A Judicialização da saúde privada em matéria de planos de saúde privados é um fenômeno fundamentalmente brasileiro, considerando que em outros países há pouca incidência dessa matéria.
Atualmente há verdadeiro ativismo judicial nessas
demandas e decisões pouco técnicas na matéria
da saúde suplementar.
Um dos pontos
que chamam a atenção é a própria relativização dos Juízes
da autoridade técnica da Agência Nacional
de Saúde Suplementar e da própria legislação regulatória na apreciação das matérias, e por vezes a utilização da judicialização até
para cometimento de fraudes.
A qualidade técnica das decisões judiciais da
Justiça Estadual é baixa, assim como
contém uma visão ultrapassada da aplicação do direito,
sem contar sua superficialidade técnica. Se constata negação ao direito moderno que deve analisar impactos
econômicos, custo efetividade, medicina baseada em evidência, impactos de
mercado, dentre outros institutos.
O resultado é um judiciário com grande incerteza jurídica e pouca
confiabilidade que em verdade enseja graves problemas ao ecossistema da saúde suplementar.
Logo, surge a pergunta: Todas as decisões judiciais dessa matéria devem ser
cumpridas?
Por exemplo, uma decisão judicial
que determina uma entrega de medicamento ou
tratamento que tecnicamente são inadequados,
não tem evidência de eficácia, que não cumpre os
requisitos do rito extra rol previsto na Lei 14.454/21 e representa potencial dano
para a própria saúde do paciente,
que não analise impacto econômico da
decisão e nem mesmo a regra da legislação regulatória, seu cumprimento deve ser
relativizado.
As decisões judiciais emitidas por um juiz de direito sem qualquer
conhecimento técnico na área da
saúde, que desprezam a utilização de
ferramentas como o NATJUS, não observam os
enunciados FONAJUS do CNJ, não gozam de credibilidade capaz de ensejar seu
cumprimento imediato.
A ausência de elementos técnicos a falta de cautela
sobre os impactos econômicos, as reformas das decisões liminares em sede de
recurso de agravo de instrumento, corroboram com a necessidade de relativizar o cumprimento das decisões concessivas de
liminares em matéria de plano de saúde privado, até mesmo visando o bem dos
beneficiários, que por vezes estão sendo
usados por quadrilhas de fraudadores ou
mesmo por profissionais guiados por interesses econômicos.
Qual é o sentido
da controvérsia médica sobre determinado tratamento estabelecida pelo médico assistente do paciente
e o médico auditor das operadoras sempre gozar de presunção de veracidade em prol do médico assistente do consumidor?
Por que o CRM do médico assistente
vale mais do que o CRM do médico
auditor?
Se há uma equivocada presunção de que o médico
auditor da operadora é suspeito, por que
a mesma suspeição não pode recair sobre o médico assistente
que pode estar motivado por influência econômica na indicação de
determinado tratamento?
E qual a competência do juiz do processo
para analisar tal controvérsia médica antes de uma perícia médica?
E se a decisão judicial
trouxer a morte do paciente? O juiz, o médico ou o advogado dos beneficiários serão responsabilizados?
Portanto, considerando o até aqui esboçado, é possível sustentar a
necessidade de relativização das decisões
judiciais, quando essas desrespeitarem legislação vigente,
representar malefícios aos pacientes e quando estiverem sendo utilizadas como
meio de consecução de fraudes ou com exclusivo caráter econômico.
Logo, é legitimo que as operadoras
de planos de saúde adotem medidas para proteger seus beneficiários, sendo uma
delas a relativização do cumprimento das decisões judiciais em
matéria de judicialização da saúde.
Da mesma forma se a decisão judicial está sendo utilizada como meio de
fraude, o descumprimento da decisão judicial deve ocorrer
para a proteção da própria empresa que
tem a responsabilidade de proteger a coletividade de sua carteira de
beneficiários.
A solução para
esse lamentável fenômeno, começa por exigir juízes especializados sobre a
matéria e que verdadeiramente observem a
legislação específica da ANS e o normativo
regulatório.
A criação de
sumulas vinculantes extraídas de debates técnicos como os enunciados FONAJUS. A obrigatoriedade dos
juízes se utilizarem em todos os casos de
judicialização da saúde e antes de
concessão de liminares, ferramentas como o NATJUS e
consulta à ANS.
A alteração da
legislação para responsabilizar
pessoalmente os juízes nas hipóteses de erro grosseiro de suas decisões,
fato que inibiria o ativismo
judicial, assim como a caridade com o recurso alheio.
A proibição do judiciário de desautorizar a Agência Nacional de Saúde Suplementar e
relativizar pareceres técnicos.
A obrigatoriedade
das decisões judiciais serem técnicas observando
a legislação específica que atualmente obriga uma análise mais abrangente como impactos
econômicos, sociais, medicina baseada em evidencia e consequentemente proibir a
aplicação de análise rasa e legislação genérica como CDC assim como de argumento de autoridade em discussão técnica.
Portanto, o problema
da judicialização da saúde suplementar no Brasil
não decorre da combatividade dos operadores do direito ou
da prática de abusividade das operadoras,
mas do ambiente de insegurança jurídica,
pouco técnico, que enseja um ambiente belicoso onde
consumidor, operadora, agência reguladora
não têm previsibilidade, porque há um
judiciário que faz incorretas intervenções tumultuando e praticando um desserviço ao mercado.
Fernando Bianchi - Advogado,
Sócio do M3BS Advogados e especialista em Direito da Saúde Suplementar
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