Aluna do ciclo primário faz
saudação quotidiana à sua professora.
Antigos costumes
voltam e restabelecem a hierarquia e a ordem
Uma
das práticas mais simbólicas do radical comunismo chinês está desaparecendo de
facto. Não é a primeira que morre, mas é uma das mais sensíveis para a
metafísica igualitária socialista.
Falando
para os 90 milhões de membros do Partido Comunista Chinês, o presidente Xi
Jinping enviou uma única e fundamental mensagem:
“Não
me chamem de presidente, não me chamem de secretário do partido. Chamem-me
‘camarada’” (“tongzhi” em chinês).
O
igualitário tratamento de “camarada” foi obrigatório e universal na China
marxista, escreveu o “The New York Times”.
Porém,
hoje o tratamento de “tongzhi” ganhou conotações sexuais e afetivas, sendo típico
no relacionamento entre o público LGBT, explicou o jornal nova-iorquino.
Por
isso, o Centro de Pequim para LGBT se autodenomina Beijing Tongzhi Zhongxin,
ou Centro Camarada de Pequim.
O
povo chinês não quer saber de todo esse igualitarismo e na vida prática
abandonou a vulgar fórmula.
Mao
(centro esquerda) quis fazer a igualdade completa
entre 'camaradas' na Revolução
Cultural.
Afinando
com a tendência popular, a Secretaria de Transporte Municipal de Pequim divulgou
circular em fins de maio de 2016 recomendando aos motoristas e cobradores de
não mais tratarem os passageiros de “camaradas”, informou a mídia oficial.
“Utilizar
o termo camarada para se dirigir ao público não é apropriado”, explicou um
funcionário da prefeitura ao jornal oficial “Jornal para a Juventude de
Pequim”.
Desde
essa data, nos ônibus da cidade só se ouve falar de “senhoras” e “senhores”.
Mas também de “amiguinhos” para as crianças, de “alunos”, se estão indo à
escola, e de “estudantes” para ao maiorzinhos.
Para
os estrangeiros vale “jovem senhorita”, “bela senhora”, “distinto senhor” e até
“mestre” (categoria que na Revolução Cultural foi cruelmente chacinada). Também
se pode ouvir o requintado “madame”.
A
recomendação oficial para a terceira idade é de tratar de “mestre ancião” ou
“senhor ancião”. A exceção é para os saudosistas da velha guerra de classes
comunista, que ainda usam o macacão único maoísta. Estes podem ser tratados de
“velhos camaradas”, noticiou o jornal “La Vanguardia” de Barcelona.
O
termo “camarada” veio da União Soviética, para exprimir maior igualdade. Mas na
última década passou a ser usado como sinônimo de homossexual, diz “La
Vanguardia”.
Até
o tradutor de Google adotou o novo uso. Os caracteres de “tongzhi guanxi” — literalmente
“relacionamento camarada”— são traduzidos por “relacionamento homossexual”,
observou o “The New York Times”.
Por
isso, os chineses mais jovens sentem-se envergonhados quando alguém se dirige a
eles usando “camarada”.
Tudo
acontece como se a revolução homossexual fosse a mais autêntica continuadora da
revolução comunista que exterminou mais de cem milhões de seres humanos no
século XX.
Ninguém
mais na rua usa o termo evocador dos anos sinistros. Ele pode ser ouvido nas
sessões solenes da cúpula do Partido Comunista e se encontra em escritos e
discursos oficiais dos líderes marxistas. E mais nada.
Mas
nos níveis inferiores do mesmo partido é comum ouvir “chefe” “diretor”, “grande
pai”, e até “irmão”.
Um
dos problemas – observa o jornal nova-iorquino – é que a mudança no tratamento
muda a consideração mútua entre as pessoas, inclusive dentro do partido, porque
se sentem hierarquizadas, respeitadas e reconhecidas pelo que elas são.
Alunos do curso primário
agradecem a seus pais por tê-los enviado à escola.
O espírito revolucionário recua na China
O espírito revolucionário recua na China
Em
sentido contrário, os cidadãos percebem o rebaixamento que sofriam com o igualitário
“camarada” no regime comunista.
Na
ultima reunião geral do ano do Partido Comunista, o Comitê Central emitiu uma
instrução dizendo que “todos os membros do partido têm que se tratar
reciprocamente de ‘camaradas’”.
Os
especialistas comentaram essa imposição com muito ceticismo e acham que a
instrução não vai mudar muita coisa.
“Hoje,
todos os que entram no partido andam à procura de dinheiro”, disse o escritor e
historiador Zhang Lifan. “Você já não pode chamar essas pessoas de camaradas”.
E
referindo-se ao “camarada máximo Xi Jinping” e ao cerne duro do partido, Zhang
comentou com ironia: “Você pode dizer que todos os membros do partido são
camaradas. Mas há uns que são mais camaradas que os outros”.
Esses
tiranizam o povo que lhes está dando as costas na vida cotidiana.
Luis Dufaur - escritor, jornalista,
conferencista de política internacional e colaborador da ABIM
Fonte: Agência
Boa Imprensa – (ABIM)
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