da educação brasileira, há exigência do desenvolvimento pedagógico de
acordo com material e base curricular específicas para cada etapa escolar. Em
casa, como aconteceria esse desenvolvimento? Seria preciso algum tipo de
acompanhamento do desenvolvimento da criança, de modo que garantisse que ele
acontecesse de forma semelhante ao que acontece na educação tradicional, dada
em uma instituição de ensino.
Com tantos pontos de debate, vê-se a complexidade do
assunto tratado pelo STF. Embora a falta de regulamentação de lei fosse um dos
principais pontos para o não reconhecimento da educação domiciliar, o tema vai
muito além.
Agora, após decisão do Supremo, a única educação legalmente
reconhecida é a formal, dada dentro das instituições de ensino públicas e
privadas do país. A elas cabe a missão de transmitir conteúdo pedagógico e
social, que possibilite a cada criança, a cada jovem, formar-se cidadão atuante
e consciente de seu papel social.
Claro, sempre contando com o total apoio e
acompanhamento dos pais. Afinal, não há escola que garanta educação plena sem
contar com a família como parceira permanente nesse processo.
Edson
D’Addio - educador e diretor pedagógico do Colégio Palmares
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