Um estudo com jovens adultos evidenciou que
limitar o uso de redes sociais a um teto diário contribui para a redução de
sentimentos de solidão e depressão
A Síndrome
do fim do ano, um termo utilizado para descrever a intensificação de tristeza e
melancolia que algumas pessoas experimentam durante esta temporada, pode
contribuir para o agravamento dos sintomas de depressão. Essa condição é muitas
vezes associada ao estresse decorrente de uma série de fatores, como demandas
sociais e familiares, expectativas elevadas para as festividades, reflexões
sobre o ano que se encerra e, em alguns casos, a sensação de solidão.
“É
importante destacar que a ‘síndrome de fim de ano’ não se configura como um
diagnóstico psicopatológico. Na realidade, ela não existe em manuais
diagnósticos utilizados por psiquiatras e psicólogos. O que acontece é que,
nesse período, diversas questões emocionais podem emergir, assim como ocorre
para algumas pessoas na véspera do próprio aniversário, quando fazemos uma
retrospectiva da vida e das experiências acumuladas até então”, explica Adriana
Satico, psicóloga e coordenadora do curso de Psicologia do Centro Universitário
Belas Artes.
A seguir, a
psicóloga explica quais são os principais fatores emocionais e sociais que
contribuem para o surgimento da chamada “Síndrome de fim de ano”.
Como os aspectos sociais, emocionais e
financeiros típicos do fim do ano podem intensificar sentimentos de tristeza e
melancolia?
É comum surgir
a sensação de desconexão ou de não pertencimento, que tende a se intensificar
no período de festas, momento esse que a união entre as pessoas é amplamente
destacada. Além disso, os encontros familiares podem trazer à tona conflitos
não resolvidos, gerando tensão e desgaste emocional. Também podem aparecer
lembranças de pessoas ausentes, seja por morte, separação ou distância
geográfica. As confraternizações, por evocarem vínculos afetivos, podem ampliar
a saudade e intensificar os sintomas de tristeza.
Estresse
financeiro também se destaca por meio da insegurança econômica, decorrente do
acúmulo de dívidas combinada ou não com gastos com presentes, festas e viagens,
que costuma aumentar nesse período. Esse cenário contribui para a piora da
saúde mental no final do ano.
De que forma a pressão por “fechar o ano com
sucesso” pode intensificar sentimentos de tristeza ou inadequação nessa época?
Um estudo
realizado na Suécia demonstrou que as resoluções de final do ano centradas em
resoluções de evitação daquilo “Que vou deixar de fazer no próximo ano”
fazem com que as pessoas entrem em um ciclo que apresenta um início de ano
motivado, acompanhado do abandono e, ao final do ano, prevalece a autocrítica
expressa pela autoavaliação negativa. Por sua vez, as resoluções de final de
ano pautadas em termos de abordagem: “O que eu vou fazer no próximo ano” e
acompanhadas de suporte ambiental, envolvendo as relações interpessoais das
amizades, trabalho e no ambiente digital, tendem a gerar trajetórias com mais
evidências de progresso, o que protege a autoestima, reduz a ruminação e
diminui a probabilidade dos sentimentos de tristeza e inadequação associadas ao
“fechar o ano”.
Outros
estudos apontaram para uma queda na percepção de bem-estar, bem como padrões de
perfeccionismo e autocrítica que elevam o sentimento de tristeza e inadequação.
As redes sociais também promovem comparações por meio de publicações que
indicam as “conquistas do ano”, muitas vezes interferindo negativamente no
humor e na autoavaliação dos usuários nas faixas etárias de 18 a 30 anos.
Como diferenciar a melancolia típica do final do
ano de sinais que podem indicar um quadro depressivo mais sério?
Quando os
conteúdos que fundamentam o quadro não estão restritos ao final do ano e os
sintomas persistem após esse período, recomenda-se buscar um profissional de
Psicologia para realizar um processo de Avaliação Psicológica que permita
investigar a situação com maior profundidade. Dependendo do quadro clínico,
além de psicoterapia, pode ser necessária também a atuação de um profissional
da Psiquiatria, que auxilia tanto no diagnóstico de depressão e no diagnóstico
diferencial, quanto na indicação de tratamento medicamentoso, se aplicável.
Quais estratégias práticas uma pessoa pode adotar
para lidar com a solidão ou frustrações que costumam emergir nas festas de fim
de ano?
Algumas
possibilidades apontadas por estudos recentes indicam que interações rápidas,
como mensagens e ligações breves podem repercutir positivamente na redução da
solidão percebida e no aumento dos afetos positivos. Além disso, ações pautadas
na bondade e na gentileza também demonstram contribuir para a melhora do
bem-estar e para a diminuição de afetos negativos. Uma prática simples consiste
em escolher algumas pessoas significativas e, nos intervalos do dia, enviar
mensagens ou realizar pequenas ligações, seja por áudio e/ou vídeo, de maneira
espontânea, reforçando o quanto essas pessoas são importantes para você.
O
mindfulness é outra possibilidade para a melhora do humor deprimido, na redução
do estresse e diminuição da ruminação. Complementarmente, um estudo com jovens
adultos evidenciou que limitar o uso de redes sociais a um teto diário
contribui para a redução de sentimentos de solidão e depressão. Assim,
acompanhar com atenção os avisos de tempo de uso diário e semanal das conexões
virtuais pode facilitar a implementação dessa prática.
Como amigos e familiares podem oferecer apoio
saudável a alguém que demonstra melancolia ou retraimento durante esse período?
Amigos e
familiares podem oferecer apoio como a escuta ativa, evitando conselhos
apressados e permitindo que a pessoa expresse e reflita sobre seus sentimentos.
Não se deve minimizar o que o outro sente, evitando frases como “não é
nada” ou tentativas de “consertar” tudo rapidamente. Adotar essa
postura aumenta a percepção de que o outro realmente se importa, o que está
associado a menor nível de sintomas ligados à depressão e maior bem-estar.
Outra forma de ajuda é oferecer apoio sem controlar, permitindo que a pessoa
mantenha sua autonomia. Esse tipo de apoio à autonomia está relacionado a maior
engajamento e menos sintomas negativos. Isso porque, apoios percebidos como
controladores costumam gerar resistência e piorar o humor. Para evitar isso, é
recomendável oferecer opções, reconhecer diferentes perspectivas e colaborar,
em vez de pressionar.
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