Profissionais do Instituto de Pesquisas São
Leopoldo Mandic desenvolveram um gel com moléculas de prostaglandina PGJ2,
com propriedade anti-inflamatória e menos efeitos colaterais do que
medicamentos atualmente prescritos para tratar dermatite atópica
Corticoides e inibidores de calcineurina, como o
tracolimus – um fármaco imunossupressor –, são os medicamentos mais prescritos
para tratar a dermatite atópica, mas seu uso contínuo apresenta riscos
indesejáveis. Para buscar um medicamento mais eficaz e com menos efeitos
colaterais danosos ao paciente, pesquisadores do Instituto de Pesquisas São
Leopoldo Mandic, em Campinas, desenvolveram um gel (hidrogel 15d-PGJ2)
composto por moléculas sintéticas de prostaglandina PGJ2, que têm
propriedade anti-inflamatória, são produzidas por quase todas as células do
corpo humano e podem ser fabricadas em laboratório.
Os resultados da pesquisa foram descritos no artigo
The 15d-PGJ2 hydrogel ameliorates atopic dermatitis through
suppression of the immnune response, publicado em abril deste ano, no
periódico Molecular Medicine Reports.
O estudo foi realizado com financiamento da Fapesp (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo) e apoio do CNPq (Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e da CAPES (Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
Pruridos na pele, vermelhidão, inchaço, descamações
e coceiras incontroláveis são alguns dos sintomas da dermatite atópica, uma
doença crônica e autoimune que chega a afetar 10% dos adultos e 25% das
crianças. Desaparece em até 75% das crianças na vida adulta, mas, naquelas em
que permanece, pode causar lesões para o resto da vida, além de depressão e
isolamento social por causa do desconforto e das marcas na pele.
Tratamentos
para dermatite atópica
De acordo com a Academia Americana de Dermatologia,
o tratamento para a dermatite atópica deve ser iniciado com corticosteróides
tópicos, quando apenas hidratar a pele não é suficiente para controlar a
doença. “O problema de ficar passando, com frequência, pomada de corticoide nas
lesões é que as células que formam a pele, chamadas queratinócitos, acabam
sendo destruídas e chega uma hora que, de tanto passar corticoide, o
medicamento não faz mais efeito”, explica Dr. Marcelo Henrique Napimoga,
diretor de pós-graduação, pesquisa e extensão da Faculdade São Leopoldo Mandic,
e coordenador do estudo.
Quando os corticoides começam a falhar, é comum que
se prescrevam os inibidores de calcineurina, como o tracolimus, para tratar a
dermatite atópica. Esses inibidores também têm efeito anti-inflamatório,
impedindo a ativação das células T, responsáveis pela defesa do organismo
contra antígenos. Mas, a longo prazo, há estudos que indicam que o tracolimus
pode causar linfoma e carcinomas cutâneos.
“Para produzir o hidrogel, usamos a prostaglandina
PGJ2, que é uma molécula com ação anti-inflamatória, que é produzida
endogenamente e, por isso, não tem efeitos colaterais indesejados, como os
corticoides e o tracolimus. Além disso, conseguimos colocar essa molécula
dentro de um polímero, formando um hidrogel que é absorvido pela pele”,
ressalta Napimoga.
Testes
Vários testes físico-químicos foram feitos para
provar que se conseguiu formar o gel, absorvível pela pele, e que nele ficou
retida a prostaglandina PGJ2. “Os dados físico-químicos mostram que
o gel que criamos funcionou, porque ele se manteve estável e incorporou a
prostaglandina PGJ2 em diferentes temperaturas, por exemplo, nas
temperaturas ambiente e corporal”, conta o pesquisador.
Em seguida, os pesquisadores testaram se o hidrogel
15d-PGJ2 tem efeito benéfico em modelos de dermatite atópica. Um
modelo com escaras de dermatite atópica foi tratado apenas com o gel, enquanto
outro modelo foi tratado com o hidrogel 15d-PGJ2, e outro com o
tracolimus, o medicamento mais usado hoje para tratar a doença.
“Visualmente, é possível verificar que o modelo
tratado com o hidrogel teve diminuição da lesão de dermatite e,
histologicamente, houve redução no número de mastócitos, que é uma célula que
armazena potentes mediadores químicos de inflamação e, por isso, é relevante
para manter a dermatite atópica. Já o tracolimus diminuiu a inflamação, mas não
de maneira significativa como a PGJ2”, explica Napimoga.
O próximo passo foi dosar a imunoglobulina IgE nos
modelos tratados com o hidrogel e o tracolimus. Essa imunoglobulina é produzida
pelos linfócitos em resposta à dermatite atópica. Em ambos os modelos, houve
redução da produção de IgE. “Isso demonstra que estamos conseguindo diminuir a
resposta inflamatória onde há o agente irritante”, conclui o pesquisador.
Algumas células inflamatórias também foram avaliadas
no estudo. A PGJ2 foi capaz de diminuir o número de linfócitos Th17
na lesão de dermatite atópica. O tracolimus também reduziu a quantidade dessas
células, mas não apresentou diferença estatística. A pesquisa constatou
ainda que a PGJ2 reduz a produção de citocinas TNF-α, que são mediadores
inflamatórios que contribuem para manter a dermatite atópica. Já o tracolimus
não produziu o mesmo efeito.
Produção
da prostaglandina PGJ2
Ainda não existem medicamentos produzidos com a
molécula de prostaglandina PGJ2 – que é experimental -, embora os
resultados da pesquisa desenvolvida no Instituto de Pesquisas São Leopoldo
Mandic sejam promissores e mostrem a eficácia do hidrogel 15d-PGJ2. “O
grande problema é que fazer prostaglandina PGJ2 não é barato e a estabilidade
dela é pequena. Do ponto de vista comercial, seria preciso uma indústria com
potencial e maquinários bem específicos. O fato de a PGJ2 ser um
lipídio torna mais difícil a sua formulação na quantidade certa para que se
mantenha estável”, afirma Napimoga.
Ele e outros pesquisadores, do Instituto de
Pesquisas SLMANDIC, fazem parte do Laboratório de Pesquisa da Interface
Neuroimune da Dor, que se dedica a pesquisar a relação dos aspectos
imunológicos em diferentes condições dolorosas.
“Temos uma linha de pesquisa muito grande com a
prostaglandina PGJ2 para criar diferentes formas de entrega dessa
molécula, com nano-carreadores e também hidrogel. Colocamos a PGJ2,
por exemplo, em hidrogel ou nano-cápsula porque é preciso uma
quantidade muito pequena de moléculas. Eles protegem a PGJ2, que vai
sendo liberada aos poucos na articulação ou pele inflamadas. Dessa forma, é
possível reduzir a quantidade de medicamento e prolongar a sua ação, reduzindo
efeitos adversos”, comenta o pesquisador.
O artigo The 15d-PGJ2 hydrogel
ameliorates atopic dermatitis through suppression of the immnune response
(doi: 10.3892/mmr.2019.10156) foi escrito por: Dr.
Marcelo H. Napimoga, Dr.a Juliana T. Clemente‑Napimoga,
Dr. Antônio José de Pinho, Dr.a
Andresa B. Soares e
Dr. Marcelo Sperandio (docentes da
SLMANDIC); Dr.a
Daniele R. de Araújo (docente da UFABC – Universidade Federal do ABC); e
os alunos Nina M. Machabanski, Maria Eduarda
A. Juliani, Pedro Henrique B. C. Acras, Cristina G. Macedo, Henrique
B. Abdalla, e está publicado em https://www.spandidos-publications.com/10.3892/mmr.2019.10156.
Sobre
o Instituto de Pesquisas São Leopoldo Mandic
O Instituto de Pesquisas São Leopoldo Mandic, em
Campinas, foi constituído em janeiro de 2008,
sem fins lucrativos, para realizar pesquisas científicas na área de saúde.
Iniciou com pesquisas na área odontológica, expandiu para a área de saúde, além
do desenvolvimento de novas tecnologias, produção e divulgação de informações e
conhecimentos técnico-científicos, fomento à capacitação e treinamento de
pesquisadores.
Conta com laboratórios de Cultura de Células,
Microbiologia, Ensaio de Materiais, Patologia e Imunohistoquímica, Biologia
Molecular e Terapia Celular, todos equipados com recursos de última geração.
Até dezembro de 2018, foram 981 artigos publicados em revistas científicas
indexadas em diferentes bases de dados, como PubMed e Scielo. E o Laboratório
de Patologia emitiu, gratuitamente, mais de 24 mil laudos de biópsias
provenientes de tecidos da região da cabeça e pescoço, sendo 1.542 de
carcinomas e 125 de neoplasias malignas.
Os recursos financeiros do Instituto de Pesquisas São Leopoldo Mandic
são obtidos por meio de parcerias e convênios, financiamentos de órgãos
públicos, contribuição de associados e terceiros e recebimento de patentes.
Dentre os principais parceiros, destacam-se CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico), FAPESP (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo) e CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
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