Andrew Solomon é um psicólogo, jornalista e escritor americano que escreveu livros hoje clássicos, como “O Demônio do Meio Dia” e “Longe da Árvore”. Sobre esses livros tem vídeos de TED Talks excepcionais desse autor, no Youtube. O meu preferido é “Como os piores momentos de nossa vida nos tornam quem somos”. Andrew conta a história de uma festa de um menino de sua classe, no segundo ano do antigamente chamado de Primário, chamado Bobby, que convidou toda a classe para sua festa de aniversário, menos o menino Andrew. A sua mãe achou que se tratava de um engano, e ligou para a mãe de Bobby, que sem muitas delongas afirmou que seu filho não gostava de Andrew e não quis convidá-lo. Ele era um menino frágil, tímido e afeminado (que demorou décadas para assumir sua evidente homossexualidade), que atraiu toda forma de bullying e exposição ao ridículo durante todos os anos de sua escola. Para sobreviver a esses anos, Andrew teve uma mistura de resiliência e evasão, segundo suas palavras, e ter sido capaz de atravessar esse período e seu isolamento, começou a criar a sua própria identidade. Citando uma passagem de seu livro, ele descreveu uma entrevista com uma família que tinha filhos com severas deficiências. A mãe falou que seus filhos não tinham sido destinados, como outras crianças, a representar uma benção para seus pais. Eles que optaram por atribuir o significado a essa experiência, e transformar fardo em benção.
Essa é a ideia fundamental dessa palestra, que eu
observo todo dia em minha prática clínica: temos perdas e experiências
dolorosas em nossa vida. Não encontramos o significado delas em alguma jornada
mística ou na fala de terapeutas. Atribuir significado ao sofrimento e
suportá-lo é uma decisão e uma prática. Isso demanda muita coragem. E muita fé
na vida. Muita gente pode passar o resto da vida presos no não sentido e no
absurdo. Andrew Solomon repete o significado não é algo que se encontra por aí.
É preciso Forjar Significado e Construir Identidade. Assim ele forjou sua
identidade de um autor que dá voz a pessoas que enfrentam sofrimentos maiores
do que ele sofreu, com abusos, agressões e perdas que podem fazer alguém
desistir da vida, mas essas pessoas escolhem enfrentar e forjar significado
diante do absurdo.
Victor Frankl foi um psiquiatra austríaco judeu que
foi mandado para campos de concentração nazista e sobreviveu a condições impossíveis
até o final da guerra. Ele optou por tolerar o sofrimento e forjar um
significado para ele. Ele conseguiu essa façanha compreendendo e ouvindo os
agressores nazistas e os prisioneiros do campo de concentração. Viu homens se
comportando como porcos, e outros caminhando altivos para a morte, louvando a
Deus e seu destino. Quando acabou a guerra e foi liberto, Victor Frankl criou a
Logosofia, e passou o resto de sua vida ajudando pacientes e colegas a
encontrar um sentido para sua vida e desenvolvimento. Morreu com noventa e dois
anos.
Convido você, leitor e leitora desse texto, a
lembrar das piores coisas que aconteceram em sua vida, aquelas que pareciam
impossíveis de superar. Imagine como essas dificuldades foram talhando sua
personalidade e empurrando seu desenvolvimento. Como foi difícil passar por
isso e como as saídas foram surgindo onde não tinha saída.
No seu aniversário de cinquenta anos, Andrew
Solomon celebrou as bençãos se sua vida: encontrou o companheiro de sua vida,
teve sucesso profissional, adotaram um menino. No seu aniversário, o garoto
pediu para fazer um discurso. Seu companheiro falou: “George, você não pode
fazer um discurso. Você tem quatro anos”. Mas George tanto insistiu que acabou
recebendo a palavra, e agradeceu a presença de todos, a alegria do bolo e se
voltou a seu pai para falar: “Pai, se você fosse pequeno, eu ia querer ser seu
amigo”. No final, Andrew pôde ser grato a todas as dificuldades que atravessou,
que forjaram significado e construíram sua identidade. E lhe deu amigos que
nunca vão deixá-lo fora da festa.
Marco Antonio Spinelli -médico, com mestrado em
psiquiatria pela Universidade São Paulo, psicoterapeuta de orientação junguiana
e autor do livro Stress - o coelho de Alice tem sempre muita pressa.
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