Uma cliente querida veio trazer sua preocupação com sua filha de trinta anos, e seu trabalho numa Agência de Publicidade: de uma semana para outra ela teve um acréscimo abrupto de carga de trabalho, pois, segundo ela, três colegas da mesma idade “bugaram”. Todos os três na faixa dos vinte e cinco a trinta anos, ou seja, uma idade onde eles deveriam estar segurando qualquer bucha. O tal do “bug” deve ser provavelmente para descrever um processo de esgotamento, que antigamente era chamado de estafa e agora é mais elegante chamar de “Burnout”. Minha geração torce o nariz e chama essa geração nascida e criada no entorno da virada do Milênio de “Snow Flake Generation”, ou Geração Floco de Neve, que é lógico que um termo pejorativo para uma geração que se desmancha rapidamente diante da adversidade. Mas são só os milennials que estão bugando?
Outro cliente vem se queixando da pouca efetividade
de nosso tratamento. Apesar de estarmos usando medicamentos em dose eficaz, ele
fica cada vez mais cansado durante o dia, consumindo cada vez mais café para
entregar toda a produção que lhe demandam e dormindo cada vez pior. Tudo para
fazer um psiquiatra feliz. Eu lembrei a ele de como seus sintomas estavam mais
brandos e sua qualidade de vida estava melhor quando estava desempregado. Mesmo
com a pandemia, ele fazia exercícios ao ar livre todo dia, lia e recomendava
livros interessantes, fazia consultorias que davam dinheiro para pagar suas
contas e dormia sem nenhum medicamento o sono dos justos. Tomava sol,
frequentava piscinas e comia uma comida cheia de vegetais e pouca gordura e
açúcares. Bons tempos aqueles do desemprego. Agora ele estava trabalhando full
time na diretoria de uma empresa que teve o bom senso de contratá-lo e está em
mais dois boards, além de fazer consultoria. Em vez de estar feliz, está
depletado. Esse é o significado do Burnout: uma perda/depleção de energia, com
sensação diária e permanente de cansaço, dificuldade de foco e falhas cada vez
mais frequentes e importantes de Memória. Tudo isso é sinal de falha de energia
e desempenho do Sistema. Como as pessoas reagem a isso? Geralmente colocam mais
pressão em si, diminuem o tempo de sono, tentam trabalhar com mais intensidade.
Como um caminhão acelerando na direção do precipício.
Algumas medidas para prevenir ou reverter o burnout
para millenias e para tiozinhos: cuidado com o “zooming fatigue”. Ficar o dia
inteiro pendurado em telas está esgotando as capacidades dos Cérebros de
processar informação. Sugeri ao meu cliente desligar a sua câmera para não
ficar olhando sua própria cara o dia inteiro. Parece estranho, mas este “efeito
espelho” causa ou piora o cansaço. É como ficar olhando para o espelho o dia
inteiro. Pedi para afastar a imagem dos interlocutores e afastar a tela de seus
olhos. A sensação de proximidade que aquele carão do chefe transmite grudado na
tela causa estresse e sensação de estar sendo avaliado. Ao final das reuniões,
faça um detox de tela e de imagens. Estamos numa era de sobrecarga de estímulos
e informações, o que gera um cansaço constante. Afaste celular, tablet e
computador nesse período de detox e faça movimento: pedir para fazer exercícios
ou pular corda é bem pouco aplicável, mas uma caminhada ao ar livre, alguns
alongamentos, ou dez minutos de exercícios respiratórios/Meditação vão
recarregar suas baterias. Depois de uma consulta muito dura, eu como alguma coisa,
tomo um chá e faço a respiração do fogo antes da próxima consulta, para quebrar
a energia de angústia e de dor que se manifesta nessas situações. Isso serve
para todo mundo. Fazer esses mini breaks ajudam a separar as atividades e as
energias de cada uma.
Faça uma atividade de cada vez e “termine a
corrida” (como diz um técnico de basquete: “finish the run”). Tarefas
concomitantes e inacabadas pesam como uma cruz no final do dia. Termine uma e a
tire da frente, daí passa para outra. Isso é difícil? O ambiente corporativo é
caótico e as tarefas são empilhadas na sua mesa? Outro motivo para terminar uma
de cada vez e estabelecer prioridades. Seu chefe é caótico e a distribuição de
tarefas idem? Se a sua empresa é caótica, isso é outro motivo para a sua governança
de tempo e de prioridades ser bem estabelecida. Senão, vai todo mundo bugar
junto, e a culpa normalmente recai sobre o bugado, não sobre o sistema caótico
que leva ao bug.
Como já colocado em outros artigos, defenda seu
sono como um pitbull defende seu osso. Nada de telas na cama, nada de
estimulantes como café ou red bull ou nicotina perto da hora de deitar. Leitura
(em livros), meditação e relaxamento antes de deitar também ajuda muito.
Sobretudo: transforme o estresse em fonte de
crescimento. Ou de desafio. Ou o próximo bugado, ou bugada, será você.
Marco Antonio Spinelli - médico, com mestrado em
psiquiatria pela Universidade São Paulo, psicoterapeuta de orientação junguiana
e autor do livro “Stress o coelho de Alice tem sempre muita pressa”
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