O caminho para uma alimentação saudável e livre de produtos nocivos à saúde tem sido um dos principais assuntos em conferências mundiais de alimentação, em decorrência do aumento de pessoas diagnosticadas com diferentes doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) e sua importante relação com o estilo de vida. Estudos relatam que as DCNTs são responsáveis por cerca de 41 milhões de mortes no mundo (71% do total anual de mortes), sendo que as dietas inadequadas estão entre os maiores fatores de risco.
Segundo Fabri¹ (2021), algumas mudanças nos
modelos de produção e consumo de alimentos resultaram na padronização das
práticas alimentares. Os dados apontam para aumento no consumo de alimentos
ultraprocessados que possuem altos níveis de açúcares, gorduras (principalmente
saturado e trans), e sódio, assim como produtos com grandes quantidades de
agrotóxicos e organismos geneticamente modificados que são denominados
transgênicos.
O Guia Alimentar para a População Brasileira²
(2014) aponta que padrões de alimentação mudam rapidamente na grande maioria
dos países e, em particular, naqueles economicamente emergentes, como o Brasil.
As principais alterações ocorrem pela substituição de alimentos in natura - que
são provenientes de plantas ou de animais e não sofrem qualquer modificação
após deixar a natureza - ou minimamente processados - alimento in natura
submetido a processos como limpeza, secagem, seleção e embalagem - e
preparações culinárias à base deles por produtos artificiais e ultraprocessados
como lasanhas congeladas, macarrão instantâneo, biscoitos e salgadinhos.
Essa mudança ao longo dos anos desencadeou um
desequilíbrio entre a oferta de nutrientes e a ingestão excessiva de calorias.
Segundo estudos indexados em um documento publicado neste ano pelo Núcleo de
Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde³ (Nupens - USP) e em parceria com
a Cátedra Josué de Castro, o aumento da ingestão de produtos ultraprocessados
está diretamente relacionado a um maior risco de desenvolver hipertensão,
diabetes, doenças do coração e certos tipos de câncer.
E por que ultraprocessados podem oferecer
riscos à saude?
Os alimentos ultraprocessados são produtos
transformados pela indústria, com poucos ingredientes naturais, adição de
ingredientes e aditivos artificiais, que não mais remetem ao alimento original
e um dos principais problemas é que apresentam uma alta densidade energética,
maior teor de açúcar ou sódio, gorduras saturadas, além de baixo teor de fibras
e micronutrientes essenciais.
O consumo excessivo de alimentos industrializados
altera consideravelmente o funcionamento normal do organismo. O açúcar em
excesso, por exemplo, aumenta os níveis de glicose circulante no sangue, e a
resposta disso no organismo para essa taxa elevada de maneira crônica é o
distúrbio na produção direta da insulina, caracterizando a resistência ao
hormônio e desenvolvimento de diabetes - doença que pode se tornar fator de
risco para outras.
O consumo alto de sódio, importante nutriente
para o organismo, pode alterar o funcionamento do coração, causando pressão
arterial desregulada, problemas renais e outras doenças graves. Nos alimentos
ultraprocessados e com temperos adicionais, como o macarrão instantâneo e
lasanhas congeladas, a quantidade de sódio é muito alta, devido aos aditivos
utilizados para realçar o sabor. Isso também acontece em alimentos embutidos,
como salames, presuntos e peito de peru, que é normalmente visto como
inofensivo para a saúde.
Quais os caminhos para uma alimentação
saudável e suas consequências?
O caminho para um estilo de vida saudável engloba
uma alimentação equilibrada e sustentável, com o aumento do consumo de
alimentos in natura ou minimamente processados nas refeições diárias,
reduzindo o nível de ultraprocessados, encontrados facilmente em comércios de
todos os tamanhos, por possuírem maior tempo de vida nas prateleiras e
facilitarem os desafios logísticos de distribuição.
Muitos alimentos industrializados são
prejudiciais à saúde pelo excesso de aditivos artificiais, além de não contarem
com a rotulação ideal para entendimento do consumidor. O IDEC4 (Instituto de
Defesa do Consumidor) e outros órgãos defendem mudanças nas regras de rotulagem
de alimentos junto à ANVISA, exatamente para que o consumidor saiba exatamente
sobre as composições.
Mais do que evitar doenças, é preciso reconhecer
a alimentação como uma aliada no contexto de promoção da saúde e bem-estar
individual. Para isso, é preciso que as informações sejam concisas para chegar
às pessoas de forma consistente, educando sobre qualquer informação contida nos
produtos e facilitando uma possível reeducação alimentar.
Além disso, as escolhas alimentares têm uma
importante interação com os sistemas ambientais, agrícolas e de saúde.
Portanto, mudanças individuais na rotina alimentar podem influenciá-los de
forma crucial. De acordo com Nilson5 (2018), estima-se que no Brasil os gastos
com doenças cardiovasculares aumentaram 17% entre 2010 e 2015, incluindo os
custos pela morte prematura, internações e auxílios em decorrência da
inatividade causada pela doença. Em 2011, os gastos do SUS com obesidade
chegaram a quase 300 milhões de dólares, dos quais 24% deles foram destinados
para obesidade mórbida.
Dar subsídios para que a população tenha acesso a
alimentos e preparações culinárias saudáveis significa melhorias no estilo de
vida em larga escala, com informações para influenciar suas escolhas, além de
acesso a comidas de qualidade e boa procedência, produzidas de maneira
agroecológica e sustentável.
Janaína Alessandra
Silva - Doutoranda em Ciências pelo ICB - USP/ Nutricionista pela FSP - USP
Referências:
• ¹ Fabri RK, Martinelli
SS, Perito MA, Fantini A, Cavali SB. Absence of symbolic and sustainable
aspects in recommendations for healthy eating: a qualitative analysis of
food-based dietary guidelines. Rev Nutr. 2021;34:e200120. https://doi.org/10.1590/1678-9865202134e200120
• ² Guia Alimentar
para a População Brasileira (2014).
• ³ NUPENS. Núcleo de
Pesquisas Epidemioólgicas em Nutrição e Saúde [Disponível em: https://www.fsp.usp.br/nupens/]
• 4 IDEC. Instituto de
Defesa do Consumidor [Disponível em: https://idec.org.br/]
• 5 Nilson EAF,
Andrade RCS, Brito DA, Oliveira ML. Custos atribuíveis a obesidade, hipertensão
e diabetes no Sistema Único de Saúde, Brasil, 2018. Rev Panam Salud Publica.
2020;44:e32. https://doi.org/10.26633/RPSP.2020.32
• Diálogo sobre ultra
processados. Soluções para sistemas alimentares saudáveis e sustentáveis.
(2021)
• Aliança Alimentação
[Disponível em: https://alimentacaosaudavel.org.br/]
• Andretta V, Silverio
J, Mendes KG, Motter RF, Theodoro H. Consumo de alimentos ultraprocessados e
fatores associados em uma amostra de base escolar pública no Sul do Brasil,
2021. https://doi.org/10.1590/1413-81232021264.04422019
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