Ainda em fase experimental no Brasil, o médico e pesquisador Dani Ejzenberg compartilha informações sobre o procedimento e a necessidade de financiamento para alcançar mais pacientes
A maternidade continua
fazendo parte dos sonhos de muitas mulheres, porém, para aquelas diagnosticadas
com a Síndrome de Rokitansky, esse caminho é bastante diferente. Esta síndrome
que compromete o sistema reprodutor feminino em graus variados ocorre durante a
vida intra uterina afetando o desenvolvimento do útero e do canal vaginal.Pode
acometer também os ossos, o coração e o sistema urinário.
No entanto, isso já
não é mais um impedimento para a maternidade. Os avanços nas pesquisas
científicas oferecem novas possibilidades que vão além da adoção e do útero de
substituição, como o transplante de útero. Atualmente, a técnica vem passando
por aprimoramentos para a redução de tempo entre a retirada e o implante, e a
simplificação das medicações utilizadas para evitar a rejeição do órgão,
explica o Dr. Dani Ejzenberg, ginecologista obstetra e especialista em
reprodução humana.
Ejzenberg atua como
médico supervisor e pesquisador no Centro de Reprodução Humana da Disciplina de
Ginecologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, e é
parceiro do Instituto Roki - iniciativa de acolhimento e compartilhamento de
informações para mulheres com Síndrome de Rokitansky.
Segundo o médico, o
transplante se tornou uma alternativa para a maternidade em 2014, quando um
grupo de pesquisadores da Suécia realizaram uma série de nove procedimentos com
doadoras vivas. A primeira operação de sucesso, com doadora falecida, foi
realizada pelo seu grupo no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
USP em 2016, com o nascimento do bebê em dezembro de 2017. "Até hoje já
ocorreram mais de 20 nascimentos na Suécia, Brasil, Estados Unidos, Líbano,
Índia, Alemanha, França, China e República Tcheca", aponta Ejzenberg.
Legislação e pesquisa
No Brasil, o
transplante de útero ainda é considerado um procedimento experimental, por isso
a técnica é oferecida somente no campo de pesquisa, porém, com o aumento de
casos bem sucedidos, a expectativa é que seja liberada em breve para a
realização em centros especializados.
O transplante uterino
pode ser realizado de duas formas: com doadora viva ou falecida. O primeiro
permite uma avaliação aprofundada da doadora e um prazo curto entre a retirada
e o implante - porém o procedimento envolve custos maiores, riscos cirúrgicos
para a doadora, além da necessidade de um candidato disposto a doar. "O
transplante com a doadora falecida exige equipes de prontidão para a retirada
do órgão e agilidade para a chegada da receptora e realização do
transplante", afirma Ejzenberg.
Recomendações
O transplante uterino
para a gestação é temporário e indicado para as pacientes com Síndrome de
Rokitansky que nasceram sem útero; com hipoplasia uterina (quando possuem
graves malformações uterinas); ou que perderam o órgão de forma inesperada (na
gestação ou no parto, por causa de câncer, como complicação de cirurgia
ginecologica) .
"Para receber o
transplante é sugerido que a paciente tenha até 40 anos e apresente boas
condições de saúde", recomenda Ejzenberg. As mulheres que desejam doar
precisam ter até 57 anos, serem saudáveis e preferencialmente ter tido filhos.
As etapas para o tratamento incluem avaliação médica da doadora e da receptora,
fertilização in vitro, a cirurgia do transplante uterino, seguimento
pós-transplante, , transferência de embriões, acompanhamento pré-natal e parto.
"Na Suécia, o custo do tratamento inteiro vai de 50 a 100 mil euros por
caso, como foi nos primeiros 9 pacientes". Baseado nos dois casos iniciais
realizados no Hospital das Clínicas, o custo estimado no Brasil é de 25 a 30
mil dólares.
Por enquanto, ainda
não é possível às pacientes transplantadas engravidarem pelo método tradicional
porque as tubas uterinas não são transplantadas, explica Ejzenberg. A
manutenção do útero para uma segunda gestação é permitida, desde que continue
com os medicamentos para evitar a rejeição do órgão.
O médico alerta que o
procedimento oferece os mesmos riscos de outras cirurgias do mesmo porte, como
sangramento, infecções, lesões de órgãos próximos e perda do órgão
transplantado. Também há o risco do corpo rejeitar o órgão durante a gestação
que pode ser contornado com a medicação apropriada. Os cuidados são semelhantes
aos realizados após outros tipos de transplantes. "Mas não há registro de
complicações graves após o transplante uterino e parto", tranquiliza.
O Centro de Reprodução
Humana da Disciplina de Ginecologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da USP atende casais de forma gratuita desde o início de suas atividades,
em 2003. Devido aos custos envolvidos nesta pesquisa, os profissionais da
unidade estão em busca de financiamento para a realização de novos
transplantes.
Instituto Roki
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