Uma nova pesquisa, publicada na revista Scientific Reports, da Nature, aponta que alterações em dois genes podem estar associadas a perdas antes de três meses de gestação. Cientistas apostam que a descoberta possa ajudar casais com histórico de perdas gestacionais precoces
Alterações em dis genes podem estar associadas a
casos de aborto espontâneo, aqueles que ocorrem em até três meses de gestação.
Os autores, dentre eles pesquisadores da Igenomix Foundation, na Itália,
acreditam que a descoberta possa ajudar casais que sofrem repetidamente de
perdas fetais e não teriam outra explicação para este fenômeno. O trabalho está
publicado na revista científica Scientific Reports, do grupo Nature.
Os indivíduos saudáveis apresentam 46 cromossomos.
Esta condição pode ser alterada quando há aneuploidias (aumento ou diminuição
do número de cromossomos). Dependendo do tipo de aneuploidia cromossômica, o
bebê pode nascer com síndrome de Down ou trissomia 21, síndrome de Turner,
síndrome de Klinefelter, dentre outras. As alterações cromossômicas são a
causa de 50% a 70% das perdas gestacionais.
Por sua vez, conforme aponta o estudo, há casos em
que o aborto espontâneo ocorre em mulheres saudáveis com embriões euploides
(com os 23 cromossomos herdados da mãe e 23 do pai, o que caracterizaria como
um embrião euploide, portanto, cromossomicamente saudável). Algumas dessas
razões podem ser alterações hormonais e infecções bacterianas ou virais. No
entanto, outra explicação diz respeito a casos em que ocorre uma alteração no
gene, não no cromossomo —e foi justamente esse o ponto investigado pela
pesquisa e que permitiu associar as alterações genéticas nos genes STAG2 e TLE4
com maior risco de perda gestacional precoce.
“A partir dos resultados preliminares apresentados,
a indicação é que esses genes possam ser usados para testar a predisposição
genética para abortos em pais que planejam uma gestação, principalmente para os
pacientes com histórico de abortos recorrentes. São informações que podem ser
relevantes para aconselhamento genético e gerenciamento de risco, podendo assim
ajudar casais com histórico de perdas gestacionais precoces”, ressalta
Taccyanna Mikulski Ali, bióloga molecular e coordenadora de análises de
pré-natal da Igenomix Brasil.
Como o estudo foi realizado - Foi
sequenciado o genoma de 46 embriões euploides abortados de mães adultas
saudáveis para entender a suscetibilidade genética ao aborto não causado por
aneuploidias cromossômicas. Para tanto, a análise contemplou 439 variantes
únicas em 399 genes, incluindo genes conhecidos por estarem associados a perdas
espontâneas. Entre os genes priorizados nas análises, foram encontrados o STAG2
e o TLE4. O STAG2 tem a função de codificar a subunidade do complexo
coesina (quando inativada, a coesina se mostrou letal em camundongos). Já o
TLE4 interage fisicamente com uma região do cromossomo 9, associada a abortos
espontâneos.
Metodologia mais ampla - Os
abortos são estudados, principalmente, usando informações genéticas parentais e
em uma resolução que deixa de explorar uma parte significativa do genoma. A
principal técnica é a hibridação genômica comparativa, que detecta variantes de
vários milhares de pares de bases. Também se faz o sequenciamento direcionado,
que aponta mutações pontuais. Ambos são atualmente os métodos mais precisos
para a análise genética do DNA parental de perdas espontâneas, mas não são
sensíveis a pequenas variantes ou visam apenas algumas regiões codificantes.
Usando uma abordagem diferente, o único estudo até
agora que testa a associação genética em todo o genoma em uma grande coorte de
abortos também é baseado em informações maternas. Porém, dependendo do modo de
herança, o estudo do genoma parental pode ser ineficaz, pois há incerteza sobre
quais partes dos genomas parentais são realmente herdadas pelo embrião e não
fornece nenhuma maneira de identificar as mutações não herdadas. “Portanto,
analisar o genoma fetal é o próximo passo necessário para entender
completamente a genética dos abortos espontâneos. Este é o
principal diferencial deste estudo, que contou com participação da
Igenomix Itália”, ressalta Taccyanna.
Perfil dos embriões e gestantes incluídos no estudo – Na amostra, a idade gestacional dos embriões ao término da gestação, calculada como o intervalo entre a data da interrupção da gestação e a data da última menstruação, variou de 7,14 a 19,43 semanas. Entre os 46 embriões, 21 foram classificados como casos de abortos recorrentes. As pacientes que tiveram as perdas incluídas no estudo são em sua maioria de origem europeia (87%) e a idade mediana na data da coleta foi de 36,7 anos, com idade ligeiramente maior nos casos recorrentes em comparação com os primeiros. Os prontuários das pacientes não relataram comorbidades importantes. O ácido fólico foi utilizado por 71% das mães, sem diferença entre os casos iniciais e recorrentes. A mediana do índice de massa corporal e da idade da menarca (primeira menstruação) são comparáveis entre os primeiros casos e os casos recorrentes, bem como comparáveis a um grupo de mulheres controle. Ao todo, a partir dos registros médicos disponíveis, os autores observam que as mães dos embriões estavam na faixa de indivíduos adultos saudáveis.
Os próximos passos deste estudo multicêntrico
– Segundo os autores, dentre eles Antônio Capalbo, diretor de Laboratório
e de Projetos de Pesquisa e Adriano De Marino, pesquisador sênior, ambos da
Igenomix Itália, o diferencial deste trabalho é ser uma exploração sistemática
do genoma, que combina o conhecimento prévio com a priorização livre de
hipóteses, tornando-o robusto não apenas para a descoberta de mutações em genes
sabidamente associados ao aborto, mas também na identificação de novos genes.
As possíveis estratégias para acompanhar e validar os resultados relatados,
concluem os autores, será a replicação em uma coorte diferente e maior, assim
como a realização de ensaios experimentais sobre propriedades moleculares e
celulares dos genes.
Igenomix – A Igenomix é um laboratório de biotecnologia que ajuda no sucesso dos tratamentos de Reprodução Assistida, diagnóstico e prevenção de Doenças Genéticas.
Referência do estudo
Buonaiuto S, Biase ID, Aleotti V, Ravaei A, Marino A, Damaggio G, Chierici M, Pulijala M, D'Ambrosio P, Esposito G, Ayub Q, Furlanello C, Greco P, Capalbo A, Rubini M, Biase SD, Colonna V. Prioritization of putatively detrimental variants in euploid miscarriages. Sci Rep. 2022 Feb 7;12(1):1997.
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