Psicóloga dá dicas de como ajudar crianças e adolescentes a superar o luto neste Dia dos Pais
Celebrado internacionalmente – ainda que em datas
diferentes – o Dia dos Pais costuma reunir famílias para homenagear a figura
paterna. No Brasil, para pelo menos 87,5 mil crianças e adolescentes, o próximo
domingo, 8 de agosto, não será de festa.
Um estudo publicado na revista científica The
Lancet estima que mais de 87,5 mil menores de 18 anos tenham perdido o pai para
Covid-19 no Brasil. Se considerar as crianças e adolescentes que perderam a
mãe, ficando total ou parcialmente órfãs, o número sobe para 130 mil.
O levantamento realizado entre março de 2020 e
abril de 2021 levou em consideração as taxas de natalidade e de mortes por
Covid-19 em 21 países que somam 76,4% dos óbitos no mundo. No total, pelo menos
1,5 milhão de crianças no mundo perderam um dos pais ou avós responsáveis. No
Brasil, 2,4 crianças a cada mil foram afetadas.
A figura paterna é essencial para o desenvolvimento
emocional, social e psicológico de crianças e adolescentes. Para suprir a
ausência do pai é necessário que outra pessoa assuma esse papel e ofereça
carinho, apoio, proteção, companhia, cuidados e limites. O importante é que a
criança ou adolescente tenha alguém em quem confiar e se inspirar.
Tristeza e revolta
“Celebrações como o Dia dos Pais podem acentuar
sentimentos como a tristeza e até mesmo a revolta para quem vive o luto
recente, principalmente nos adolescentes, mais propícios à rebeldia e à
emotividade. Adolescentes que perderam o pai podem viver essa experiência de
forma muito imprevisível”, diz a psicóloga Daniela Jungles, supervisora do
Serviço-Escola de Psicologia do UniCuritiba - instituição de ensino superior
que faz parte da Ânima, uma das principais organizações educacionais do país.
Um ponto de atenção, continua a professora, é que
adolescentes de forma geral têm dificuldades em compartilhar suas emoções ou buscar
ajuda dos parentes, por isso, os responsáveis devem estar mais cuidadosos e
atentos. “Sabemos que a adolescência é, em si, uma fase difícil, muitas vezes
complicada por conflitos com os pais, por isso quando ocorre a morte de um
deles nessas circunstâncias, o jovem se sente muito culpado, o que complica
ainda mais o luto.”
Dicas para ajudar crianças e adolescentes em luto
Para que crianças e adolescentes se sintam
amparadas e acolhidas neste Dia dos Pais, a psicóloga Daniela Jungles preparou
algumas dicas que vão ajudar os familiares a lidar com a situação.
- Encoraje crianças e adolescentes a expressar
os sentimentos. Desenhos, brincadeiras, histórias, filmes e livros são
boas ferramentas para ajudá-los a conversar sobre o que estão sentindo.
- Reuniões familiares, aniversários ou eventos
como o Dia dos Pais fazem com que a criança sinta falta da pessoa
falecida. Isso pode desencadear crises de choro, irritabilidade, insônia,
pesadelos, crises de ansiedade etc. Esteja pronto para dar conforto e
apoio nestes tempos.
- Ofereça à criança ou adolescente suporte fora
da família e favoreça novos vínculos com pessoas que atuarão como um
"substituto" para o pai falecido: um tio, um primo, um amigo da
família, um professor etc.
- Conversar sobre a morte não é fácil, mas é
necessário. Aborde o assunto com sensibilidade e de forma simples. Seja o
mais aberto e franco possível e deixe a criança ou adolescente conduzir a
conversa.
- Incentive a criança a falar e fazer perguntas.
Basta responder o melhor que puder. Seja sincero. É bom não esconder que
você não sabe tudo e que algumas coisas são difíceis de entender, mesmo
para os adultos.
- Mesmo com toda a dificuldade de falar sobre a
morte e a dor da perda que os próprios familiares estão vivendo, tenha consciência
de que as crianças têm o direito de ser incluídas em todas as
circunstâncias da vida familiar, com os cuidados que a infância impõe.
- Crianças e adolescentes devem receber
informações sobre a doença, a sua gravidade e até mesmo o fim da vida de alguém
que amam e têm direito a participar de todos os ritos fúnebres que
envolvem a morte.
- Deixe que as crianças e adolescentes expressem
suas dores, medos, angústias e até curiosidades sobre o fim da vida. Ouvir
as crianças e responder os seus questionamentos gera segurança, proteção e
amor.
- Não se esqueça que cabe aos adultos estarem
atentos às crianças e adolescentes enlutados e acompanhá-los afetuosamente
durante a sua provação, ajudando-os a redescobrir o amor à vida.
- A vida tem fim, esta é a nossa única certeza,
mas também a mais difícil de admitir. Se tiver dificuldade de conversar
sobre o assunto com as crianças e adolescentes, procure ajude
especializada.
Luto e faixa etária
Crianças e adolescentes reagem de maneira diferente
à morte de familiares de acordo com sua idade, sua personalidade e a
proximidade de seu vínculo com a pessoa que faleceu. Ainda assim, explica a
professora do curso de Psicologia do UniCuritiba, Daniela Jungles, é possível
ter alguns indicativos de como cada criança lida com o luto conforme a sua
faixa etária.
- Até 2 anos - Um bebê recém-nascido pode sofrer não por estar ciente da morte
de um ente querido, mas por sentir a ausência corporal da pessoa que
normalmente cuidava dele. Antes dos 2 anos, uma criança pode vivenciar o
efeito do luto por meio das emoções que seus familiares sentem, como raiva
e tristeza.
- Entre 3 e 5 anos - O conceito de morte refere-se à separação, mas sua natureza final
ainda não foi compreendida. Nessa idade, o raciocínio baseado em
pensamento mágico aparece e a morte é compreendida como reversível.
- Dos 6 aos 8 anos - O aspecto final da morte começa a ser compreendido e uma série de
habilidades são aprendidas. A criança pode então questionar a lógica em
torno da morte: Quem pode morrer? Por quais motivos? O que acontece após a
morte? A partir das respostas, a criança vai construir seu próprio
raciocínio e tirar suas conclusões.
- Dos 9 aos 11 anos - Entende-se claramente a noção da irreversibilidade da morte. A
criança é capaz de compreender o efeito do luto sobre seus entes queridos
e adotar inclusive uma postura protetora em relação à mãe e aos irmãos
menores, por exemplo.
- Adolescência - Período de intensas mudanças físicas e psicológicas. Quando um dos
pais morre, o adolescente se vê confrontado com um novo turbilhão de
emoções e a maioria terá dificuldade de compreender e canalizar todos os
sentimentos ligados ao luto. O adolescente (a partir dos 12 anos) pode já
ter a aparência de um jovem adulto, mas isso não quer dizer que tenha
maturidade emocional. Por isso, precisa de ajuda de toda a família, assim
como é feito com as crianças.
De acordo com a psicóloga, a
tendência é evitar falar sobre a morte para “impedir” que os filhos sofram.
“Conversar sobre a morte não é fácil porque, em certo sentido, isso remete à
própria dificuldade em abordar o assunto. A vida tem fim, esta é a nossa única
certeza, mas também a mais difícil de admitir. Só que quando é um dos genitores
falece, não temos escolha a não ser falar sobre o tema da melhor forma possível”,
finaliza.
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