O meio jurídico tem vivenciado uma crescente
evolução tecnológica, sobretudo nos últimos cinco anos. Alguns exemplos são a
criação de startups de legaltech, além do
investimento em tecnologia por parte de escritórios de advocacia de maior
porte, buscando agilizar uma área que ainda é tida por muitos como engessada e
morosa.
Entretanto, a realidade
do mercado jurídico nacional, que se parece bastante com o cenário europeu, por
exemplo, não é a de presença maciça de escritórios com força de investimento e
apetite por inovação, mas a de pequenos escritórios, com orçamentos limitados,
investindo em tecnologia apenas o necessário para possibilitar o ajuizamento e
acompanhamento de processos eletrônicos. Isto, equivale dizer, um sistema de
controle processual prêt-à-porter e
uma máquina de informática bastante básica são o montante de investimentos
destes escritórios, responsáveis pela maior parte dos atendimentos jurídicos do
país.
Assim, investimento em
tecnologia preditiva, meios digitais de resolução de disputa, entre outras
ferramentas, não costumam fazer parte do radar da maioria dos advogados
brasileiros. Tanto isto é verdade é que as associações de classe, como a AASP
(Associação dos Advogados de São Paulo), por exemplo, acabam suprindo um pouco
estas carências, disponibilizando serviços a uma gama de advogados que ainda se
encontram à margem das inovações tecnológicas.
Por outro lado, o
Judiciário também tem feito investimentos significativos em inovações, mas
ainda existe um acervo grande de processos que tramitam sob suporte físico, não
tendo sequer passado por um processo de digitalização. Hoje, vivemos a pandemia
do Covid-19 e seu impacto pelo mundo, abalando as relações entre empresas,
trabalhadores e consumidores. Para os próximos meses, é esperado um aumento no
número de processos jurídicos que deve sobrecarregar escritórios de advocacia e
o Judiciário como um todo. Desta maneira, torna-se imprescindível acelerar os
processos e buscar soluções para melhor atender os clientes.
Pode-se dizer que a
pandemia já começa a surtir efeitos no meio jurídico, que vem buscando adotar
um posicionamento mais moderno. Ao menos no Estado de São Paulo, os resultados
têm sido muito animadores. Embora os prazos processuais estejam suspensos, a
rotina de tramitação dos processos eletrônicos está praticamente inalterada.
Claro que atos materiais não estão sendo realizados, ou sendo realizados com
cuidados, mas somente os processos físicos ficaram prejudicados, por exemplo.
Ainda temos um longo
caminho a percorrer para a modernização do judiciário. Um dos principais
requisitos é a digitalização de 100% do acervo de processos, que neste
momento, é bastante difícil de ser feita. Outro ponto importante é o
aprimoramento das ferramentas digitais que dariam às decisões a capacidade de
serem bem executadas. Por exemplo, o aprimoramento do BACENJUD, sistema
eletrônico de comunicação entre o Poder Judiciário e as instituições
financeiras, por intermédio do Banco Central, possibilitaria, talvez, melhores
condições de cobrança de créditos e recebimentos.
Alternativamente, já
estão sendo implantados meios bastante eficazes de despacho e decisões,
inclusive com videoconferência entre advogado e juízes. É um meio válido, mas
não acredito que venha a se tornar permanente. Acredito que as grandes causas
mereçam sim as sustentações em plenário físico. A comunicação é composta não só
pelo discurso, mas também pelo gestual e pelo ambiente. Contudo, não vejo razão
para que não seja utilizado, para as causas ordinárias, o plenário virtual.
Esta ferramenta, que já existia antes do coronavírus,
tende a ser mais utilizada pela sua racionalidade.
Quando pensamos no
perfil de advogado moderno, podemos automaticamente lembrar de alguém ultraconectado, com boa divulgação nas redes sociais e uma rede de
contatos interessante. Mas acredito este profissional vai além do uso da
tecnologia disponível a seu favor. Essencialmente, ele deve ter foco e
conseguir ver o litígio integral, para além do simples “caso”. Ou seja, ser
capaz de enxergar estrategicamente a demanda do cliente para implementar a
solução mais adequada, que não é sempre o ajuizamento de ação. Isto demanda um
conhecimento de temas colaterais, como economia, contabilidade, entre outros,
que o permitam a aconselhar outras formas de resolução de disputa, que não a
simples litigiosidade. Portanto, o coronavírus pode, sim, impulsionar a tecnologia no meio jurídico,
principalmente pela questão da praticidade, mas nada será realmente um avanço
se não for conduzido por um bom profissional.
Jayme Petra de Mello Neto - advogado do escritório Marcos Martins Advogados e especialista
em Direito cível e societário.
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