O
desequilíbrio da gestão da saúde brasileira faz desaguar no Judiciário uma
série de problemas enfrentados pelos pacientes brasileiros. Recente
levantamento revelou que o número de ações movidas contra planos de saúde
disparou em São Paulo. Somente nos três primeiros meses de 2017 foram julgadas
117 ações por dia de usuários inconformados, por exemplo, com negativa de
atendimento, rescisão do contrato por decisão da operadora ou aumento abusivo
das mensalidades. A regulamentação atual imposta às operadoras demonstra-se
insuficiente para barrar uma onda de demandas que assolam os tribunais.
Um
dos motivos que provoca essas “batalhas” é o fato de as empresas excluírem dos
planos os usuários mais idosos. Os mecanismos são conhecidos: sucessivos
reajustes abusivos, negativas de procedimentos de alta complexidade ou até do
cancelamento dos planos quando a pessoa começa a ficar doente.
É
certo que a procura pela rede privada cresce na medida em persistem os
problemas sanitários e do sistema de saúde no país. A falta de programas que
ajudem a população a ser saudável corrobora com a máxima de que o Brasil é o
país do improviso, com a cultura de agir somente quando surge o
problema.Governos sem continuidade, com projetos bombásticos e apenas
eleitoreiros.
Existe
um grande desequilíbrio evidente entre as necessidades e as ações. É
fundamental que se invista numa política de prevenção de doenças – não se pode
tolerar mais situações como as epidemias de dengue, zika vírus e febre amarela
que representam um milionário prejuízo aos cofres da saúde.
A
operadora de plano de saúde, por sua vez, apesar de ser uma empresa privada que
visa exclusivamente lucro, vive o paradoxo de atuar em uma área sensível
socialmente, cuja garantia constitucional de acesso é mais importante para o
magistrado do que a letra fria dos contratos de adesão.
A
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) esforça-se em seu papel de
reguladora. Porém, ainda falta muito para que os regulados cumpram suas
obrigações sem que estejam a todo tempo sob o poder coercitivo da lei. As
práticas abusivas dos planos continuam sendo usuais.
A
ANS, apesar de noticiar a suspensão de venda de alguns planos periodicamente,
não atua de forma a produzir uma transformação administrativa e financeiramente
eficaz para pacientes e empresas.
As
milionárias multas às operadoras, anunciadas nos veículos de comunicação, somem
das manchetes sem que se tenha notícia se elas foram pagas e se o dinheiro foi
revertido para a melhora do sistema.
Não
se nega que as operadoras de planos de saúde tenham um papel relevante,
principalmente pelo falho e caótico Sistema Único de Saúde (SUS). Porém, a ANS
precisará intervir com o escopo de propor políticas específicas para que as
operadoras invistam em prevenção da saúde. Se não mudarem os caminhos, o
sistema privado não se sustentará a longo prazo. E apenas o pequeno percentual
de população privilegiada financeiramente terá acesso a um bom atendimento
médico.
O
brasileiro bate à porta da Justiça, como último recurso, pois sente-se vítima
da negligência política, que não atende aos seus direitos básicos, principalmente
o da preservação da dignidade humana e da assistência médica (pública ou
privada) para garantir o seu bem maior: a vida.
Sandra
Franco - consultora jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde,
presidente da Comissão de Direito da Saúde e Responsabilidade Médico-Hospitalar
da OAB de São José dos Campos (SP), presidente da Academia Brasileira de
Direito Médico e da Saúde, membro do Comitê de Ética da UNESP para pesquisa em
seres humanos e Doutoranda em Saúde Pública.
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