Neste momento em que celebramos os 35 anos do Estatuto da Criança e do
Adolescente, marco histórico do Poder Legislativo brasileiro, foi muito
relevante a aprovação no Congresso Nacional do Projeto de Lei nº 2.628/2022,
conhecido como “ECA Digital”. Trata-se de uma atualização necessária do
arcabouço legal para a proteção das novas e futuras gerações.
Quando o Legislativo
consegue reagir com rapidez ao clamor social, como fez diante da denúncia do
influenciador Felca sobre a adultização de menores nas redes sociais, está
prestando um serviço público extraordinário. É uma demonstração clara de que,
acima de ideologias e disputas partidárias, há algo mais essencial: a urgência
de responder aos apelos do País. No caso, foi enfatizada a prioridade de cuidar
bem de nossas crianças e adolescentes.
De modo muito correto, o
texto aprovado prevê mecanismos robustos para combater conteúdos de exploração
sexual infantojuvenil no ambiente digital. Cria regulações específicas para
redes sociais e jogos online, aderentes às faixas etárias, impondo a adoção de
mecanismos confiáveis de verificação da idade, vedada a autodeclaração. Prevê
sanções adequadas e bem dosadas, como advertência, multa de até 10% do
faturamento ou R$ 50 milhões, suspensão ou mesmo proibição de operar no Brasil
em caso de descumprimento. Em suma, o ECA Digital diz com clareza ao mercado
digital: “Vocês têm responsabilidade e arcarão com as consequências se
falharem.”
É preciso deixar muito
claro que conter a adultização de adolescentes e crianças na internet não é
censura. Protegê-los contra violência, aliciamento sexual, danos emocionais e
psicológicos é atuar com responsabilidade. A questão tem uma analogia
importante: também não há cerceamento da liberdade de expressão quando se coíbem
os crimes de injúria, calúnia, difamação e ataques à integridade moral das
pessoas no ambiente digital. As empresas da Web têm, sim, um papel
imprescindível nesse esforço coletivo. Sua participação não é facultativa, mas
compulsória e crucial.
A nova lei, cabe
acentuar, é uma atualização oportuna, pois o ECA nasceu em 1990, numa época em
que a internet estava florescendo e ainda indisponível para a população e
empresas. Ninguém imaginaria que crianças pudessem ser aliciadas por meio de
mensagens instantâneas, vivenciarem perigos de “desafios” virais ou serem
expostas a conteúdo nocivo em plataformas online.
Entretanto, essas
ameaças são hoje reais. De acordo com dados do Instituto DimiCuida, entre 2014
e 2025, pelo menos 56 crianças e adolescentes brasileiros, com idades de 7 a 18
anos, morreram em desafios e jogos compartilhados nas redes sociais. A
instituição baseia-se em casos noticiados na imprensa ou em relatos de
familiares que procuram organizações da sociedade civil.
Ademais, o Brasil foi o
quinto país com mais denúncias de abuso sexual infantil online em 2024, com
quase 49 mil páginas reportadas, de acordo com relatório da rede internacional
InHope. De 2022 até o ano passado, as notificações multiplicaram-se em nosso
país, que passou da 27ª para a 5ª posição nesse absurdo ranking. Essa
comparação mostra uma escalada rápida e virulenta. Nas primeiras posições,
aparecem Bulgária, Reino Unido, Holanda e Alemanha.
Proteger nossas crianças
e adolescentes, em todos os seus espaços de convivência, inclusive os digitais,
é um dever do Estado, da sociedade e das famílias. Esta é uma responsabilidade
que deve ecoar como um chamamento ético, responsável e prioritário para o poder
público, o conjunto da população e cada cidadão. Agregar à tecnologia o dever
de cuidado com as crianças e adolescentes é um compromisso de todos nós.
O Instituto Nelson Wilians (INW), que atua em todo o país com projetos de educação, direitos humanos e cidadania, vê a aprovação do ECA Digital como um passo histórico. Para nós, a nova legislação alinha-se ao propósito de ampliar a proteção de uma parcela muito vulnerável da população, contribuindo para que o avanço da tecnologia não ocorra à custa da dignidade, da saúde e da segurança física e mental das crianças e adolescentes.

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