A advogada doutora em Direito Civil Danielle Biazi explica que o assédio processual muitas vezes surge como agravante na violência doméstica
O assédio processual no contexto da violência
doméstica pode ser caracterizado pela propositura de diversos recursos,
incidentes e ações judiciais que visem exclusivamente intimidar, ameaçar e até
mesmo sufocar financeiramente a mulher, normalmente ocorrendo em contextos que
também envolvem divórcio, guarda de filhos e alimentos.
Exemplos comuns são situações em que o ex-marido
propõe ações paralelas imputando alienação parental à ex-mulher, reparação de
danos, ou ainda crimes e infrações administrativas (exemplo, denúncias forjadas
em conselhos profissionais com o exclusivo fito de instaurar sindicância que
vise o receio de perda da profissão da mulher).
A advogada Danielle Biazi, doutora em Direito Civil
pela PUCSP, alerta que essa estratégia não apenas sobrecarrega o Judiciário,
mas também agrava o sofrimento psicológico e emocional das vítimas, muitas
vezes já envolvidas em situações de violência doméstica que, é preciso lembrar,
não se limita à violência física, mas também ao abuso moral, psicológico,
financeiro e sexual.
De acordo com Biazi, "Muitos agressores
utilizam o sistema judicial como uma ferramenta de vingança, prolongando o
sofrimento das vítimas por meio de ações judiciais repetitivas e sem
fundamento", destaca a advogada.
No âmbito do direito de família, o impacto é
igualmente grave. "O assédio processual, muitas vezes, prolonga disputas
sobre guarda de filhos e partilha de bens, agravando o desgaste emocional e
financeiro das vítimas", acrescenta. Segundo a advogada, essa prática se
configura como uma nova forma de violência, na qual o agressor tenta ludibriar
o Judiciário para manter o controle sobre a vítima, mesmo após a separação.
Dois exemplos recentes ilustram o fenômeno: a
apresentadora Ana Hickmann enfrenta uma série de ações judiciais movidas pelo
ex-marido, incluindo pedidos de indenização por danos morais e discussões sobre
guarda de filhos. A defesa de Ana classificou as ações como "atos grotescos
de assédio processual", visando constrangê-la e prolongar o litígio.
Outro caso envolve a apresentadora Titi Müller, que
revelou sofrer violência processual após ser impedida, por liminar, de citar o
ex-marido em redes sociais. A separação, marcada por agressões verbais e
físicas, estendeu-se no Judiciário, dificultando o término do processo de
divórcio.
Em disputas familiares, o desvio do foco original
das ações, como questões relativas à guarda de menores, revela o caráter
abusivo desses processos. As consequências se estendem para além dos tribunais.
As vítimas enfrentam não apenas prejuízos financeiros, mas também graves danos
emocionais, além de riscos à carreira, em função de danos à reputação.
Diante do aumento dos casos, cresce a demanda por
uma resposta mais eficaz por parte dos tribunais. Além das indenizações por
danos morais, é necessário ampliar a proteção das vítimas contra novos abusos.
"A adoção de medidas mais rígidas contra práticas processuais
protelatórias é essencial, principalmente nos casos de violência doméstica,
onde a demora na resolução dos conflitos pode perpetuar o sofrimento das
vítimas", defende Biazi.
Biazi defende uma postura mais ativa do Judiciário
e a implementação de juízos especializados que combinem questões de família e
violência doméstica. A recente Resolução 492/2023 do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), que introduz o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de
Gênero, é um passo importante nesse combate. Porém, há um consenso entre
especialistas de que ainda são necessárias reformas mais profundas para conter
esse tipo de abuso jurídico.
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