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quinta-feira, 23 de abril de 2020

No fundo do poço: até onde vai o petróleo?


Espanto, choque, absurdo e inesperado são alguns dos termos utilizados para comentar o derretimento do preço do petróleo no início desta semana, mas os sinais de fragilidade do setor já vinham aparecendo e falamos sobre eles em artigos anteriores.

Apesar da explicação “financeira” para a negociação negativa da commodity na última segunda-feira, a guerra de preços iniciada pela Arábia Saudita no início de março tem grande responsabilidade pela saturação de petróleo no mercado. No momento em que os preços baixaram e a produção aumentou, quando a pandemia de Covid-19 já indicava forte queda da demanda na China – o segundo maior consumidor de petróleo do mundo – os árabes inundaram o mercado, num movimento que demonstrou como o governo saudita claramente subestimou o risco da pandemia e apostou tudo em uma rápida revisão das metas de corte da produção pela Rússia.

Com a pandemia rompendo as fronteiras da China, não apenas a demanda diminuiu globalmente como a necessidade de manter a arrecadação dos países produtores aumentou. Ainda assim, após um mês com os preços do petróleo na região dos US$ 20,00, um novo acordo entre a Rússia e a Opep+ foi firmado, prevendo o corte de 10 milhões de barris por dia entre maio e junho. O acordo, no entanto, não teve efeito imediato devido ao alto nível dos estoques e a baixa demanda do mercado global.

De certa forma, a nova meta de corte serviu para pacificar o ambiente entre os países produtores, mas está longe de solucionar a crise do setor no curto prazo. Além disso, a retomada das atividades e o consequente aumento da demanda por combustível deve acontecer apenas de maneira gradual e o alto estoque da commodity deve prolongar a normalização.

Frente a este cenário, os investidores portadores dos contratos futuros do petróleo WTI (West Texas Intermediate), referência no mercado dos EUA, optaram por não rolar os contratos no seu dia de vencimento (21), ou seja, optaram por não renovar as posições, o que acabou pressionando os preços para o campo negativo, chegando a negociar o barril a -US$ 37,63, uma queda de 289,4%. Na prática, os investidores pagaram para se livrar da obrigação de receber os barris na data combinada. Diante disso e do aumento nos custos de estocagem, espera-se que os produtores possam ir além da cota de redução acordada na Opep+.

É importante destacar, no entanto, que o petróleo do tipo WTI afeta diretamente a indústria petroleira americana, mas fica a cargo do tipo Brent, negociado na Europa, o papel de referência internacional de preços. Para a Petrobras, a referência também é o petróleo do tipo Brent, o que cria certa proteção ao efeito negativo registrado no começo desta semana. Porém a queda na demanda é sistêmica e atinge a todo o setor. O desafio agora está na capacidade dos estoques que já estão elevados devido à alta produção.

Dito isso, vale explicar ainda que a recuperação dos preços visto no pregão desta quarta-feira (22) tem como origem o aumento de tensão entre os EUA e o Irã, após o presidente norte-americano, Donald Trump, postar em suas redes sociais que “havia instruído a Marinha dos Estados Unidos a abater e destruir todo e qualquer canhoneiro iraniano, se assediarem nossos navios no mar”, levando incertezas quanto à oferta de petróleo no médio prazo e dando um certo fôlego para a alta dos preços momentaneamente.

Com toda essa complexidade em campo, o fato é que o setor petrolífero e de gás natural está tão dependente de uma rápida recuperação econômica – que se mostra cada vez mais distante – quanto qualquer outro setor. O grande perigo, neste e em outros casos, está no colapso das empresas, caso elas não venham a receber ajuda do governo para lidar com as dificuldades.





Ernani Reis - analista da Capital Research


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