Você,
cujo idealismo perdeu a virgindade, não chore não. Debatemo-nos durante tanto tempo contra o
poder instalado no país! O Brasil fora tomado por um enxame composto por
corrupção, esquerdismo, Foro de São Paulo, corporativismo, patrimonialismo,
globalismo e revolução cultural! Não havia dúvida sobre a necessidade de combater
esse enxame.
Bolsonaro
vestiu o elmo dos templários, abraçou com dedicação algumas das pautas
conservadoras e liberais, encontrou milhões de brasileiros à espera de alguém
para guiá-los e foi seguido, esperado, aclamado. Era líder tosco, mas de refinamento
fora suficiente a rápida dose de Michel Temer.
A eleição do
novo presidente suscitou iras cósmicas. Aglutinaram-se contra ele macabras
potências encasteladas nos poderes de Estado. Os mais altos torreões da
República passaram a dardejar sortilégios e quebrantos sobre o novo mandatário.
Com apoio da mídia militante, que o combateu antes, durante e depois da
campanha eleitoral, submeteram-no à mais orquestrada desqualificação. E
encontraram pela frente um osso duro de roer, com fortíssimo apoio popular.
Qualquer
assunto que pudesse ser usado em desfavor do presidente servia para uma
pancadaria midiática que a tudo amplificava e repercutia sem cessar até o
surgimento de assunto novo, ou melhor. Surpresa? Não. Imagino que, com alguma
experiência da cena nacional e seus atores, isso era de esperar. Inusitado,
para todos, foi a persistência com que milhões de brasileiros, ao verem o que
acontecia, passaram a sair às ruas em apoio ao presidente. Nenhum dos ataques a ele, porém, teve o
impacto da fala de Sérgio Moro enquanto se demitia do cargo de ministro da
Justiça e da Segurança Pública. Ali rufaram os tambores para o combate final.
Bolsonaro não estava sendo acusado por um editorialista ou por um parlamentar
oposicionista, mas por uma personalidade mundial, magistrado que só não tinha o
respeito de bandidos e de seus defensores.
Quando ele
terminou de falar, percebi uma debandada entre os apoiadores do presidente. O
idealismo perdera a virgindade. Trincara-se o cristal. Para muitos, a vida
nunca mais seria a mesma...
Quando o presidente falou,
expondo o indispensável outro lado da história, quando as "provas"
vieram a público para serem examinadas sem a lente de aumento da mídia
militante, tudo começou a voltar ao seu lugar. Foi lastimável ver uma figura
pública como o ex-ministro usando contra o presidente o mesmo truque de printar
conversa de whatsapp aplicado contra ele Moro.
Aliás, acho que nem Glenn
Greenwald faria a uma amiga e afilhada a baixaria que Moro fez a Carla
Zambelli. E apresentou à TV Globo como "prova".
Escrevo, então, àqueles para
os quais o cristal trincou. Não há cristal na política. Como tantas vezes tenho
escrito, a política é um jogo que se joga. Não é um jogo que se assiste de
camarote, com ar condicionado ligado e garçom na porta. A política põe na mesa
o bem comum, e os adversários são conhecidos. Durante décadas impuseram ao país
os seus padrões e seus patrões. Nós os vimos envolvidos numa guerra sem trégua
contra a escolha do eleitorado em 2018. Será necessário apresentar bem mais do
que um par de dois para que minhas palavras os favoreçam na volta ao poder.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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