A promulgação da Lei Brasileira de Inclusão (LBI) foi um avanço e tanto para a garantia dos direitos das pessoas com deficiências. A nova lei, publicada em julho de 2015 e em vigor desde janeiro de 2016, consolida uma série de regras que, colocadas em prática, serão fundamentais para melhorar não apenas o dia-a-dia dessas pessoas, mas de toda a sociedade, na medida em que a torna mais justa e igualitária. Será um Brasil melhor de se viver.
É sempre bom lembrar que, de acordo com o Censo Demográfico 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 23,9% da população tem algum tipo de deficiência visual, física, auditiva ou intelectual. Em 2010, este percentual representava mais de 45 milhões de pessoas. Deste total, cerca de 7% tinha algum tipo de deficiência severa, apresentando algum grau de dependência.
Foi pensando neste grupo, e em seu direito de ir e vir, que foram criados os artigos 51 e 52 da LBI. O primeiro determina que as frotas de táxi devem reservar 10% de seus veículos acessíveis às pessoas com deficiência, proibindo tarifas diferenciadas e autorizando o poder público a oferecer incentivos fiscais para a formação desta frota.
Já o artigo 52 aponta que as locadoras de veículos são obrigadas a contar com um veículo adaptado para uso de pessoa com deficiência a cada 20 veículo de sua frota. Ele determina ainda as condições mínimas para que se considere um veículo adaptado: câmbio automático, direção hidráulica, vidros elétricos e comandos manuais de aceleração e frenagem.
Como toda lei recente, a LBI também é passível de discussões e adaptações, à medida em que vai se ajustando à realidade. Mas, para que isso ocorra, é preciso que ela seja, antes de mais nada, implementada de fato. Dois anos depois de sua promulgação, os artigos da LBI que garantem o direito à locomoção das pessoas com deficiência estão saindo do papel para as ruas em um ritmo lento, muito abaixo do que seria necessário.
O Brasil conta hoje com uma frota de cerca de 130 mil táxis. Em um mundo ideal, para este volume, a frota de veículos adaptados deveria ser de cerca de 13 mil táxis. Até aqui, o Brasil conta com um total de apenas cerca de 700 veículos adaptados circulando.
Há iniciativas aqui e ali, mas o ponto é que, dos mais de cinco mil municípios brasileiros, apenas perto de 1% destes têm algum sistema de táxi que conte com carros adaptados. E naqueles em que esta frota existe, os números ainda estão abaixo dos previstos em lei.
A cidade de São Paulo, por exemplo, com um frota de cerca de 38 mil táxis, conta com apenas 200 veículos adaptados (somando-se aqui os táxis pretos e os tradicionais). Se levarmos em conta que boa parte destes veículos trabalha em regime quase exclusivo para o Atende (Serviço de Atendimento Especial), percebe-se um enorme vale entre a frota existente e a necessária para as demandas da população. Neste caso, para atender à LBI, a frota de táxis adaptados deveria radicalmente maior.
Outro ponto relevante a se discutir é a obrigatoriedade de manutenção da tarifa. Justo? Sim e não. Sim, se pensarmos no alto custo de vida que é imposto a uma pessoa com deficiência. Não, se pensarmos na lucratividade do taxista, que tem investimentos (adaptação do veículo) e custos operacionais (tempo de embarque e desembarque, busca de local acessível, entre outros cuidados que este tipo de transporte exige) maiores para prestar esse serviço, se comparados a um táxi convencional.
E se falamos de táxis, não podemos deixar de lado os serviços de aplicativos como o UBER, por exemplo, que hoje conta com 500 mil veículos em todo o Brasil, 150 mil apenas na Grande São Paulo. Aqui, a questão é mais delicada, pois este tipo de serviço não se enquadra na LBI, a não ser de forma genérica, no artigo 48, que prevê que os veículos de transporte coletivo terrestre, aquaviário e aéreo devem ser acessíveis.
O fato é que, se a criação da lei foi um avanço, ainda temos muito a caminhar para garantir que seja colocada em prática, garantindo às pessoas com deficiência o direito à locomoção nas mesmas condições que as demais. Para que isso aconteça, as discussões, interações e cobranças, seja do poder público, seja das empresas privadas, devem ser constantes. É a garantia do direito de ir e vir, de táxi, aplicativo ou de carro alugado.
Monica Lupatin Cavenaghi - administradora de empresas e empresária, diretora comercial da Cavenaghi e Vice-presidente da ABRIDEF, Associação Brasileira da Indústria, Comércio e Serviço de Tecnologia Assistiva.
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