De acordo com a legislação brasileira,
especificamente os artigos 121 e seguintes da Lei das Sociedades por Ações (n.
6.404 de 15 de dezembro de 1976) e artigo 1.078 do Código Civil (Lei 10.406 de
10 de janeiro de 2002), as companhias com capital aberto ou fechado e as
sociedades limitadas, devem realizar ao menos uma vez por ano, nos primeiros
quatro meses de cada ano, uma assembleia ou reunião de sócios, para deliberar
sobre as contas dos administradores, destinação dos lucros, distribuição de
dividendos, eleição de administradores e membros do conselho fiscal, quando for
o caso, entre outras matérias. Trata-se, neste caso, da assembleia geral
ordinária (AGO), prevista para as companhias nos artigos 132 e seguintes da Lei
das Sociedades por Ações.
Além das AGOs para as companhias e da reunião anual
obrigatória para as sociedades limitadas, há também a regular e constante
necessidade de reuniões e assembleias extraordinárias, quando matérias
distintas daquelas que necessariamente precisam ser anualmente tratadas vêm à
tona e, por isso, devem ser objeto de deliberação social.
Em tempo de Covid-19, com todas as restrições e
receios relativos à circulação e aglomeração de pessoas, a pergunta que vem à
tona é como poderiam ser realizadas as assembleias e reunião de sócios?
Pois bem, conforme disciplinam as normas afetas à
matéria, a regra é a participação presencial dos sócios ao conclave, no local
da sede da companhia ou empresa (§2°, art. 124 Lei S/A), com o preenchimento de
requisitos impostos pela Lei como: assinatura de lista de presença, registro da
presença de acionistas em livro próprio, transcrição da ata em livro etc. Não
raras vezes os estatutos ou contratos sociais preveem a participação remota de
sócios, observados os requisitos nesses inseridos.
Não obstante isso, no dia 30 de março de 2020 o
Governo Federal publicou a Medida Provisória 931, que altera as Leis 10.406/2002,
5.764/1971 e 6.404/1976 (respectivamente o Código Civil, a Lei das Cooperativas
e a Lei as Sociedade por Ações), para:
- Prorrogar o prazo para a realização das assembleias/reuniões de sócios previstas para o primeira quadrimestre, podendo elas serem realizadas no prazo de até 07 (sete) meses contado do término do exercício social da Sociedade Anônima, da Sociedade Limitada ou da Cooperativa (Artigos 1º, 4º e 5º da MP 931);
- Prorrogar o mandato dos administradores, gestores e conselheiros das Sociedades por Ações (§2º, Art. 1º), das Sociedades Limitadas (§2º, Art. 4º) e das Cooperativas (Parágrafo Único, Art. 5º), cujos mandatos se encerrariam na próxima assembleia/reunião de sócios, até que ocorra o conclave, no prazo descrito na alínea “a” acima;
- Autorizar/legitimar as deliberações do Conselho Administração das Companhias, ad referendum da Assembleia, acerca dos assuntos urgentes, mesmo que de competência da Assembleia (§3º do Art. 1º);
- Permitir a distribuição de dividendos, autorizados pelo Conselho de Administração, se houver, ou pela Diretoria (Art. 2º);
- Autorizar expressamente a participação e a declaração de voto à distância dos sócios e associados na Sociedade Limitada (Art. 7º), nas Cooperativas (Art. 8º) e na Sociedade por Ações (Art. 9º), alterando-se para isso os dispositivos do Código Civil, da Lei das Cooperativas e da Lei das Sociedades por Ações, com o nítido propósito de perenizar tal modificação.
Além da MP 931, o §1° do art. 121 da Lei das S/A já
permitia a participação e a declaração de voto à distância do acionista, nos
termos da regulamentação da CVM. Também o §1° do art. 127 da Lei das S/A
disciplina que “Considera-se presente em assembleia geral, para todos os efeitos desta
Lei, o acionista que registrar a distância sua presença, na forma prevista em
regulamento da Comissão de Valores Mobiliários.”
Há, portanto, previsão legal para participações
remotas, afora a possibilidade de envio de boletim de voto à distância, com
certa antecedência em relação à realização da assembleia (conforme Instrução
CVM n° 481/19). Portanto, não mais se discute a possibilidade de efetivação do
conclave sob a forma virtual, desde que observados determinados preceitos.
A validade formal das assembleias e reuniões
dependerá de seu posterior registro na Junta Comercial competente. Embora a
maioria delas (entre elas a Junta Comercial do Paraná) esteja com o atendimento
presencial suspenso, as plataformas digitais por elas oferecidas são aptas ao
registro das respectivas atas. No entanto, as Juntas Comerciais arquivarão as
atas desde que as companhias e empresas apresentem a certidão da ata extraída e
assinada fisicamente pelos presidente e secretário da mesa. Para evitar
questionamentos futuros, é importante que as atas digitais tenham as
assinaturas digitais dos sócios, através dos respectivos certificados digitais,
constando ainda a presença dos sócios já no início do conclave, também
formalizado através dos certificados digitais de cada um. Outra possibilidade
plausível é a realização de todo o conclave virtualmente, devidamente
registrado e gravado, com posterior e imediata colheita de assinaturas físicas
dos sócios, já que até o momento não se vislumbra a possibilidade de
arquivamento de ata de assembleia/reunião virtual perante as Junta Comerciais.
Contudo, em situações de instabilidade ou até de
conflito, o adequado é a participação virtual dos sócios utilizando-se dos seus
certificados digitais para o registro inicial das suas presenças e posterior
assinatura digital da ata. Isso dará legitimidade ao presidente e ao secretário
da assembleia/reunião para que extraiam e assinem fisicamente a certidão que
será levada a registro perante a Junta Comercial.
Na hipótese de impossibilidade real de efetivação
do conclave sob a forma virtual, a solução que restou foi a mera prorrogação e
a efetivação do ato no prazo agora estabelecidos pela MP 931 de 30/03/2020,
conforme acima descrito.
Fernando
Augusto Sperb - advogado, Mestre em Direito Comercial pela UFPR e sócio de Alceu
Machado, Sperb e Bonat Cordeiro – Sociedade de Adgovado.
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