Este mês concentra-se uma sequência de eventos sobre o “Agosto Laranja”, com o objetivo de conscientizar e esclarecer todas as questões acerca da Esclerose Múltipla no Brasil. Embora tenha em seu nome a palavra “Esclerose”, a doença está além deste significado, isso por que a EM não é demência e nem uma doença de idosos.
Hoje já discutida com mais frequência, porém ainda
desconhecida por muitas pessoas, a EM é autoimune e afeta em sua maioria
pacientes jovens, de 20 a 40 anos, principalmente mulheres. Estima-se que
existam mais de 40.000 brasileiros com este diagnóstico, um número ainda
subestimado, mesmo sendo uma das grandes causas de incapacidade neurológica na
população jovem.
A causa da Esclerose Múltipla é desconhecida, porém
sabe-se que há uma interação entre fatores genéticos e ambientais (como valores
baixos de vitamina D, infecção pelo vírus Epstein-Barr, tabagismo e obesidade).
Os locais afetados pela doença são o cérebro, a medula espinhal e o nervo
óptico. Existem dois mecanismos que explicam a o funcionamento da doença. Um é
o inflamatório/desmielinizante (lesões inflamatórias e perda da bainha de
mielina. Um material adiposo que reveste nossos neurônios, o que afeta a
condução normal de mensagens elétricas) e o outro é degenerativo (perda da
própria “fibra nervosa” ou axônio, que é o prolongamento do neurônio, ou mesmo
do próprio neurônio como um todo).
Existem diversas dúvidas sobre os indícios da
doença em uma pessoa. O neurologista Dr. Mateus Boaventura, especialista
em Esclerose Múltipla, explica que a doença se manifesta através de surtos ou
de uma progressão lenta e apresenta três tipos diferentes da ação da doença no
paciente. “A depender do início e da evolução posterior, podemos classificar a
EM de formas distintas: remitente-recorrente, primariamente progressiva e
secundariamente progressiva. Em cerca de 85% dos casos, se
inicia na forma de surtos” – explica o neurologista.
A manifestação mais comum está associada a sintomas
neurológicos que podem durar dias ou semanas – os conhecidos surtos. Assim como
surgem, os sintomas melhoram (remitem, completamente ou parcialmente) e depois
podem recorrer ao longo do tempo. Devido a esta tendência de remitir e
recorrer, este principal fenótipo é chamado de Esclerose Múltipla
remitente-recorrente. “Os surtos podem ser diversos e
comprometer algumas funcionalidades do organismo. São eles: a visão, a
sensibilidade, a força muscular, a coordenação e outras funções do sistema
nervoso central. Em um dos surtos mais típicos, ocorre uma redução da acuidade
visual (visão embaçada e dificuldade de enxergar) e dor à movimentação ocular.
Este surto que acomete a visão é conhecido como neurite óptica, por haver uma
inflamação no nervo óptico, que conduz informações da nossa visão. Em outros
surtos, pode haver dormência e formigamento nos membros, desequilíbrio,
fraqueza muscular, urgência e incontinência urinária, entre outros”, comenta o
especialista.
Entre um surto e outro existem outros sintomas:
fadiga, problemas de atenção e concentração, disfunção sexual, ou mesmo
problemas para controlar a bexiga e o intestino.
Em menos de 15% dos casos, a doença não começa com
surtos. Nesta minoria, a doença progride lentamente. O paciente pode se queixar
de piora progressiva, dificuldade para andar, fraqueza muscular, desequilíbrio,
sintomas sensitivos e piora cognitiva. Esta forma é denominada Esclerose
Múltipla primariamente progressiva. Além disso, existe uma
parcela variável de pacientes que iniciam a doença na forma de surtos, e depois
de muitos anos evoluem para uma progressão lenta: Esclerose
Múltipla secundariamente progressiva.
Infelizmente, em alguns casos pode haver um atraso
no diagnóstico, com idas e vindas a diferentes especialistas, como
oftalmologistas em casos de sintomas visuais e ortopedistas ou cirurgiões
vasculares, em caso de sintomas em membros. Pode haver um acúmulo de sequelas,
se não houver um diagnóstico e tratamento precoce. O diagnóstico envolve a
realização de ressonância magnética do sistema nervoso central, onde existem
lesões distribuídas ao longo de regiões diferentes do cérebro, medula e/ou
nervo óptico. Em adição, se solicita o estudo do líquor (colhido por punção
lombar) com pesquisa de um exame chamado “bandas oligoclonais”. Também são
realizados exames laboratoriais para descartar outras doenças.
Eventualmente pode adicionar-se um exame neurofisiológico chamado de potencial
evocado. Existem critérios diagnósticos a serem preenchidos e validados para
populações específicas.
Antes de 1993 não havia nenhum tratamento eficaz
aprovado. Hoje, felizmente, existem mais de 10 opções de tratamento para frear
doença. “Cada opção de tratamento possui um grau de eficácia e um perfil de
efeitos adversos. A escolha é individualizada. O objetivo do tratamento é
prevenir novos surtos, novas lesões e o acúmulo de incapacidade. Ainda não
temos uma cura, mas hoje, após 29 anos da primeira terapia aprovada, a história
e o prognóstico de pacientes com esclerose múltipla melhorou
significativamente! Felizmente, um grande percentual destes pacientes pode não
evoluir mais para incapacidade neurológica importante, e ter uma boa qualidade
de vida, caso recebam um diagnóstico e um tratamento precoces”, afirma Dr.
Mateus Boaventura.
Dessa forma e com o que se sabe, é importante ficar
atento com sintomas neurológicos novos em pessoas jovens, e que persistem por
mais de 24 horas. O ideal é, além de procurar por médicos generalistas, visitar
o neurologista para relatar todos os sintomas. Afinal, o diagnóstico e
tratamento precoces serão decisivos na evolução da doença.
Dr. Mateus Boaventura de Oliveira - Médico Neurologista do HC-FMUSP e Hospital Sirio Libanês. Realizou
fellow clínico e pesquisa em Esclerose Múltipla em Barcelona -Cemcat- Hospital
Vall d’Hebron. Possui título de especialista pela Academia Brasileira de
Neurologia. Atualmente realiza pesquisas científicas e acompanha diversos
pacientes com EM. O Dr. Mateus Boaventura ainda mantém canais dedicados à
disseminação de informações sobre a EM e outras doenças neurológicas de maneira
bastante didática.
Instagram: @drmateusboaventura
www.youtube.com/Dr Mateus Boaventura
Facebook: @drmateusboaventura
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