Profissionais que atuam na área tributária têm oportunidades a todo momento. Em virtude da complexidade da legislação, empresas cometem equívocos rotineiramente, o que abre margem para revisões fiscais, consultorias para conformidade tributária e, se detectados recolhimentos indevidos ou a maior, recuperações de créditos. Ocorre que nem só os contribuintes cometem falhas; a Administração Pública edita inúmeras normas inconstitucionais, instituindo cobranças tributárias que podem ser questionados no Poder Judiciário. Foi o que aconteceu com a publicação da Medida Provisória 1.118/2022, que modificou a Lei Complementar 192/2022, retirando o direito dos revemdedpres consumidores de óleo diesel, biodiesel, querosene de aviação e GLP, sujeitos à alíquota zero, aproveitarem créditos do PIS/Pasep e da COFINS vinculados a essas operações.
Vamos entender melhor a questão: em 11 de março de
2022 entrou em vigor a Lei Complementar n° 192, dispondo em seu artigo 9° que
as alíquotas do PIS/Pasep e da COFINS do óleo diesel, biodiesel, querosene de
aviação e GLP ficariam reduzidas a 0 (zero) até 31 de dezembro de 2022. Este
mesmo artigo garantiu às pessoas jurídicas da cadeia, incluído o adquirente
final, a manutenção dos créditos vinculados. Como se vê, com base na
literalidade da norma, tanto os consumidores dos referidos combustíveis, como
também os revendedores, no caso os postos de combustíveis, poderiam se
apropriar dos créditos de PIS/Pasep e COFINS.
Entretanto, em 17 de maio de 2022, foi editada a
Medida Provisória nº 1118/22, revogando a manutenção dos créditos nas operações
com os referidos produtos. Inconformada, a Confederação Nacional dos
Transportes (CNT) protocolou uma ação direta de inconstitucionalidade – ADI nº
7181 – questionando a MP nº 1118/22 junto ao Supremo Tribunal Federal (STF),
alegando que a majoração indireta de tributo, inclusive mediante a revogação de
benefício fiscal, deve se submeter às regras constitucionais da anterioridade
nonagesimal, ou princípio da noventena, segundo o qual os entes públicos
somente podem cobrar um tributo após o período de 90 (noventa) dias contados da
publicação da lei que o estabeleceu ou o aumentou.
O ministro Dias Toffoli, em 07 de junho de 2022,
julgou liminarmente esta ação direta de inconstitucionalidade e, por conta da
possibilidade de aumento de tributo, decidiu que os consumidores teriam o
direito aos créditos por um prazo de 90 dias da publicação da MP 1.118. Esta
liminar foi confirmada pelo Plenário Virtual do STF, em 21 de junho de 2022.
Importante salientar que as medidas provisórias têm
força de lei desde a edição e valem por até 120 (cento e vinte) dias. Se não
forem aprovadas pela Câmara e pelo Senado nesse período, ou se forem
rejeitadas, perdem a validade. Foi o que ocorreu: a MP nº 1118/22 aguardava
votação no Senado e perdeu a validade em 27 de setembro de 2022. Caso o
Congresso Nacional não discipline, por decreto legislativo, as relações
jurídicas do período em que a MP nº 1118/22 esteve em vigor, as relações
jurídicas durante a vigência da norma permanecem regidas pelo teor da medida
provisória, ou seja, as empresas perdem o direito aos créditos de PIS/Pasep e
COFINS nas aquisições de óleo diesel, biodiesel, querosene de aviação e GLP.
Para completar o imbróglio, em 23 de junho de 2022
foi publicada a Lei Complementar nº 194, mantendo a revogação dos créditos de
PIS/Pasep e COFINS nas aquisições de diesel, biodiesel, querosene de aviação e
GLP, exceto para as empresas que utilizam estes combustíveis como insumo.
Estes contribuintes passaram a fazer jus aos créditos presumidos de PIS/Pasep e
Cofins em relação à aquisição destes combustíveis, de 11 de março de 2022 a 31
de dezembro de 2022. Ou seja, a situação ficou resolvida para quem utiliza
diesel, biodiesel, querosene de aviação e GLP como insumo, como é o caso das
indústrias e do setor de transportes, dentre outros. Mas os revendedores da
cadeia, como os postos de combustíveis que, pela literalidade da redação
original, poderiam se aproveitar do crédito, tiveram seu direito
expressamente vedado.
Assim, resta a estes contribuintes (postos de
combustíveis) discutir o princípio da anterioridade nonagesimal para que a
vedação ao aproveitamento dos créditos de PIS/Pasep e COFINS nas aquisições de
diesel, biodiesel, querosene de aviação e GLP entre em vigor somente após o
período de 90 (noventa) dias contados da publicação da MP nº 1118/22 ou, como
defendem alguns, da Lei Complementar nº 194. No primeiro caso, o crédito
presumido de 9,25% seria aproveitado de 11 de março de 2022 (data de publicação
da Lei Complementar n° 192/22) até 15 de agosto de 2022. Já no caso de se
considerar a noventena a partir da a LC nº 194, o aproveitamento iria até 21 de
setembro de 2022.
Ressalte-se que cada empresa, juntamente com seu
corpo jurídico, deverá avaliar a forma de buscar os referidos créditos, se pela
via administrativa ou judicial. É bom lembrar que, como não há uma decisão em
repercussão geral sobre o tema no STF, ainda existe espaço para a Receita
Federal glosar o crédito, o que implica na aplicação de uma multa que pode
chegar a 75% do valor.
Independentemente do procedimento a ser adotado, os postos de combustíveis estão sendo favorecidos com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, visto que a vedação ao aproveitamento dos créditos nas aquisições de diesel, biodiesel, querosene de aviação e GLP configura uma majoração indireta das contribuições, devendo-se, nesse caso, respeitar a anterioridade nonagesimal prevista no parágrafo 6º do artigo 195 da Constituição Federal.
Frederico Amaral - CEO da e-Auditoria, empresa de tecnologia especializada em auditoria digital.
e-Auditoria
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