Importância de vacinas cruciais para o cenário oncológico são
ignoradas por mais de 10% dos brasileiros – e os números de adesão são ainda
piores
Desde 2004, o Ministério da
Saúde organiza os calendários de vacinação por ciclos de vida – crianças,
adolescentes, adultos e idosos. Segundo relatório recente feito pela Unicef e a
Organização Mundial de Saúde (OMS), a taxa de cobertura entre as crianças caiu
no Brasil nos últimos três anos. A tríplice viral, por exemplo, teve queda de
15%, enquanto a vacina contra a poliomielite caiu 17%. Mas essa tendência
também pode ser vista nas demais faixas etárias. De acordo com dados do
Ministério da Saúde, os níveis cobertura de todas as vacinas estão abaixo da
meta ideal. Diante deste quadro preocupante, a Sociedade Brasileira de
Oncologia Clínica (SBOC) alerta sobre a importância de a população aderir às
campanhas de vacinação.
Segundo a Dra. Andréia Melo,
diretora da SBOC, as vacinas são algumas das formas mais simples e eficazes de
prevenir doenças, inclusive algumas formas de câncer. Para o especialista, a
situação é grave e acende um alerta vermelho para alguns tipos de câncer cuja
principal forma de prevenção advém de vacinas.
“O câncer já é uma doença
epidêmica e se tornará a maior responsável por mortes no Brasil até 2020. É
crucial que façamos tudo sob nosso alcance para diminuir ao máximo sua
incidência e salvar vidas. Entretanto, parece passar despercebido por boa parte
das pessoas que as vacinas têm um papel central na prevenção de algumas formas
bastante incidentes da doença. O caso da vacina do vírus do papiloma humano
(HPV) – principal forma de prevenção do câncer do colo de útero, o terceiro
mais comum entre as mulheres no Brasil – é emblemático. O grupo-alvo
estabelecido pela OMS para essa vacina é de meninas entre 9 e 14 anos – e esse
público pode tomá-la gratuitamente no SUS durante todo o ano. Entretanto,
apenas 48,7% dessas meninas receberam a vacina desde o início da imunização, há
cinco anos, sendo que a cobertura necessária é de 80%. No ano passado, 900 mil
vacinas ficaram encalhadas e precisaram ser disponibilizadas para pessoas de
outras faixas etárias. Esse tipo de situação é inaceitável” diz a Dra. Melo.
Outra vacina importante para
o cenário oncológico é a que atua contra o VHB – o vírus causador da hepatite
B, que é um dos principais fatores relacionados ao câncer de fígado.
Entretanto, de acordo com o Ministério da Saúde, essa vacina é uma das que
menos teve adesão nos últimos 24 anos: de 1994 para cá, apenas 39,4% dos
adultos foram imunizados contra a hepatite B. “Apesar de a baixa adesão da
população estar sendo exacerbada nos últimos tempos com a proliferação de fake
news – que duvidam da segurança das vacinas e as ligam a mortes e até casos
de autismo –, esse é um problema mais amplo, que vem de longe. O fato de seis
em cada dez pessoas não terem se imunizado contra a hepatite B em um período de
mais de 20 anos mostra que a questão não é nova”, diz a especialista.
Segundo a diretora da SBOC,
para endereçar a questão de forma séria, é preciso não apenas educar e
conscientizar a população, mas também implantar políticas de atenção primária
que capacitem os profissionais de saúde em todo o País. “No Brasil, é sempre
difícil apontar apenas um fator por trás dos problemas. Neste caso, há uma
mistura de várias questões difíceis de resolver, como a desinformação e o medo
– que não atingem apenas os pacientes, mas também os profissionais de saúde. No
caso específico do câncer, a questão é ainda mais delicada, pois ainda não há
uma formação adequada (em qualidade e quantidade) de médicos oncologistas no
país, o que faz passos importantes do tratamento e diagnóstico do câncer sejam
tomados por profissionais não-especialistas. Em 2015, por exemplo, quase 60%
dos profissionais de saúde não sabiam que a vacina contra o HPV protege contra
o câncer de colo de útero. Se eles não sabem, como é que vão recomendar a linha
de ação adequada para os pacientes?”.
Para contribuir com a
mudança desse cenário, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) tem
feito esforços para qualificar o debate público sobre o tema – com notas
técnicas sobre as vacinas contra a febre amarela e a influenza –, conscientizar
a população sobre a importância das campanhas da vacinação – em especial contra
o HPV e a hepatite B, cuja importância oncológica não é reconhecida por 14% dos
brasileiros, segundo pesquisa da SBOC – e aumentar a quantidade e qualidade de
profissionais especialistas formados com conhecimento sólido em oncologia.
Passos importantes nesse sentido foram o recente reconhecimento da Oncologia
Clínica como especialidade médica e os esforços despendidos para estabelecer um
Título de Especialista em Oncologia Clínica. “Apenas levando esse problema a
sério, desde suas causas mais profundas – como a insuficiência de profissionais
devidamente capacitados – até suas consequências mais visíveis – como a falta
de conhecimento e a baixa adesão às vacinas por parte dos brasileiros –
conseguiremos melhorar essa situação”, finaliza.
SOBRE A SBOC -
SOCIEDADE BRASILEIRA DE ONCOLOGIA CLÍNICA
A
Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) é a entidade nacional que
representa mais de 1,5 mil especialistas em oncologia clínica distribuídos
pelos 26 Estados brasileiros e o Distrito Federal. Fundada em 1981, a SBOC tem
como objetivo fortalecer a prática médica da Oncologia Clínica no Brasil, de
modo a contribuir afirmativamente para a saúde da população brasileira. Desde
novembro de 2017, é presidida pelo médico oncologista Sergio D. Simon, eleito
para o biênio 2017/2019