Por longos anos, o exercício do sufrágio esteve nas
mãos de seletos grupos políticos: no Brasil monárquico, sequer existia, de modo
que o poder era emanado de um único soberano: o Rei. Foi somente com a
Constituição da República, em 1891, que o exercício do voto foi
constitucionalmente garantido – ainda que adstrito a oligarquias e demais
categorias sociais que gozavam de privilégios.
Historicamente, a luta pelo direito ao sufrágio foi
árdua e, somente com a Assembleia Constituinte que daria corpo à nossa
Constituição, é que a universalidade se tornou característica associada ao
exercício do direito político. É na redemocratização que o Brasil e seus
cidadãos escrevem uma nova história.
No último domingo, várias cidades do Brasil
passaram pelo segundo turno das eleições municipais, colocando para o eleitor o
dever do exercício constitucional da cidadania, por meio do voto. A
Constituição brasileira prescreve uma série de garantias acerca dos direitos
políticos, dentre elas o direito ao sufrágio universal, além da proteção
intocável do voto direto, secreto, universal e periódico.
Em 2024, muita coisa mudou e, ao que parece, o
exercício do voto deixou de ser ferramenta prioritária para os cidadãos.
Somente em Curitiba, no Paraná, foram 432 mil eleitores que se abstiveram de
votar. Além de ser um recorde de abstenções, o dado traz outra consequência: o
número de abstenções ultrapassou o número de votos dados à segunda colocada:
foram 390.254 votos para a candidata Cristina Graeml (PMB), número abaixo das
ausências registradas no domingo.
Mas, afinal, o que esse dado tem a nos revelar?
Primeiramente, é possível atribuí-lo à facilidade
na justificativa dos votos. Com o aplicativo “e-título”, disponibilizado pela
justiça eleitoral, justificar a ausência nunca foi tão simples, bastando abrir
o app e clicar em “justificar o voto”. A tecnologia, utilizada a favor do
processo eleitoral, merece elogios e revela o quanto essa ferramenta pode ser
fundamental para as eleições.
Não obstante, uma análise mais profunda demonstra
um outro cenário: a insatisfação do eleitor. O crescente contexto de corrupção,
aliado à ausência de propostas concretas de transformação nos municípios, além
da desmoralização dos debates públicos e das trocas de ofensas generalizadas
entre os candidatos, levam o cidadão a crer que o exercício do seu voto não
será capaz de realizar mudanças significativas. O sinal de alerta se acendeu e
é preciso estar vigilante em relação a ele.
Não se pode incutir no eleitorado a ideia de que a
democracia morreu, ou de que o voto possui pouca serventia. Pelo contrário:
está mais do que clara a necessidade de se atentar ao exercício do direito
político como nossa mais potente ferramenta de mudança político-social. Afinal,
aqueles que usurpam o poder dependem – não somente, mas majoritariamente – do
nosso voto de confiança enquanto cidadãos titulares de um poder valioso.
Está mais do que na hora de usar esse mecanismo a
nosso favor, ou veremos amargar a democracia que tanto se almejou nos idos do
final da década de 1980. Que as eleições de 2024 sejam capazes de demonstrar
isso ao povo brasileiro!
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