Pesquisar no Blog

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Testamento de emergência expõe disputa entre autonomia da vontade e segurança jurídica

Para especialista, novo modelo flexibiliza formalidades em situações extremas, mas pode ampliar litígios e exige rigor judicial na validação


A aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), do modelo de testamento de emergência abre uma inflexão relevante no Direito de Família ao flexibilizar requisitos formais que, historicamente, condicionam a manifestação de última vontade no Brasil. Para Wagner Oliveira Pereira Junior, advogado da Michelin Sociedade de Advogados e pós-graduado em Direito de Famílias e Sucessões pela PUC/PR, a proposta responde a uma demanda concreta da sociedade: permitir que, em contextos extremos, o indivíduo consiga registrar sua vontade sem depender das solenidades tradicionais.

“O rigor formal sempre foi visto como garantia de segurança jurídica. Mas, em situações de doença súbita, calamidades ou restrições de liberdade, essas formalidades simplesmente se tornam inviáveis. O resultado é que muitas pessoas morrem sem testamento, e a sucessão acaba regida por regras que não refletem seus verdadeiros desejos”, afirma o advogado.

Segundo ele, a medida tende a reduzir os casos de sucessão legítima decorrentes da impossibilidade de testar, ampliando o acesso a um planejamento sucessório minimamente compatível com a realidade de cada família. Entretanto, a flexibilização não está isenta de desafios.

“A dispensa de testemunhas fragiliza, em um primeiro momento, a prova da autenticidade e da lucidez do testador. Mas esse aparente risco é compensado pela exigência de confirmação judicial em até 90 dias, que transforma o testamento de emergência em um ato informal na origem, mas submetido a um crivo posterior muito rigoroso”, explica Wagner.

Ele destaca que caberá ao Judiciário verificar a veracidade das circunstâncias excepcionais, a capacidade do testador no momento da elaboração e a ausência de vícios que possam comprometer a vontade expressa. Para o especialista, esse controle é o elemento central para equilibrar autonomia e segurança.

Os cenários em que o instrumento tende a ser mais acionado incluem emergências médicas graves, catástrofes naturais, pandemias, confinamentos forçados e até viagens de risco. A amplitude dessas hipóteses, porém, exige cautela.

“Se a modalidade emergencial começar a ser usada fora de contextos realmente extraordinários, haverá risco real de banalização. Isso pode aumentar disputas judiciais, facilitar fraudes e comprometer a previsibilidade das relações sucessórias”, alerta.

Por isso, Wagner defende que a futura lei, e a jurisprudência que se formará, definam critérios claros sobre o que configura “emergência” e reforcem o caráter extraordinário do instituto.

“A proposta busca corrigir uma lacuna importante, mas sua efetividade dependerá de uma aplicação responsável. É preciso assegurar que o mecanismo sirva para proteger a última vontade, não para criar atalhos que enfraqueçam o sistema sucessório”, conclui. 



Fonte: Wagner Oliveira Pereira Junior, advogado da Michelin Sociedade de Advogados, pós-graduado em Direito de Famílias e Sucessões pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Posts mais acessados