O contexto agora é
o combate a um sistema digno de um buraco negro que absorve qualquer boa
intenção política
Os Intocáveis é um filme de 1987, dirigido por
Brian De Palma, escrito por David Mamet a partir do livro de Oscar Fraley. O
roteiro aborda a Lei Seca nos EUA de 1930 com a consequente proibição de
comercialização de bebidas alcoólicas.
No filme, Eliot Ness (Kevin Costner) é um agente
federal na cidade de Chicago com a missão de combater a venda ilegal de
bebidas. O chefe da Máfia é o notório Al Capone (Robert De Niro).
Para pegar Capone, Eliot Ness monta uma “força
tarefa” composta por Jim Malone (Sean Connery), George Stone (Andy Garcia) e
Oscar Wallace (Charles Martin Smith). Com esta formação passam a ser
conhecidos como “Os intocáveis”. O filme demonstra de maneira clara a luta do
bem contra o mal, e a imagem de heróis incorruptíveis dos agentes torna-se
evidente durante o transcorrer do filme.
Porém, a postura ética de Eliot Ness não resiste à
realidade do tamanho do problema que tem que enfrentar. Para combater Capone, Eliot
Ness teve que necessariamente avançar o sinal. Ness empurra um homem de cima de
um prédio, estoura à bala a cabeça de um homem, já morto, conseguindo confissão
de um criminoso que assistia a tudo desesperado, aponta arma para um homem
desarmado, dentre outras práticas. Joga com a regras do adversário, diríamos.
Façamos um corte para o Brasil da Lava Jato e para
suas ações que agora sofrem desgaste após as publicações do site Intercept Br.
O contexto agora é o combate a um sistema digno de
um buraco negro que absorve qualquer boa intenção política, utilizando dinheiro
do bolso do próprio cidadão brasileiro para a compra de agentes políticos.
Uma mão lava a outra, o empresário beneficia-se de
contratos superfaturados e o político eterniza-se no poder. Tudo prático e
simples se não ocorresse a ação de agentes de investigação federal e um
magistrado linha dura.
O sistema de corrupção demonstrou-se imenso,
ramificado e complexo. Talvez complexo demais para os próprios integrantes da
operação e a necessidade de angariarem provas robustas, mesmo que essas provas
se equiparem a um singular depoimento do contador de Capone no filme.
Nas mãos do STF, um terrível dilema, comparável a
antológica cena da escadaria. Inspirada no filme “O Encouraçado Potemkin”, de
1925, a cena se repete em “Os intocáveis”. Como Eliot Ness, George Stone,
enfrentarão gângsteres fortemente armados, salvarão a testemunha
chave (o contador), não
atingindo pessoas inocentes do local, e ainda, permitindo que uma desatenta mãe
suba lentamente com o carrinho de bebê pela longa escadaria da estação?
Com esta analogia, pergunta-se: Como o STF
respeitará o devido processo legal sem matar todo o trabalho realizado?
A legislação brasileira ainda não contempla forças
tarefas que investigam cartéis criminosos, contando com a presença de um juiz
que de suporte direto na instrução e outro juiz para julgar. Talvez seja
importante pensar nisso, traçando limites legais de atuação e preservando,
assim, a higidez da decisão do juiz que julgará a causa.
Cabe a maioria expressiva dos juristas, população,
meios de comunicação, pensarem com cautela sobre o que deverá ser decidido em
breve, e o que se espera do futuro do país.
Não é mais possível, no contexto da ordem
democrática, atitudes impensadas, ora jogando um país para um extremo, ora
jogando o país para outro.
Dr
Cassio Faeddo - Advogado. Mestre em Direitos Fundamentais, MBA em
Relações Internacionais - FGV SP. - www.instagram.com/faeddo
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