Para especialista, novo modelo flexibiliza
formalidades em situações extremas, mas pode ampliar litígios e exige rigor
judicial na validação
A
aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), do modelo
de testamento de emergência abre uma inflexão relevante no Direito de Família
ao flexibilizar requisitos formais que, historicamente, condicionam a
manifestação de última vontade no Brasil. Para Wagner Oliveira Pereira
Junior, advogado da Michelin Sociedade de Advogados e pós-graduado em Direito
de Famílias e Sucessões pela PUC/PR, a proposta responde a uma
demanda concreta da sociedade: permitir que, em contextos extremos, o indivíduo
consiga registrar sua vontade sem depender das solenidades tradicionais.
“O
rigor formal sempre foi visto como garantia de segurança jurídica. Mas, em
situações de doença súbita, calamidades ou restrições de liberdade, essas
formalidades simplesmente se tornam inviáveis. O resultado é que muitas pessoas
morrem sem testamento, e a sucessão acaba regida por regras que não refletem
seus verdadeiros desejos”, afirma o advogado.
Segundo
ele, a medida tende a reduzir os casos de sucessão legítima decorrentes da
impossibilidade de testar, ampliando o acesso a um planejamento sucessório
minimamente compatível com a realidade de cada família. Entretanto, a
flexibilização não está isenta de desafios.
“A
dispensa de testemunhas fragiliza, em um primeiro momento, a prova da
autenticidade e da lucidez do testador. Mas esse aparente risco é compensado
pela exigência de confirmação judicial em até 90 dias, que transforma o
testamento de emergência em um ato informal na origem, mas submetido a um crivo
posterior muito rigoroso”, explica Wagner.
Ele
destaca que caberá ao Judiciário verificar a veracidade das circunstâncias
excepcionais, a capacidade do testador no momento da elaboração e a ausência de
vícios que possam comprometer a vontade expressa. Para o especialista, esse
controle é o elemento central para equilibrar autonomia e segurança.
Os
cenários em que o instrumento tende a ser mais acionado incluem emergências
médicas graves, catástrofes naturais, pandemias, confinamentos forçados e até
viagens de risco. A amplitude dessas hipóteses, porém, exige cautela.
“Se
a modalidade emergencial começar a ser usada fora de contextos realmente
extraordinários, haverá risco real de banalização. Isso pode aumentar disputas
judiciais, facilitar fraudes e comprometer a previsibilidade das relações
sucessórias”, alerta.
Por
isso, Wagner defende que a futura lei, e a jurisprudência que se formará,
definam critérios claros sobre o que configura “emergência” e reforcem o
caráter extraordinário do instituto.
“A proposta busca corrigir uma lacuna importante, mas sua efetividade dependerá de uma aplicação responsável. É preciso assegurar que o mecanismo sirva para proteger a última vontade, não para criar atalhos que enfraqueçam o sistema sucessório”, conclui.
Fonte: Wagner Oliveira Pereira Junior, advogado da Michelin Sociedade de Advogados, pós-graduado em Direito de Famílias e Sucessões pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
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