Dr. Marcelo Valadares, neurocirurgião da UNICAMP e do Hospital Albert Einstein, explica os benefícios do medicamento para tratar dores crônicas e insônia
Há alguns anos, as
leis que permitem o uso do canabidiol (CBD) para fins medicinais vêm avançando
no Brasil. Desde dezembro de 2019, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância
Sanitária) aprovou a regulamentação de produtos à base de cannabis sob
prescrição médica. Em julho deste ano, inclusive, o primeiro extrato de
canabidiol desenvolvido no país chegou às farmácias. Entretanto, os estudos
mundiais acerca do derivado da maconha como tratamento, apesar de polêmicos,
são muito mais antigos; seu uso na medicina, aliás, é estudado em inúmeras
especialidades, como a neurologia.
Porém, há muita
publicidade em torno do CBD, além de dúvidas sobre como ele pode, de fato,
ajuda no tratamento de doenças diversas. Para falar sobre o uso do canabidiol e
seus benefícios no tratamento de algumas doenças neurológicas, o Dr. Marcelo
Valadares, neurocirurgião, médico do Hospital Israelita Albert Einstein (SP) e
pesquisador da Disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), elencou alguns temas que costumam
gerar dúvidas.
1) Há hipóteses de
que os efeitos do CBD podem auxiliar na redução de inflamações no cérebro
O Dr. Marcelo
Valadares explica que parece haver evidência, de acordo com alguns estudos, de
que a substância pode auxiliar no tratamento de pacientes com transtornos e
doenças neurológicas. Nessas pesquisas, há evidências de que o principal efeito
do CBD no cérebro é a redução de inflamação, que está relacionada a doenças
como Alzheimer, ansiedade, depressão e epilepsia, entre outras.
2) O canabidiol é um
tratamento viável para dores crônicas
Um estudo da The
Health Effects of Cannabis and Cannabinoides, nos Estados Unidos, revelou que o
alívio de dores crônicas é a condição mais comum citada pelos pacientes em
relação ao uso do CBD medicinal. Estudos também mostram a presença de
receptores canabinoides na medula espinhal, no sistema límbico, que é regulador
das emoções, no hipocampo, na medula espinhal e no hipocampo, relacionado às
memórias. Segundo o neurocirurgião, o uso do canabidiol em pacientes com dor
crônica intensa mostra benefícios significativos, pois a cannabis tem ação
direta no mecanismo central de dor. O Dr. Marcelo Valadares, inclusive, já teve
relatos de bons resultados entre seus pacientes. "É um valioso recurso
quando as primeiras linhas de tratamento não se mostram benéficas ou apresentam
efeitos colaterais indesejáveis", ressalta.
3) No Brasil, o uso
de medicamentos à base de CBD para dores neuropáticas é permitido, mas esse não
é um tratamento tão acessível
No país, os
medicamentos à base de canabinoides podem ser indicados para tratamentos de
dores neuropáticas crônicas, porém com uma receita especial e preenchimento de
um formulário pelo médico responsável. É importante lembrar que os medicamentos
são de alto custo e difícil acesso.
4) O CBD pode ser um
complemento no tratamento para a dor de pacientes com Parkinson
Estudos mostraram
melhorias na qualidade de vida de pacientes com a Doença de Parkinson.
Entretanto, há controvérsias em relação às melhorias nas funções motoras. O
médico, especialista em tratamento de doenças neurodegenerativas, afirma que
alguns estudos mostram evidências, mas ainda são preliminares. Entretanto, o
neurocirurgião afirma que é possível considerar o canabidiol para casos de dor
crônica relacionada à Doença de Parkinson.
5) Pesquisas sobre o
uso de CBD para retardar a progressão do Alzheimer são promissoras
O Dr. Marcelo
Valadares explica que há, ainda, estudos sobre o uso da cannabis medicinal para
o tratamento de pacientes com Alzheimer. De acordo com o médico, há limitações
medicamentosas tanto para minimizar os sintomas, quanto para retardar a
progressão do Alzheimer neste momento, o que enfatiza a necessidade de
desenvolver mais pesquisas e viabilizar novas opções de tratamento. "Na
literatura, estas pesquisas mostram-se promissoras, mas são necessárias mais
avaliações acerca do tema ", diz o médico.
6) No caso da
epilepsia, o canabidiol pode ser um substituto dos medicamentos tradicionais
Casos de epilepsia,
muitas vezes, são de difícil controle, como explica o neurocirurgião Marcelo
Valadares. Um trabalho publicado no periódico médico The New England Journal of
Medicine com pacientes que possuem a síndrome de Dravet, mostra que a média de
crises convulsivas por mês diminuiu de 12 para 6 após o uso da solução oral de
canabidiol. O Dr. Valadares enfatiza, ainda, que existem evidências sólidas
especialmente no caso de crianças.
7) Em quadros de
insônia, o canabidiol é recomendado?
Pesquisas apontam
que os canabinoides são bem-sucedidos na melhora da qualidade do sono em geral
e podem ser uma alternativa aos tradicionais medicamentos usados para dormir
que podem gerar dependência e uma série de efeitos colaterais. Inclusive, o uso
da Cannabis tem sido estudado em pacientes com Estresse Pós-Traumático que
sofrem com distúrbios do sono.
Dr. Marcelo Valadares - médico neurocirurgião e pesquisador da Disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e do Hospital Albert Einstein. A Neurocirurgia Funcional é a sua principal área de atuação, sendo que o neurocirurgião trabalha em São Paulo e em Campinas. Seu enfoque de trabalho é voltado às cirurgias de neuromodulação cerebral em distúrbios do movimento, cirurgias menos invasivas de coluna (cirurgia endoscópica da coluna), além de procedimentos que envolvem dor na coluna, dor neurológica cerebral e outros tipos de dor. O especialista também é fundador e diretor do Grupo de Tratamento de Dor de Campinas, que possui uma equipe multidisciplinar formada por médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos e educadores físicos. No setor público, recriou a divisão de Neurocirurgia Funcional da Unicamp, dando início à esperada cirurgia DBS (Deep Brain Stimulation - Estimulação Cerebral Profunda) naquela instituição. Estabeleceu linhas de pesquisa e abriu o Ambulatório de Atenção à Dor afiliado à Neurologia.
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