E o mundo virou de cabeça para baixo. De repente os
nossos pacientes crônicos que fazem controle regular de suas patologias
vasculares, com medo da epidemia, sumiram dos nossos consultórios, ambulatórios
e do nosso monitoramento. O momento é de angústia e incerteza. Porém, temos que
colocar na balança os riscos e benefícios e entender que, às vezes, o que
sentimos ou apresentamos podem ser pior que a Covid-19. Sabemos como é difícil
a decisão de buscar auxílio médico ou ficar em casa em isolamento social. Na especialidade
vascular lidamos com doenças degenerativas que, mesmo bem cuidadas, progridem
lentamente. Nossos pacientes, ou uma boa parte, são do grupo de risco para a
Covid-19, e são exatamente esses que também têm risco de ficarem sem a nossa
atenção.
Tenho conversado com diversos colegas do Brasil
inteiro, que relatam que os casos de feridas infectadas, principalmente nos
diabéticos, têm chegado aos hospitais em estado avançado de comprometimento e,
assim sendo, evoluindo mal e com isso aumentando o número de amputações e até
mortes que poderiam ser prevenidas se o atendimento fosse feito precocemente.
Também temos pacientes com doença arterial periférica controlada, que podem se
agravar com um quadro de trombose arterial com risco de perda de membro se não
houver intervenção imediata. Temos tido relatos de casos de pacientes que
chegam aos hospitais já com necrose de dedos e dor intensa. Pacientes
portadores de aneurisma que fazem acompanhamento regular, devem manter esse
controle. Pacientes que têm um edema súbito de perna, com endurecimento da
musculatura da panturrilha e, às vezes por medo, tendem a diminuir a
importância do sintoma e falar que é uma distensão ou que pisou errado,
podem estar diante de uma trombose venosa profunda aguda, que pode levar a
problemas sérios se não reconhecida e tratada. Temos também pacientes que fazem
uso de medicação anticoagulante com controle periódico e que precisam desse
controle, pois correm o risco de uma hemorragia.
Além dos pacientes crônicos, que podem ter seus problemas
agudizados, temos uma interface nova com a epidemia de Covid-19, que são
sintomas de microtromboses de pequenos vasos de extremidade ou cutâneas que
podem aparecer ainda no começo da infecção e que ajudam a corroborar no
diagnóstico da doença. Também temos colaborado com nossos colegas intensivistas
e clínicos na avaliação dos casos de tromboses em pacientes de Covid-19, e seu
tratamento, que tem particularidades que ainda estamos estudando e aprendendo.
Enfim, estamos atentos aos novos estudos científicos que têm surgido sobre o
tema, mas queremos também zelar pelos nossos pacientes antigos, outrora bem
controlados e que podem nesse momento, por um medo excessivo, deixar passar o
período mais adequado de serem bem cuidados e submetidos a uma intervenção
precoce antes do agravamento do quadro. Qualquer sintoma novo que possa
aparecer, como dor forte, edema, mudança de coloração ou temperatura de uma
extremidade; se for portador de ferida crônica, mudança no aspecto, cheiro, ou
tamanho da lesão devem ser motivos de um contato com seu médico. A forma como
vai acontecer esse atendimento deverá ser combinada entre o médico e o
paciente, mas o importante é não menosprezar os sinais que o nosso corpo usa
para se comunicar conosco e dizer que algo não anda bem.
Enfim, cuidar-se bem nesse momento inusitado exige
bom senso, tranquilidade, escutar seu corpo e gerir prioridades com sabedoria.
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