Vivemos numa época em que a
negação de verdades é vista como um serviço à liberdade e evidência de
sensatez. Pelo viés oposto, afirmá-las é dar sinais de prepotência intelectual.
"Tudo é relativo!", proclama-se, enquanto se anuncia que a
experiência individual (individualismo) ou comunitária (coletivismo) são as
únicas fontes de conhecimento. Não é preciso muito esforço para reconhecer o
quanto as afirmações de tais fontes são variáveis e não verificáveis. Na
prática, o que se produz por essa via é a grosseira valorização do palpite:
"Aqui vocês (ou você) decidem legitimamente sobre tudo!"
Quem diz que tudo é relativo
afirma o relativismo como uma verdade. Certo? No entanto, se tudo for relativo,
também essa "verdade" será relativa e a própria frase destrói o que
pretende ensinar, a menos que admitamos o relativismo como a única verdade não
relativa.
Existe a verdade e existe o
bem! E quem nega isso, ao contrário do que imagina, não presta serviço à
liberdade. Quantos pais, ocupados com bem educar seus filhos ouvem deles:
"Puxa, só aqui em casa as coisas são assim!". Tal frase é, talvez, a
primeira evidência que colherão de o quanto foi a sociedade invadida por
conceitos destrutivos de seus próprios alicerces.
O historiador Paul Johnson,
admirável autor de "Tempos Modernos, o mundo dos anos 20 aos 80",
discorrendo sobre a repercussão social do trabalho científico de Einstein, escreveu:
"O mundo está desconjuntado, como tristemente
observara Hamlet". Era como se o globo giratório tivesse sido tirado de
seu eixo e lançado à deriva num universo que não mais comportava normas e
medidas preestabelecidas. No princípio dos anos 20 surgiu a crença de que não
mais havia quaisquer absolutos: de tempo e espaço, de bem e de mal, de
conhecimento, sobretudo de valores. Erroneamente, a relatividade se confundiu
com o relativismo, sem que nada pudesse evitá-lo.
Mais adiante, referindo-se
ainda a Einstein, o autor registra o desalento do cientista ao perceber as
consequências da teoria da relatividade na vida real das pessoas.
"[Einstein] viveu para presenciar a transformação
do relativismo moral - para ele uma doença - em pandemia social, assim como para
ver sua equação fatal dar à luz o conflito nuclear. Houve vezes, no final de
sua vida, em que afirmou desejar ter sido apenas um relojoeiro."
Ora, tanto a física de
Newton, quanto a de Einstein e a de Max Plank eram válidas para os respectivos
parâmetros, mas sair delas para armar barraca nos porões da dúvida sobre bem e
mal, certo e errado, verdade e mentira é maltratar a ciência e torturar os
cientistas. O mundo desconjuntado de Hamlet volta as costas a Deus, enquanto se
preocupa com a natureza, com os animais e as plantas, e descuida absolutamente
do ser humano e da sociedade, da cultura e da civilização.
Que sentido pode haver em
orientar-se pelo terrível silêncio da matéria, relativizando tudo que de fato
importa ao homem?
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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