O momento atual, de violência e ataques em escolas e creches, nos
coloca diante de um estado de impotência, seja pela segurança dos nossos filhos
como pelo impacto que estes episódios causarão no emocional deles.
Se para os adultos já é algo inconcebível, imagine para uma
criança, principalmente pelo fato de elas enxergarem a escola como uma segunda
casa, como um ambiente em que elas se sentem seguras e acolhidas. Pior ainda
para aquelas que vivenciaram alguma destas tragédias e viram colegas e
professores sendo mortos. A partir daí, o mundo da forma como elas conhece
deixa de existir.
Daí a importância de falar e ouvir, e jamais se esquivar, se
omitir ou mentir. Minimizar o que aconteceu fará com que a criança crie
pensamentos distorcidos e incompatíveis com a realidade, gerando consequências
no desenvolvimento psíquico infantil.
Como falar sobre perdas
A pessoa que irá conversar com a criança deve ser referência de
vínculo, de confiança, que tenha o olhar acolhedor, a escuta atenta e a
aceitação das reações. Isso é fundamental para que ela consiga processar as
informações com total liberdade para exteriorizar suas emoções.
Vale lembrar que as crianças não devem ser rotuladas como
incapazes de lidar com uma perda. Apenas use o bom senso conforme a idade. Com
os pequenos, é preciso adotar uma linguagem de acordo com seu nível de
compreensão.
Crianças de até 3 anos não conseguem entender tão claramente o que
é a morte, tampouco quando envolve tragédias. O ideal é fazer uma sondagem
antes. Pergunte se ela entende o que está acontecendo, até para você saber o
que falar, como falar e evitar expor além do que for necessário. A partir de 11
ou 12 anos, há um nível de compreensão maior sobre alguns acontecimentos.
Independentemente da idade, dê espaço para seu filho tirar suas
dúvidas. Comece com fatos básicos, descubra o que ele sabe e pensa, para
decidir o quanto de informação ele tolera. Nem todas as crianças suportam
muitos detalhes.
Nunca associe morte com sono ou viagem
Jamais invente histórias do tipo: “ele dormiu, descansou” ou
“viajou para bem longe”. As crianças entendem as frases exatamente como são
ditas, e isso pode repercutir negativamente no cotidiano.
A criança terá a ilusão de que a pessoa que morreu está apenas
dormindo e vai acordar a qualquer momento. Ou, ao contrário. Achar que alguém
vai dormir e não acordar mais, o que pode comprometer o seu próprio sono. Ela
também pode passar a deduzir que todo mundo que viaja não volta mais, e começar
a ter crises cada vez que o pai ou a mãe viajarem a trabalho, por exemplo.
Outra história que costuma ser contada é que a pessoa virou uma
estrelinha. Imagine a criança olhar para o céu e pensar que todas as estrelas
são pessoas mortas?
Não esconda seus sentimentos
Não queira passar a imagem de que está tudo bem. Ao contrário,
exponha suas emoções e chore, se tiver vontade. Isso fará a criança perceber
que seu próprio sentimento é normal. Demonstre que, assim como seu filho, você
também está muito triste, e permita que ele fale sobre o que está sentindo e pensando.
A criança deve ir a velórios ou enterros?
Não se deve forçar, mas a criança pode se beneficiar de participar
junto com os adultos. Os rituais servem para que todos vivenciem melhor a
despedida, inclusive os pequenos. Os especialistas concordam que velórios e
enterros não traumatizam as crianças.
Explique muito bem antes como é o velório ou o enterro, e pergunte
se ela quer ir. A criança precisa saber antes que será triste, e que muitas
pessoas estarão chorando. Não decida pela criança que ela deve ficar de fora,
mas também não a obrigue a ir se ela não quiser, e não deixe que se sinta
culpada se não for.
Apoio é fundamental
Devemos entender também que o luto é um processo, e não um evento.
Isso quer dizer que demanda tempo, e cada criança precisará do seu para superar
a perda. Pressionar a criança para voltar à vida normal, sem dar o tempo
necessário, implicará em outros problemas ou reações negativas.
É natural que seu filho apresente mudanças de comportamento, como
choro fácil, episódios de raiva, agitação e medo de ir à escola. No começo,
deixe-o se manifestar como preferir, sem julgamentos. Há quem prefira chorar e
gritar. Outros, precisam de solidão e silêncio para absorver as informações.
Permita que seu filho experimente as emoções conforme seu temperamento, mas
sempre ficando por perto.
Quando procurar ajuda profissional? Em casos de raiva ou
hostilidade excessivas, ou quando a criança não expressa nenhum luto, ou em
casos de depressão ou ansiedade que interferem nas atividades diárias, durando
semanas ou meses. Se chegar a este ponto, crie uma rede de apoio com a escola e
com profissionais de psicologia e/ou psiquiatria.
Danielle H. Admoni - psiquiatra geral,
da Infância e Adolescência, preceptora na residência da Universidade Federal de
São Paulo (UNIFESP/EPM) e especialista pela ABP (Associação Brasileira de
Psiquiatria
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